Amendoeiras | 1927

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Prólogo

Amendoeiras-PE, 1927

Uma mulher sertaneja, uma jovem mãe, ainda muito moça, se levanta cansada durante a madrugada ao ouvir de seu bebê um choro estridente. Ela o toma em seus amorosos e magros braços de veias à saltar, e indo sonolenta até uma dura banqueta junto à parede de barro, descobre um de seus seios; de imediato o choro da criança cessa. Enquanto amamenta, Simélia se entrega ao sono fechando seus olhos que não se sustentam abertos e descansa por um breve instante. Uma voz rude rompe o silêncio a assustando.

ㅡ E quando esses 'peito' aí secar, ele vai se alimentar de quê?

ㅡ Não dorme não, é? - resmungou ela.

ㅡ E a preocupação deixa eu dormir? - disse Damasceno, seu marido.

ㅡ Tu tá é bêbado! - susurra ela quase que inaudível de tão exausta.

Um falso silêncio perdura. Simélia conhece o marido que tem. Conhece a inquietação que o consome, e, por conta do cheiro de cachaça provindo dele, finge cochilar para evitar uma discussão àquela hora.

ㅡ Não vou ficar aqui e morrer de fome. Vou pra São Paulo! E tu vemcomigo. Deixa o menino com... véi Cantarino cuida!

Simelia se mantém calada. Damasceno busca aborrecê-la; é forte o odor de pinga que vem com suas palavras carregadas de murmuração.

ㅡ Tu vem junto, visse? E não tem quero-nem-não-quero! ㅡ insiste ele.

Damasceno a provoca, enquanto ela se mantém calada, o deixando ainda mais irritado.

ㅡ E teu pai que não se meta comigo. Eu já não gosto dele mesmo. Pr'eu fazer uma desgraça é num instante!

Percebendo que o bebê já havia mamado o suficiente, Simelia o escora em pé sobre seu tórax com a cabeça descansando em seu ombro esquerdo para que a criança arrote. Damasceno insistente em ficar falando irritantemente, enquanto Simelia, com admirável paciência e serenidade, cantarola baixinho junto ao ouvido do filho batendo as pontas dos dedos em suas costinhas. Jubel, que ao golfar sobre a fraldinha e parte do ombro da mãe, é posto de volta para dormir.

Ignorando Damasceno, que a inferniza com falas autoritárias e ofensivas, Simelia vai até a mesa e toma um copo d'água do pote de barro, vira as costas e também vai se deitar. Damasceno vai até o canto da casa, onde guarda sua sua zabumba, e a tomando, ameaça querer tocar àquela hora da madrugada, só para irritar sua esposa, ele até inicia algumas levadas confusas, mas, graças às preces silenciosas de Simelia em sua cama, Damasceno larga de lado o instrumento e não demora para também pegar no sono; no chão da cozinha da pequena casinha de taipa.

Quebra-PedraWhere stories live. Discover now