Capítulo 40 - Modo Dragão

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TEREZA CRISTINA -Que cena belíssima. Já passa das 4h00 da manhã e os senhores se divertindo, certamente as minhas custas...

RENÉ -Meu amor não é nada disso que você está pensando...

TEREZA CRISTINA -René Velmont, cala a sua boca. Você perdeu o direito de dizer qualquer coisa quando mentiu para mim. Você me prometeu, jurou que não contrataria essa naja de bigodes para fazer a reforma em seu restaurante, aliás no MEU RESTAURANTE, e quanto a você, por um acaso tem alguma pretensão, alguma ilusão romântica com o meu marido? – Disparou, arqueando uma das sobrancelhas e um sorriso irônico, maléfico...

GRISELDA -A madame só pode estar gozando com a minha cara. A senhora fique sabendo que eu não sou dessas mulheres que ficam por aí querendo roubar o marido alheio e outra, não é justo eu ser ofendida dessa forma. Você conhece meu trabalho, inclusive me elogiou quando estive em sua casa e olhe dona, a...

TEREZA CRISTINA -Por um acaso você se olha no espelho?

GRISELDA -Me olho todos os dias como qualquer pessoa e não estou entendendo aonde a senhora quer chegar com essa pergunta tão descabida.

TEREZA CRISTINA – Não... – e sibilou como cobra inúmeras vezes a palavra não - Você não se olha nesse espelho, porque se olhasse e fosse honesta como proclama ser, veria aquilo que eu vejo, aquilo que qualquer um com um pouquinho de discernimento também vê.

PATTY – Chega mãe, para por favor! Está passando dos limites. – pedia quase em uma súplica, prevendo os resultados desastrosos das palavras da mãe, mas ela não foi ouvida. Tereza Cristina passou por cima de seu pedido como um trator.

TEREZA CRISTINA -Você veria essa piada de muito mal gosto, nessa forma tão...esquisita, tão horrorosa que nem por caridade dá para gente chamar de mulher, porque você não é uma mulher. Não é feminina...nem masculina, não passa de um macacão ambulante.

Griselda sentiu o chão se abrir debaixo de seus pés, custando a acreditar que a mulher que outrora a recebera tão bem era a mesma que estava aos berros em sua frente e pior, destilando veneno contra ela, quebrando seu coração. Fez um esforço sobre-humano para não desmoronar em sua frente. Ela não tinha a menor ideia do porquê Tereza Cristina ganhou um espacinho em seu coração. Estava diante de algo tão novo e tão estranho. O que sentia não tinha nome, classificação, rótulo, era apenas algo bom, algo novo depois de mais de 20 anos com o coração sem ser habitado por alguém especial. Casou-se com Pereirinha por questões circunstanciais, imposição social e não por amor e a decepção foi tão grande que se trancou em copas para qualquer sentimento parecido até conhecer Tereza Cristina. Não tinha a menor pretensão de se declarar ou de fazer qualquer coisa. Aquele sentimento era só dela e ficaria ali guardado em seu coração e aceitaria de bom grado qualquer coisa que ela lhe oferecesse, mas aquelas ofensas não eram nem um pouco justas e seu filho, vendo seu estado não pensou duas vezes em se pronunciar em sua defesa.

ANTENOR -Dona Tereza Cristina, dobre a sua língua para falar da minha mãe. Nunca escondi nada, o que faltou foi oportunidade, inclusive a Patty e eu estávamos combinando esse encontro. Tenho muito orgulho da minha mãe, a mulher mais honesta, integra e bom caráter que eu conheço e não é justo a senhora ofendê-la só porque está com ciúmes do seu marido.

TEREZA CRISTINA -Como é que é? Você é filho da naja de bigodes? Como diz o ditado, "Quem puxa os seus, não os degenera". Certamente tão interesseiro quanto.

ANTENOR -Sou filho da Griselda e com muito orgulho e fique a senhora sabendo que o meu único interesse é no amor de sua filha.

PATTY -Chega mãe! Para de ofender as pessoas. A senhora está pensando que é quem? Quem é você para se achar melhor do que alguém aqui em dona Tereza Cristina? Você entra aqui agride todo mundo, humilha e quer se colocar nesse patamar de superioridade?

TEREZA CRISTINA -Quem você pensa que é sua fedelha para falar assim comigo? Sua traidora, igualzinho ao seu pai.

PATTY -E eu fico muito feliz em saber que sou igualzinha ao meu pai e não uma destemperada, arrogante, soberba, esnobe como você. Sabe qual seu problema dona Tereza Cristina, você é tão controladora que não aceita ninguém diferente, que não atenda as tuas exigências, aos teus padrões, porque acredita piamente que todas as pessoas do universo têm que estar ao seu dispor, satisfazer as duas vontades.

