Prólogo

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...Olá?,

Este caderno é um diário.

Decidi escrevê-lo, caso alguém, em algum momento, tenha interesse na vida de um adolescente qualquer. Bom, quase um adolescente qualquer.

Meu nome é Lucas Faye, tenho 16 anos e sei exatamente o dia da minha morte.

Perdão por ser tão direto, normalmente as pessoas escrevem aquilo que acham mais importante primeiro, não é?

Nasci em Abril de 2003. O dia exato não é importante, pelo menos ninguém nunca se importou.

Acho que não existem muitas coisas interessantes sobre minha personalidade. Sou um garoto simples, gosto de livros e filmes que abordam o amor à vida. Mas só. Sabe, já que sei quando irei morrer, algumas coisas parecem mais vazias. Não sei bem explicar. Sinto como se não adiantasse nada aproveitar a minha vida, sabendo que ela vai acabar rapidamente. Parece esforço jogado fora...

O mais interessante sobre mim é apenas esse estressante "poder", que não me deixa viver em paz.

Já pesquisei na internet várias vezes procurando pessoas com a mesma habilidade, mas sempre encontrei coisas variadas, como adultos que conseguiam fazer seu corpo virar um imã e colar colheres nos quadris ou crianças inteligentes demais para a idade. Mas nunca encontrei alguém relatando que sabia a data da própria morte.

Não me recordo ao certo quando descobri que iria morrer. Mas foi cedo, pois desde os 8 anos, comecei a perder a esperança. Os sonhos machucavam, e não faziam mais sentido para mim. Não fazia sentido imaginar um futuro que não aconteceria.

Mesmo sabendo de tudo, não deixei de fazer as coisas que as outras crianças e adolescentes da minha idade faziam. Não que eu mesmo me importasse, mas se demonstrasse algo diferente, meus pais talvez ficassem preocupados comigo. Não quero deixá-los tristes antes de partir. Se tenho de ir, por que não deixar boas memórias para eles?

Acho que esta é a única coisa que sinto orgulho em mim: me importo muito mais com os outros do que comigo mesmo.

Por conta disso, não tentei ter relações afetivas com outras pessoas. Meus pais são os únicos que me dei ao luxo de conversar, já que os deixaria preocupados se me afastasse demais. Meus outros familiares tentaram se aproximar algumas vezes, mas não permiti que gostassem de mim, que me amassem. Quero deixar o mínimo de pessoas tristes para trás, assim, talvez, eu encontre algum sentido. Não em minha vida, mas sim, em minha morte.

A relação com meus pais não é algo que se pode considerar real, porque os encho de mentiras. Digo-lhes que tenho amigos, saio com algumas garotas, uma popularidade alta na escola e até mesmo que participo de clubes à tarde.

Na verdade, não conheço ninguém naquela escola. Sempre afastei a todos, mesmo aqueles que tentaram me dar um simples "bom dia". Nunca me interessei amorosamen... Vamos deixar isso de lado, por enquanto. Não sou popular e muito menos participo de clubes à tarde. De fato, o que eu faço, é andar inúmeras vezes pela cidade, esperando chegar a hora certa de voltar para casa. Quando invento que tenho uma festa para ir, digo à minha mãe um endereço totalmente aleatório e caminho ao redor daquele local até o horário correto. Depois, pego um Uber e volto para casa.

Sempre foi assim. Nunca tive dificuldade em esconder as coisas, não pensei em ter amigos e sequer queria uma relação amorosa com alguém.

Quer dizer, até Ela chegar naquela escola.

A pessoa a quem me refiro se chama Letícia. Uma garota alta, com cabelos escuros e pontas loiras, olhos castanhos clareados, que transmitem um ar de mistério e compaixão. Tinha se mudado para São Paulo há alguns meses e se matriculou no meu colégio, no meio do ano, por acaso.

Acho que, também por acaso, ela foi escolhida como minha parceira no trabalho interdisciplinar. Também deve ter sido coincidência os professores a colocarem do meu lado nas aulas. Eu realmente espero que tenha sido tudo na sorte, pois senão teria um bom papo com o universo.

Ela era excessivamente chata e cabeça dura. Não importava quantas vezes eu a ignorasse ou cortasse a conversa, ela insistia na ideia de falar comigo, até o momento em que eu cedi à sua idiotice e resolvi conversar um pouco.

Como resultado, estamos conversando frequentemente, já faz dois meses. Sua implicância me levou a me aproximar demais, e por um momento eu esqueci que iria morrer. Então me deixei levar por QUATRO MESES INTEIROS!

Graças a isso, agora sei tudo sobre ela. Conheço seu jeito de andar, como fica irritada com a palavra "alcachofra" e até mesmo o quão babaca era seu ex— namorado da outra cidade. Sei quão rápido seu humor pode mudar, o quão amável pode ser, o quão lindo seu sorriso é, como ela fica fofa sem óculos e quão legal ela fica quando pratica esportes.

Graças a um pequeno momento de irritação, eu me apaixonei por ela. Graças àquela merda de momento, eu comecei a ter apreço pela minha vida, pois quero passar mais tempo com ela.

Isso não é justo, não é nem um pouco justo. Faltam apenas 12 dias até a minha morte, e eu me apaixono pela única pessoa que se mostrou interessada pela minha vida.

Do quê adianta amar se eu sei que não vou poder estar com ela pra sempre?
O amor não era pra ser algo bonito? Como num conto de fadas?

Quando entendi que, agora, existia um motivo, chorei. Nunca tive sentimentos tão fortes quanto esses. Por que todos podem ter uma vida, e eu não?

Quando eu morrer, depois desses 12 dias, espero ter deixado apenas memórias boas. Memórias que, após a minha morte, vão ao menos deixá-la feliz. Agora que tenho alguém que confia em mim, não posso falhar, em momento algum.

Estes 12 dias serão os melhores de sua vida.

E os restantes da minha...

12 dias até minha morteWhere stories live. Discover now