13. A Floresta Carnívora

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Os rosas do amanhecer cresciam a partir das copas das árvores

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Os rosas do amanhecer cresciam a partir das copas das árvores. Uma neblina espessa flutuava para o chão, nublando a visão de Petris e Fíbia, que se aventuravam em direção à Floresta Carnívora nas várzeas do vilarejo de Amedoína, a noroeste. O frio da noite começava a se dissipar e o garoto sentia o clima abafado irritando a pele junto das gotículas de suor.

A barriga enfaixada dava alguns lampejos de dor, feito cócegas. Eram fáceis de ignorar, Petris estava acostumado. Passando a mão debaixo da camisa, entretanto, sentiu-a molhada.

O coração deu um tropeço.

Ao voltar a mão para os olhos, não viu o vermelho do sangue. Era só mais suor.

Limpou os dedos na calça e balançou a cabeça.

O mundo era rubro. Mais que no coração de Amedoína, ali, à beira da tal floresta misteriosa, as plantas eram de todo um vermelho vibrante e cancerígeno, tais como um viveiro de vísceras expostas. Era difícil não pensar em ardência, dor, cortes, mordidas, dentes afiados, carne viva... Sangue. Petris só conseguia pensar nessas coisas. Aquele Bogeis cravejado em rubis, morto igual a uma pedra, fresco na retina.

Deveria, afinal, haver um motivo para que a floresta se chamasse Floresta Carnívora. Fosse o que fosse, os irmãos não deveriam demorar muito para descobrir.

Ficaram silenciosos a maior parte do percurso. Já não mais chovia e os raios de sol perfuravam as nuvens, trazendo o calor da primavera. Logo o barulho das cigarras tinha retornado, mas ele era cada vez mais sucinto, bem como o dos pássaros. Havia um caminho de mata até que se chegasse à floresta em si, então demorou cerca de uma hora até que os garotos parassem na frente de um grande portal de madeira, carcomido pelo tempo. Contemplaram a entrada da parte de mata densa, os lábios mordidos de canto de boca sem precisar deixar nenhuma palavra escapar, tão entorpecidos.

Uma andorinha veio voando e passou por cima de suas cabeças, indo em direção às árvores. Antes de chegar à floresta, virou para o outro lado e foi embora.

Petris engoliu em seco. Franzindo o cenho, ele levou a mão ao peito, sentindo o coração acelerando lá dentro. Era cansaço, mas também o temor.

Olhou para a irmã, que não parecia transparecer emoção alguma. Uma gota de suor descia pelo rosto dela, indo parar no queixo. Ela a secou com a mão e chacoalhou-a longe.

— Chegamos — anunciou, erguendo uma sobrancelha.

O menino assentiu devagar e virou o corpo para trás, encontrando o velho vilarejo novamente, à distância. Dali não dava mais para ver os sineiros direito, mal dava para ver as casinhas de teto de palha, mas ele tinha certeza que eles os deviam estar encarando também. Sempre estavam.

A mão de Fíbia em seu ombro o sobressaltou.

— Ainda dá tempo de tu voltar — ela disse, fazendo-o virar em sua direção. O tom, surpreendentemente, era dócil.

O Presságio do Sineiro: Rastro de FogoWhere stories live. Discover now