02 | sem reservas

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Trancado com dois cadeados, abraçei meu corpo me auto-acariciando, talvez na esperança de manter ainda meus sonhos e a calmaria dentro do meu organismo. Desde que o agente penitenciário saiu, pedindo pra eu esperar ainda mais, então só ouvi muita conversa suja e quase que incompreensiva provindas do lado de fora. Uma janela minúscula por onde a luz saía buscou minha curiosidade. Por detrás daquela cela havia um pátio enorme, limitado por um muro bege e sujo com lodo, aparentando ter mais de 6m de altura, sem contar com um sentinela monitorando os presos com um fuzil no colo como se fosse um filhote de cachorro.

Engoli a seco, recusando de deixar uma lágrima cair. Ao contrário do que imaginei, estava sozinho na cela --- pelo menos naquele momento. Haviam dois colchões puros no chão, com alguns mulambos bagunçados, roupas estiradas e alguns livros, com o qual não tive coragem de mexer. As paredes eram bastante úmidas e frias, me encolhi ao máximo para não encostar em nenhuma delas, cheio de rabiscos e palavrões, desenhos de órgãos genitais e tracinhos, que possivelmente indicava o período de estadia de alguém.

Abracei meu corpo mais uma vez e fiquei vegetando, absorto no meu próprio pensamento, consumido pela imensa desesperança. Era impossível acreditar, mesmo ali diante dos meus olhos, que aquela era a realidade que eu tinha de enfrentar.

ㅡ Gracinha... ㅡ A voz de alguém começou a ecoar através do gradeado, fazendo minha cabeça voltar-se em direção a ele. O preso da cela da frente estava agarrado à própria grade com um canequinho branco, perdendo a cor já, para o lado de fora. O rosto era fino e um pouco apático, mas seus lábios eram carnudos e brilhantes. ㅡ Vai ficar por quanto tempo?

ㅡ ... Espero que pouco. ㅡ Respondi com a voz um pouco ressequida.

ㅡ 'Tá chegando agora, né... ㅡ Ele sorriu, como se eu fosse apenas uma criança inocente e fantasiosa. ㅡ Por que 'cê 'tá aqui? Te pegaram no flagra?

ㅡ Me acusaram de roubo, sem provas. ㅡ Também me agarrei a minha grade. Ele arqueou as sobrancelhas e assentiu com a cabeça. ㅡ Eu sei que vão conseguir me tirar daqui. Deus é justo. ㅡ Ele gargalhou até um pouco alto e desrespeitoso.

ㅡ Ai ai... Talvez ele seja, mas aqui ele não tem comando, não, fi. ㅡ Bateu com a caneca no metal da grade. ㅡ Qual teu nome? ㅡ Engoli a seco e me sentei num dos bancos de concretos que tinha por ali.

ㅡ Jooheon. Lee Jooheon. ㅡ Ele concordou mais uma vez e colocou uma das mãos no queixo.

ㅡ Shownu. ㅡ Suspirei fundo. ㅡ Relaxa. Tu vai sobreviver. Não é nenhum hotel cinco estrelas mas, simplesmente você se acostuma. ㅡ Deu de ombros. ㅡ Tu é uma gracinha, tua boca é bonita e a pele branquinha... É uma pena.

ㅡ Pena... Por que?

ㅡ Toda essa sua beleza aí vai acabar com alguns dia, pode ter certeza. Ah. Cuidado com o cu. ㅡ Sorriu pequeno, quase que pra si mesmo e me deu as costas. Por que eu deveria ter cuidado com minha região posterior? O conselho acabou deixando meu espinhaço fervilhando.

ㅡ H-Hey. Por que você não está lá fora?

ㅡ Ah, eu 'tava de castigo. ㅡ Bebeu da água que estava no caneco. ㅡ Bem que eu precisava de uns dia solitário.

ㅡ Jooheon. ㅡ O agente penitenciário reapareceu, chamando a nossa atenção. Fiquei de pé instantaneamente, cada vez que aquela grade abria eu sentia uma pitada de adenalina. Olhei para o preso da frente, que apontou o guarda com a cabeça e disse pra eu ficar calmo silenciosamente.

Fiz mais um percurso até a sala de mais uma de suas autoridades, sempre de cabeça baixa, bem próximo da parede e acompanhado de dois guardas, além de estar sempre com as mãos para trás. Dentro da sala do policial chefe, tiraram minhas medidas, me passaram as mesmas regras de quando cheguei aqui mais uma vez e tiraram aquelas típicas fotos de presidiário. Todo o procedimento aparentava ser indolor, mas era de uma miséria tão grande que comecei a me sentir um nada. Um ninguém.

ㅡ Você tem algum problema, é de facção criminosa, tem rivais na cadeia? É pra sua própria segurança. ㅡ O guarda perguntou.

ㅡ Não senhor.

ㅡ Nem dívidas com gangue, coisas desse tipo? Não, né? ㅡ Neguei novamente. Depois disso me deram o temido uniforme, alaranjado como a cor do meu cabelo. Meu pé ficou protegido apenas por uma havaianas simples e branca. Fui levado de novo a minha cela, pelo menos eu poderia me distrair conversando com o preso da frente, mas quando espiei estava tentando tirar um cochilo.

Sentei no banquinho de concreto mais uma vez e vi o tempo morrer de forma agonizante. Quando a cela abriu novamente, os guardas vinham trazendo mais três dos presos --- os que provavelmente eram donos daquela. Me estiquei um pouco assustado. Tinham o rosto feroz e um deles viera diretamente até mim tocando minha bochecha de forma suspiciosa.

ㅡ Olha só o que temos aqui... Uma princesinha. ㅡ Afastei a mão do cara instantaneamente, o fazendo fechar o rosto. ㅡ 'Tá maluco?

ㅡ Não me toca. ㅡ Falei um pouco rude e bravo, mas me arrependendo ao ver os três rostos agora franzidos. ㅡ Por favor... ㅡ Pedi como um sussurro.

ㅡ Ha. Mas tu mal chegou e já 'tá causano, fi? ㅡ Um deles afastou o que havia me tocado e se agachou em minha frente. ㅡ Qual teu nome? ㅡ Meu corpo agiu antes que meu cérebro, as lágrimas se formaram sem que eu tivesse pedido. Ele se afastou enquanto os outros riram da minha cara. ㅡ Aigoo. Tudo bem, não carece de dizer. É só porque aqui nós tentamo estabelecer uma boa convivência, morô? O que você fez agora... ㅡ Apontou com o indicador como se fosse uma arma ㅡ Nóis vai perdoar porque é o primeiro dia. 'Tá se cagano de medo. ㅡ Não neguei nem fiz nada, estava mesmo.

ㅡ Fica de boa. ㅡ O que havia encostado zombou e jogou-se no colchão. ㅡ Vai aprender como as coisa aqui funciona. E se eu fosse você... Eu parava de chorar que nem uma criancinha. 'Tô dizeno do fundo do meu coração. ㅡ Limpei meus olhos rápido, não querendo duvidar nem um pingo das consequências implícitas naquele conselho.

Mesmo que me entupissem de perguntas ou cantadas e piadas horríveis, carregadas de insultos e preconceito, eu não saí daquele banco de concreto. Não falei nada. Não pensei nada, apenas parecia ter parado de funcionar por alguns instantes.

ㅡ Lee Jooheon, você foi transferido. ㅡ A voz do agente me tirou dos devaneios. Torci pra que fosse pra uma cela com pessoas melhores.

RODEO | MONSTA XOnde histórias criam vida. Descubra agora