Zelação

5 0 0
                                    

ㅡ Vai com Deus, Zelação! ㅡ gritou feliz o menino vaqueiro ao ver um fino risco dourado cortar o escuro céu da madrugada sertaneja. Ao seu lado, seu avô, levando da cabeça ao peito o seu velho e surrado chapéu de couro, fechou os olhos e fez uma discreta prece. Jubel espiando, repetia tudo o que o avô fazia, sem tanto entendimento, ele apenas imitava o avô em tudo.

Na passada calma do cavalo, Jubel admira o escuro firmamento e as estrelas do céu. Cantarino aprecia a natureza à sua volta, vendo as aves à gorjear: o currupião que canta longe, a pombinha picuí, que mansinha gorjeia perto, revoadas de curutiês pousam nas árvores, o bem-te-vi que canta solitário  no cajueiro.

ㅡ 'Ói' lá, Jubel, pé de caju! Chega cheira, 'ói'! ㅡ

ㅡ Posso apanhar pra levar pra casa, avô?

ㅡ Apanha na volta!

Por cima de seu seu grisalho bigode passava a fumaça exalada pelo nariz do tragar do fumo. Zé seguia com seu olhar manso e sereno, de vaqueiro experiente. E Jubel a olhar a todo instante com benquerença para seu avô; seu herói.

ㅡ  Meu vô?

ㅡ Hm?

ㅡ 'Vamo' derrubar gado hoje?

ㅡ Não, sinhô! Vamos só buscar a feira na fazenda!

ㅡ  Dona Filomena deu uma cabra também?

ㅡ Sim, sinhô!

ㅡ O senhor deixa eu amarrá ela e joga em riba da égua?

ㅡ Já amarrasse cabra? E se ele escapar?

ㅡ Escapa não, meu vô. O sinhô que me ensinou o nó!

Vinham, das bandas de lá, uma dupla de vaqueiros, eram os vaqueiros do coronel Provérbio, desafeto de Pedro Grande, patrão de Zé Cantarino. Um dos vaqueiros de lá, disse alguma coisa para o outro parecendo falar de Zé Cantarino, ao chegarem perto um do outro, um dos vaqueiros de Provérbio, disse:

ㅡ Tú é cabra direito, véi Zé, mas aquele teu patrão é sem vergonha, visse? O cabra safado é aquele Pedro! Deixa aquele véi pra lá, macho. Tú mancha tua história andando junto dele!

O olhar sereno de Zé Cantarino se mantinha, e sem responder nada aos vaqueiros, com apenas um sútil cumprimento de cabeça, seguiu seu caminho. Ao passar pelos vaqueiros, já há boa distância, Zé ouviu um deles provocarem lá de longe "Pedro Grande, cabra safado". Zé Cantarino nem olhou para trás, Jubel não compreendia, mas percebia a oposição dos vaqueiros perante o patrão de seu avô.

ㅡ Por que eles estão falando de seu Pedro, meu vô?

ㅡ São uns 'besta'!

ㅡ Coroné Provérbio e seu Pedro são inimigos, vô?

ㅡ Dois besta! - limitou-se a responder Zé Cantarino.

***

|Quebra-Pedra|

Quebra-PedraOnde histórias criam vida. Descubra agora