6º Capítulo

16.8K 1.2K 45
                                    

6 – O dia que em que eu mudei

Acordo com um pesadelo. No sonho, meu filho e meu marido, estão sendo perseguidos por Jucilene e sua mãe.

Meu filho.

Felipe surge na minha mente puxando-me para um abismo ainda mais moral do que propriamente físico. Eu estou sem vê-lo há quase três meses e preciso confessar que pensei pouco neles durante todo esse tempo. Não deixei de considerar minha liberdade, mas com o passar do tempo aqui, percebo que devo guardar minha energia para uma fuga mais elaborada e precisa.

Sei um pouco de Ripper para imaginar o que ele faria comigo se eu tentasse fugir. E sei também que não tenho, ainda, meios para uma fuga. A mulher que pensei ser apenas uma cuidadora da casa ou mesmo uma doméstica se mostrou uma eficiente atiradora, acertando com precisão o alvo que esteve no meu quarto. E não posso me arriscar sabendo que ela está sempre ao redor, à espreita de mim. Mas preciso desesperadamente de algo do mundo lá fora, saber pelo menos que o sol se põe e ainda nasce no mesmo lugar de sempre.

Assim, decido mudar minha atitude: ao invés de receptiva a Ripper, vou me tornar fechada e calada. Perder aparentemente a vontade de sair da cama. Vou fazer o que puder para parecer que estou em um estado grave depressivo. E torcer para que isso o empurre na direção que eu quero.

 Ele vem no primeiro dia e me encontra sem tomar o café e sem lavar ao menos o rosto. Banho e a higiene bucal não considero fazer também. Ele estranha o fato de eu não conversar, porém não comenta nada.

Segue o segundo dia e eu apenas belisquei biscoitos e sucos. Escovei rapidamente os dentes antes que ele surgisse no quarto, mas consigo não tomar banho pelo segundo dia. Ele me olha, sai do quarto assim que me ver com a mesma roupa do dia anterior.

No terceiro dia, ele demora a vir para o quarto. Já é dia alto, eu apenas tomei suco e conseguir não tomar banho e nem escovar os dentes. Estou nojenta.

Ele entra no quarto, senta-se na beirada da cama e diz:

- O que você tem? Sua voz tenta ser suave, mas percebo o fio de tensão.

- Nada - é tudo que eu digo.

Ele se levanta da beirada e aproxima-se ainda mais de mim:

- Olha pra mim – eu tento desviar, só que ele percebe e vira rudemente meu queixo com uma das mãos – olha pra mim quando eu falar.

Eu o olho. E não sei se é o meu estado, com a minha completa ausência de dignidade pela situação que me encontro ou o tom de sua voz, mas eu sinto as lágrimas descerem antes que eu possa controlar. Ele se assusta com a minha manifestação de fraqueza e recua. Eu me encolho dobrando os joelhos e choro silenciosamente por segundos, segurando a imagem do meu pequeno Felipe solitário para que eu possa continuar a desfalecer convicentemente na frente de Ripper.

Ele não diz nada e assim que eu seguro pequenos soluços, ele soa mais gentil:

-  O que você quer Marina?

Novamente a palavra liberdade vem a minha garganta, mas eu não consigo pronuncia-la:

- Ver a luz do sol – bem não foi propriamente “a palavra” mas soou simbólico.

Ele levanta e suspira. Passa a mão na cabeça e aperta os joelhos num esforço enorme de seu corpo pesado. Dá longos passos no quarto e para depois do que parece longos minutos:

- Não posso te levar lá fora com a luz do dia – ele me diz e eu o olho esperando alguma continuação – mas podemos ir num lugar hoje à noite.

Eu arregalo meus olhos para a última parte. Algum lugar? Meu corpo reage e logo estou de pé fora da cama em segundos. Olho para ele e tomo cuidado para não me aproximar demais:

- Aonde?

- O que precisa para sair de noite? Ele me responde. Por noite, entendo se tratar de no mínimo algo festivo. Seria uma boate? Existe isso nessa parte da Cidade?

- Aonde eu vou?

- Sair. O que precisa? Ele é ainda mais direto e percebo que estou quase no limite de irritá-lo.

Tento pensar rápido e não quero usar moletons. Se eu vou sair, quero parecer normal para poder me misturar entre as pessoas mais facilmente. Então me lembro que cheguei aqui com uma saia lápis e camisa social. E sapatos fechados de salto. Posso fazer algo com minhas próprias roupas e com alguns acessórios. Não lembro se estava com bolsa, mas pela cena com Juce, provavelmente elas devem ter se apossado dela. Assim, penso rápido na minha resposta:

- Das minhas roupas e do meu sapato. Uma camiseta preta também. E de um secador, rímel e batom.

Ele não comenta sobre o meu pedido e sai de novo do quarto. Novamente, sem olhar para trás.

RipperDove le storie prendono vita. Scoprilo ora