TEREZA CRISTINA -Para de ser ingênua menina! Não seja tola. Isso aqui é vida real e será que não consegue perceber o que está debaixo do teu nariz? Será que não percebe que esse rapaz mentiu para você? Aliás, ele mentiu o tempo todo. Por quê ele escondeu de você sua verdadeira origem?

PATTY -O Antenor nunca escondeu nada de mim, o detalhe mãe é que isso não me fez a menor diferença. Essas pessoas humildes aqui em nossa frente estão mostrando que são muito melhores do que você, mais educadas, com um brio que a sua futilidade, sua superficialidade não lhe permite ter. Não se meta na minha vida, graças a Deus que não sou como você, que não quero as mesmas coisas que você, dá para entender isso?

Ao ouvir todas aquelas palavras vomitadas com tanta raiva, da boca de sua filha, Tereza Cristina deu uma gargalhada irônica, antes de proferir seu veneno:

TEREZA CRISTINA -Será que você não percebe sua garota estúpida, que pessoas do nosso gabarito se unem? Que os iguais se misturam?

PATTY -Claro que não, isso é uma máxima pobre. Sua esnobe, autocentrada, narcisista. Isso é coisa de gente que se acha melhor do que os outros, acima do bem e do mal.

TEREZA CRISTINA -Você deve estar bem contente não é René? Com essa sua mentira, colocou até nossa filha contra mim.

RENÉ -Chega Tereza Cristina! Já estou farto dos teus delírios, das suas futilidades, das tuas ofensas e não é justo você atacar dessa forma tão violenta essas pessoas tão honestas, esforçadas, trabalhadoras. Sabe qual é o teu maior problema? Você foi mimada uma vida inteira, nunca precisou se esforçar por absolutamente nada, sempre teve tudo de mão beijada, todo mundo à sua disposição, até mesmo eu que por te amar tanto, de uma forma que nem sei explicar como consigo ter tanto amor em meu peito, errei em ceder a todos os teus caprichos.

Ela simplesmente não podia acreditar no que acabara de ouvir de René. Qualquer pessoa no mundo poderia contrariá-la, menos ele, menos aquele a quem ela mais temia perder. Será que ele não entendia que todo seu ódio era porque estava desesperada e insegura?

René nunca havia levantado a voz para ela daquela maneira e naquele momento o fazia para defender a quem mais lhe ameaçava. Num rompante, passou do modo dragão para o modo catatônica. Não conseguia articular uma única palavra. O ar parecia lhe faltar, tudo foi ficando tão escuro, a cabeça girando na mesma velocidade de um pião até que num ímpeto, partiu para cima de Griselda e só não lhe acertou um tapa porque a faz-tudo era muito mais ágil e forte. As duas se encararam feito duas búfalas e Tereza Cristina tinha suas duas mãos presas no alto de sua cabeça.

GRISELDA -Olhe dona, sou pobre, posso ser feia como você mesma disse ainda a pouco, ser esse macacão ambulante, só que lhe digo uma coisa: Sinto pena de pessoas assim como você, tão covardes e inseguras e pior, com um coração feio, horroroso, mesquinho. Esse é só o meu uniforme e o seu coração? Nunca mais em sua vida sonhe em levantar as suas mãos para mim, porque da próxima vez não serei educada. – e soltou a mulher, deixando-a atônita.

GRISELDA -Seu René, Patrícia eu lhes peço desculpa do fundo do meu coração se de alguma forma eu causei toda essa situação desagradável na vida de vocês. Me desculpem mesmo. – disse respirando fundo – Por favor meu filho, vamos para casa.

Sem mais nenhuma palavra a ser dita, ela e o filho seguiram para seu destino.

Patrícia chorava desconsolada, pois temia perder o seu namorado, diante da fúria e preconceito de sua mãe.

René se aproximou de Tereza Cristina na esperança de que pudessem conversar amigavelmente. Chegou inclusive a pedir desculpas pela forma que falou com ela. Ele também foi surpreendido pelo modo que se comportou, mas aquilo só aconteceu porque sua esposa havia ultrapassado todos os limites do bom senso.

TEREZA CRISTINA -Eu não aceito as tuas desculpas René e de uma coisa fique certo; não pense que vou tolerar as tuas atitudes. Você realmente não perde por esperar – Sibilou em um tom bastante ameaçador.

Ela caminhou em direção a porta de saída mais calmamente do que entrou, voltando para sua casa com seu coração distruido. 

AS APARÊNCIAS ENGANAMOnde histórias criam vida. Descubra agora