𝟎.𝟔 𝑺𝒕𝒖𝒑𝒊𝒅 𝑩𝒍𝒐𝒏𝒅𝒆

304 33 0
                                    

Quinta-Feira 10:47 a

Oops! This image does not follow our content guidelines. To continue publishing, please remove it or upload a different image.

Quinta-Feira 10:47 a.m

Midtown School of Science and Technology

Educação Física. A aula favorita dos atletas e a o ódio pessoal dos nerds e perdedores. Não opcional, obrigatória. Eu poderia até ter inventado uma doença e falsificar um laudo médico mas ainda não tinha tido tempo nem recursos pra tarefa então, ao invés de me preservar, sentada na arquibancada, fui lançada aos cães para um jogo de vôlei.

Primeiro: eu não sabia jogar vôlei, não na prática. Segundo: minha competitividade ia muito além do "não é saudável". E terceiro: minha coordenação motora é bem decente, mas não se tratando de esportes, eu acho, já que nunca fui incluída nesse tipo de coisa. Não era, nem de longe, uma boa ideia me fazer jogar aquilo com um bando de adolescentes com quem eu não me importava. Os resultados podiam ser...desagradáveis.

O uniforme era extremamente desconfortável. A blusa branca até tinha o tamanho certo, mas eu nunca entendi o que aconteceu com o short. Parecia uma peça de roupa para crianças de doze anos. Não que eu fosse alta, muito pelo contrário, mas ainda fiquei com medo de me mexer e acabar revelando algo demais.

Por isso estava sentada no banco, ao lado da cadeira do juiz, com as mãos sobre as pernas, esperando o jogo começar. Eu tava pensando em qualquer coisa, enquanto os nomeados capitães, um garoto alto e musculoso e uma garota loira alta, com porte de modelo, escolhiam os componentes de seus times, quando ouvi chamarem.

-AÍ, NOVATA, HOJE VOCÊ É MINHA! - os amigos do garoto grandalhão sorriam, enquanto a garota loira do outro time revirava os olhos, chamando algum nome

Merda. Praguejei enquanto me levantava, indo em direção ao meu "time". Fiquei entre a satisfação e o ódio encarnado quando senti os garotos me encarando de cima a baixo de forma despudorada. Parei perto do capitão, junto com o último que ele chamou, mas logo fomos levados até nossas posições.

Tudo o que eu sabia do jogo era que não podia tocar duas vezes seguidas na bola, por que o professor disse antes do jogo. Comecei na rede, o que foi bom por que eu tive tempo pra observar como eles jogavam e tentar entender um pouco. Quem sabe eu só precisasse transformar aquilo tudo em física. Angulação, força e trajetória. Talvez desse certo ou ao menos me fizesse evitar uma concussão.

Eu não precisei tocar na bola até o primeiro ponto ser marcado, para os rivais. O que me deixou irritada, eu queria ganhar, apesar de tudo. As posições foram trocadas em um giro. Eu fiquei na lateral, na frente. Uma posição aparentemente importante já que a primeira bola veio direto na minha cara, o que me fez ferver enquanto rebatia desajeitada, mas alto o suficiente para o garoto da rede cortar e fazer um ponto.

-Boa, novata! - ele disse, e eu gostei

O jogo continuou e o lance da física aplicada aparentemente funcionou. Consegui até fazer um ponto. Estávamos ganhando, eu defendia bem, aparentemente. E a capitã do time rival era tão competitiva quanto eu, ou mais. O rosto estava vermelho expressando sua irritação.

Na pausa do jogo, inexplicavelmente, me envolvi numa discussão com ela. Algo que nem sei explicar como começou, mas que acabou em uma disputa ainda mais acirrada entre os dois times e uma bola na cabeça dela, culpa minha, eu admito. Ela foi à enfermaria e a aula foi encerrada. Tomei uma ducha no vestiário, voltando às minhas vestimentas usuais em seguida, e segui pra a próxima aula.

As aulas se seguiram confortavelmente até a hora do almoço, quando a vi de novo, no refeitório. Ela estava acompanhada da ruiva piromaníaca da minha turma de química e parecia muito irritada com o leve inchaço, quase imperceptível, na testa. Me sentei sozinha, como sempre, e passei aquele tempo trocando olhares, nada agradáveis, ocasionais com ela, enquanto comia pela primeira vez em dias.

