Capítulo 17

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Versos Íntimos

Vês! Ninguém assistiu ao formidável

Enterro de tua última quimera.

Somente a Ingratidão – esta pantera –

Foi tua companheira inseparável!

 Acostuma-te à lama que te espera!

O Homem, que, nesta terra miserável,

 Mora entre feras, sente inevitável

Necessidade de também ser fera.

 Toma um fósforo. Acende teu cigarro!

O beijo, amigo, é a véspera do escarro,

A mão que afaga é a mesma que apedreja.

Se a alguém causa inda pena a tua chaga,

 Apedreja essa mão vil que te afaga,

 Escarra nessa boca que te beija!

-Augusto dos Anjos

Mas e se resumirmos apenas no sonho de alguém? E se este alguém acordar? Lembraremos enfim de lhe agradecer pelo sonho lindo que sonho para nós? Pela vida que nos deu? Esse é Deus, e ninguém o agradece por ter nos sonhado, torçamos para que ele não acorde. Em nenhum momento o poder do homem em condições naturais foi elevado perante o poder dos animais.

Afinal, somos todos animais então porque usam isso como ofensa? Ninguém percebe, mas somos tanto animais quando um hipopótamo, tão seres vivos quanto um pé de alface, entretanto não respeitamos os animais e os maltratamos e os usamos a nosso bel prazer e lucro desenfreado. Ao fim somos animais sim, animais por ser homo sapiens sapiens e por ainda perdermos nosso argumento de "maior inteligência perante os outros animais" quando sujamos a nossa própria casa. Nenhum animal destrói sua casa, nenhum animal mata seus próprios filhotes, enfim não somos dignos se sermos chamados de animais.

Em cima da bancada da cozinha minha mãe esta tomando seu chá. O que é estranho, pois está bem de manhazinha e também porque ela nunca toma chá.

-Estava pensando de sairmos hoje. O que você acha?

-O que foi?- Eu estava distraída, divagando sobre varias coisas então nem ouvi o que ela disse.

-Quer sair comigo e o pessoal do trabalho?

Ao contrario das outras mães normais que quando saem com os amigos vão à confraternização de empresas e pizzadas a minha vai com eles a barzinhos. Ela nunca me convida, mesmo eu insistindo e implorando ela não me inclui em sua vida.

-Quando?- eu estava enrolando- Porque eu estava pensando em estudar um pouco de física amanhã.

-Hoje, hoje você não tem nada para estudar.

-Bom, acho que dá sim. Aonde vamos?

-Ah isso é surpresa.

Está tarde, bom, tarde para meus padrões de sono. São dez da noite e meu rímel parece me dar mais sono mesmo isso não tendo lógica alguma. O lugar surpresa é uma boate, local que há muito tempo eu queria ir. Alice acabou ficando em casa, pois, tinha que arrumar um pouco a própria bagunça que fez meu quarto desaparecer, até que não seria tão ruim ela ficar em casa já que teria graves riscos de ficar em coma alcoólico ao ir em lugares assim. Com a ajuda da Lice, acabei por vestir um tubinho preto com transparências nas laterais e um coturno preto e simples. O lugar tinha um nome bem esquisito que nem me dei o trabalho de guardar, mas o que me chamava atenção era para a decoração do local. As paredes estão repletas de coisas aleatórias, pinturas psicodélicas, uma âncora de navio, frases rabiscadas em cartolinas coloridas, estrelas que brilham no escuro e quadrinho de praias eram algumas coisas que recheavam a parede, parede esta que nem se podia ver a tintura. Sentamo-nos em  uma mesa ao lado e depois de alguns minutos os amigos da minha mãe chegaram. Tenho que admitir que gostei bastante deles, pessoas jovens que exalavam sua juventude em cada sopro e que pareciam levar a vida nas mãos e não nas costas como a maioria faz.

Eram 7:30 eu só tinha bebido um drink sem álcool. 8:00 acabei comendo umas batatas fritas da porção pedida. 10:00 arrisquei um gole do vinho da minha mãe. 10:30 tentei um gole da batida com vodca da amiga da minha mãe, da minha mãe? Não, minha amiga. 10:40 cheguei pedindo um cerveja, alego minha aceitação da bohemia. 10:45 mais uma garrafa. 10:50 um energético e uma vodca. 10:55 acho que vou experimentar um conhaque, acho? Tenho certeza. 11:00 o papo ta muito bom mas ainda sim peço um uísque. 12:00- Mãe, posso pedir absinto? –NÃO!

Momentos após o "não" que comoveu a mesa toda, parou as conversas, interrompeu o caso que eu contava de um cara que vi na rua e usava uma bolsa de oncinha, fez os amigos lindos da minha mãe me olharem com desgosto. Respirei fundo, um cheiro horrível de bebida misturada me invadiu. Que nojo. Preciso vomitar. Então apenas sai e os deixei à grande mesa conversando a altos sons, minha mãe não tinha parado a  minha bebedeira porque não tinha nem mesmo percebido, mas depois de ter pedido absinto ela percebeu, tarde demais, se zangou, agora deve estar querendo me matar. Achei o banheiro aos trancos e barrancos e passei mal como nunca antes tinha passado. Minha sorte? A escova de dentes na minha bolsa.

De qualquer forma não poderia voltar àquela mesa. Nunca. Então apenas fiquei no banheiro, escovei os dentes, abri a torneira e joguei uma concha de agua no rosto e no pescoço. A maquiagem borrou. Limpei-a com um papel. Olhei-me ao espelho, o que era isso? Esta era eu?? Transformei-me nisso? Em uma pessoa bêbada, molhada, com os olhos manchados de preto feito um zumbi? Não tive orgulho de mim naquele momento. E minha mãe muito menos sentiria.

Sai do banheiro me esquivando pela parede e calculei que ela iria embora bem de madrugada, de manhã talvez. Meu coração estava aos pulos com o susto que eu a faria tomar, com o desgosto que a faria sentir, mas nada disso era comparável a tristeza e decepção que ela sentiria se me visse neste exato  momento. Então eu sai, cruzei as portas com a sensação de deixar para trás vários erros e pecados, ou varias tristezas e antiguidades e nesse instante um vento forte da noite atingiu meu rosto.

Meu Presente é a LuaOnde histórias criam vida. Descubra agora