FAZENDA SALOMÃO

5 1 2
                                    

Fazenda Salomão, de coroné Pedro Cantares. Lá de dentro dos cercados do casarão um empregado anuncia entusiasmado.

ㅡ É Cantarino que vem lá!

Já era manhãzinha quando Zé e Jubel apontaram na estrada da fazenda. O sol, preguiçoso, surgia lento, como quem não querendo sair debaixo do cobertor do horizonte. Jubel desceu, abriu a cancela, Zé passou com os dois cavalos e os prendeu no cercado, sob os cuidados de Jubel. Já na entrada da casa do patrão, seu Cantarino bateu na porta e tirou o chapéu, ajeitou do jeito que deu seu cabelo grisalho e todo amassado. Uma senhora saiu à porta, era a patroa.

ㅡ Às suas ordens, dona Inês. Seu Pedro está! ㅡ disse respeitosamente tímido o velho vaqueiro com seu chapéu de couro conduzido ao peito por sua mão direita.

ㅡ Venha, Zé. Se achegue. Pode entrar! ㅡ disse ela pondo a mão sobre seus ombros magros.

Zé se abaixou para desatar sua percata de couro, para não adentrar calçado e sujar o chão de madeira, sempre polido, mas dona Inês o repreendeu por isso.

ㅡ Não faça isso não! Deixe de coisa, seu Zé. Ajeite a percata e entre com ela!

ㅡ Vai sujar o piso, dona Inês! ㅡ tentou argumentar.

A esposa de seu Pedro Cantares, ou Pedro Grande como também é conhecido, acompanhou Zé Cantarino, atravessando toda a casa. Lá na cozinha, onde estava uma das filha de dona e Inês e também uma empregada, havia, já todo ajeitado, os mantimentos que que seu Zé fora buscar.

ㅡ Meu Deus do céu, é coisa demais, patroa! ㅡ disse acanhado Zé Cantarino.

A filha de dona Inês o ajudou a levar as coisas até os cavalos, enquanto do lado de fora da fazenda, surgiu na estrada um pomposo senhor cavalgando, era Pedro Grande que vinha de averiguar suas terras com alguns de seus capatazes.

ㅡ Quebra-Pedra? ㅡ disse lá de longe ㅡ te dou uma moeda se tu abrir ligeiro a cancela!

Jubel, com rapidez tamanha, tratou logo de escancarar a cancela, por onde passaram Pedro Cantares e seus homens. O coronel, satisfeito com a ligeireza de Jubel, lhe atirou as moedas que prometera.

Descendo as escadas da frente do casarão, Zé Cantarino vinha com as sacolas de mantimentos para botar nos cestos da cangalha, quando se encontrou com seu patrão.

ㅡ Vai pra onde, Cantarino? Já tomasse café?

ㅡ Já, sim sinhô!

ㅡ Então bora ali 'mais' eu, na venda de seu Viera! Eu só vou entrar um instante, que eu tô apertado, e a gente já vai, visse?

Cantarino aproveitou o tempo para ajeitar os mantimentos na cangalha. Mas logo Pedro Cantares apareceu, e eles foram para a única venda do povoado de Amendoeiras. Jubel ficou na casa, fazendo companhia para dona Inês.

Bonecos De Barro De Caruaru

ㅡ Pega ali aquela sacola! ㅡ pediu dona Inês para sua empregada.

A moça tomou a sacola e a entregou. Jubel estava perto da passagem entre a sala e a cozinha, escorado na parede.

ㅡ Lembrei de tu, Jubel! ㅡ disse dona Inês, tirando da sacola, alguns bonecos de barro que comprara na feira de Caruaru.

Jubel foi até ela com olhos brilhosos, braços esticados e mãos completamente abertas. Tomou os bonequinhos, cheirou

ㅡ Meu sonho era ter 'buneco di barro'! ㅡ comentou feliz.

ㅡ Agora tu já pode jogar fora aquela banda de casca de coco com aquelas pedrinha que tu fica saculejando, visse?

ㅡ Ali não, dona Inês. São meus caba de briga, aquelas 'péda' e meu coco! ㅡ disse Jubel.

ㅡ Zuada danada! É um "pléc-pléc-pléc" que ninguém aguenta,  Jubel! ㅡ disse dona Inês, aos risos.

ㅡ Eu brinco longe. Pra não pertubar o povo, e ninguém arengar com eu! ㅡ Justificou.
***

Na venda de seu Viera, coroné Pedro Cantares pediu ao dono do estabelecimento.

ㅡ Bote duas 'lapada' de cana aqui pra gente, seu Viera! Tem tripa assada?

ㅡ Tem, coroné!

ㅡ Apois traga de tira-gosto!

Coroné Pedro Cantares tomou numa lapada só a cachaça que seu Viera servira. Pediu outra em seguida

ㅡ E como tá as coisas lá na tua casa, Zé?

ㅡ Tá tudo bom, todo mundo com saúde. Jubel tá crescendo, mas tá meio arteiro, tô precisando ter uma conversa com ele!

ㅡ Criança é tudo assim, Zé. Jubel é menino bom; esperto que só a gota. Tem tudo pra ser o melhor vaqueiro depois de tu nessas redondeza! ㅡ Tome, coma tripa! Tá bem frita, ói, chega tá sequinha!

ㅡ Perto de mim Jubel é um santo, mas quando sai pra rua, pra brincar, aí pode esperar que vem arte ㅡ comentou Cantarino mastigando o tão adorado petisco.

ㅡ Então, Zé, preciso que tu leve umas dez, doze 'cabeçinha' de gado lá de casa até a fazenda de Genaro Duarte, na estrada que vai pra Sete. Tem que levar o gado até sexta que vem, tá bom?

ㅡ Na quinta feira, eu garanto que todo o gado vai estar entregue, meu patrão!

ㅡ Eu tenho é certeza disso! Duas 'coisa' é certa em minha vida: a morte e ficar 'sastisfeito' com seu serviço, Cantarino!

Cantarino acompanhou Pedro Cantares até a fazenda. Lá, chamou Jubel e os dois foram pra casa, levando os mantimentos e a cabra que jubel mesmo amarrara em sua égua. Era por volta das onze da manhã e Jubel, com fome e sede, parou no cajueiro, e apertando o fruto, fazia toda a água do caju cair em sua boca sedenta, fez isso até estufar a barriga, depois, encheu as bolsas de couro e alcançou seu avô, que seguia devagar a frente.

Sol forte, cavalo suado, horizonte trêmulo por causa do calor. Sombra só do cajueiro por ali. Vegetação baixa já toda desbotada; amarelada, sem nenhum sinal de verde; o hábitat do sertanejo; do forte.

***

|Quebra-Pedra|

Quebra-PedraOnde histórias criam vida. Descubra agora