Nunca pensei que fosse achar um pedaço de pizza duro e com o queijo meio azedo tão delicioso. Tive que me controlar pra não parecer uma morta de fome enquanto eu atacava a primeira comida que eu via em dias com vontade. Os primeiros sintomas da inanição começavam a dar a caras. Fraqueza, cansaço, perda de peso. Minha pele parecia uma folha de papel, fraca e seca. Mas eu não pensava demais nisso, tentava comer ao menos duas vezes na semana e procurava incansavelmente por um emprego.

Terminei o almoço e juntei minha tralha pra continuar as aulas. Saí do refeitório antes mesmo do sinal e fui a primeira a chegar na sala, pegando meu material com o professor e indo sentar na mesa que ele apontou, na terceira mesa da fileira na janela. Eu não pensei que fosse encontrar a garota da educação física em outra aula até vê-la entrar na sala, alisando os cabelos loiros despreocupada. Imagine a minha surpresa quando descobri que ela era minha dupla de calculo.

Ela aparentemente não tinha me notado ainda, pois demonstrou grande surpresa quando olhou para o lado e me viu sentada na carteira vizinha à sua. Sua expressão era de puro desgosto, e a minha, levemente indiferente, era semelhante. Não trocamos uma única palavra durante a aula até o momento das atividades, quando decidimos, em frases curtas, quem faria o que. Não nos demos bem e provavelmente nunca o faríamos.

Depois de uma longa jornada de "estudos", segui a rotina habitual de ida pra casa

Oops! This image does not follow our content guidelines. To continue publishing, please remove it or upload a different image.

Depois de uma longa jornada de "estudos", segui a rotina habitual de ida pra casa. Desci as escadas da estação de metrô, inseri o passe anual que tinha adquirido a alguns dias, visando economizar e garantir que não ia ficar sem transporte mesmo que o dinheiro acabasse, e embarquei rapidamente. Me sentei no vagão praticamente vazio e esperei, com a bolsa encostada no assento ao lado e o casaco nas mãos, sobre o colo, pendendo dos joelhos.

Eu não estava realmente observando, mas não pude ignorar quando um garoto entrou, com um cão guia no encalço e uma senhora atipicamente colorida ao lado. Não pareciam conhecidos, pois diferente da senhora de tutu rosa brilhante, jaqueta roxa e laço verde nos cabelos brancos, que se sentou no fim do vagão, ele veio na minha direção.

Eu não estava muito atenta nele, a velhinha colorida me prendeu demais. Só percebi que ele ia se sentar do meu lado quando ele quase sentou na minha bolsa, mas ao perceber logo soltou um pedido de desculpas, enquanto eu a puxava para o meu colo. Era tão alto, tão bonito. Tinha traços muito bonitos, perceptíveis apesar dos óculos escuros, e um nariz perfeito. Ele ficou calado até o fim do percurso. Bom, do meu pelo menos, já que eu desci antes dele.

Saí do vagão e fui em direção à escadaria da estação, passando em frente a uma TacoBell. O cheiro de comida fez meu estômago doer. O "almoço" nem de longe abafava minha fome. Cada taco custava pouco mais de um dólar. Mas eu não tinha dinheiro comigo. Procurei alguns trocados na mochila e nos bolsos do casaco, mas não tinha nada. Melhor assim, eu pensei, sem gastos fora do planejamento. 

Decidi ir embora logo ao invés de ficar só espiando do lado de fora. Apertando o casaco surrado contra o meu corpo na tentativa de evitar o frio, caminhei um pouco mais depois de subir as escadas da estação, que davam na rua. Fui até a pensão, subi meus cinco lances de escada e entrei no meu quarto, trancando a porta. Larguei a mochila no canto, como sempre, e deixei o casaco pendurado no trinco da porta antes de tirar as botas e me lançar na cama.

Nem sei se dormi ou desmaiei, pois caí nos braços de Morfeu tão rápido quanto meu corpo desabou na cama. Não passavam das cinco quando saí do metrô. O sono me pegou com força, deitada naquela cama velha e mofada, eu nem me importava contanto que não acordasse até o próximo dia e não tivesse que lidar com a minha fome.


Elektra - AvengersWhere stories live. Discover now