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-Eu posso levar o Caetano hoje para a escola. -Meu pai falou enquanto colocava café na caneca. 

-Não precisa, eu mesma levo. -Olhei a hora no celular. -Se sairmos agora dá tempo. 

Os meus pais trabalham na casa da família Soares que está mais para um sítio, na verdade... E como todo bom sítio de gente com dinheiro tem uma casa para o caseiro e é nela que moramos. O meu pai cuida da parte externa do sítio, limpando a piscina, alimentando os animais e cuidando do jardim. Já a minha mãe fica com a parte da limpeza da casa e comida. Com isso, quem passa a maior parte do tempo com o pequeno sou eu. Os patrões deles não são daqueles metidos e sem noção o que não posso falar do filho, esse ai é um sem noção total! 

-Sério, Anne? -Meu pai me olhou. 

-Sim. -Levantei da cadeira e procurei uma imagem da escola do Cae, meu irmãozinho, no celular. -Vamos para a escola. -Mostrei a foto para ele que sorriu. Ele ama a escola.

Bom, para aqueles que não entenderam porque eu fiz isso, acho que vale uma explicação logo de cara. O Cae foi diagnosticado com autismo ainda muito pequeno e ele faz parte dos que não são verbais, ou seja, ele não desenvolveu a comunicação verbal, por isso nos comunicamos por figuras com ele. Isso não quer dizer que ele não entende quando falamos com ele, pelo contrário, entende tudo. 

Desde quando descobrimos seu diagnóstico, meus pais fazem o possível e o impossível para pagar bons profissionais para ele ter a melhor qualidade de vida possível, por isso estamos sempre precisando de dinheiro, afinal (infelizmente) não é barato manter uma boa intervenção e tratamento. 

-Tchau, pai. -Dei um beijo em sua bochecha e o Cae fez o mesmo. 

Pegamos nossas mochilas e saímos de casa. 

Ele estuda em um colégio particular que é muito interessado e preocupado com a questão da inclusão, o que faz total diferença para o seu desenvolvimento. Já eu, consegui uma bolsa no mesmo colégio que o filho dos patrões do meu pai estuda, um dos melhores, e mais caros, colégios do estado. A caminhada até a escola do meu irmão não era longa, mas era o caminho ao contrário da minha e isso fazia com que eu tivesse que acordar mais cedo do que o necessário. 

-Beijo. -Abaixei-me para receber um beijo do meu irmão e depois de beijar minha bochecha, ele virou a dele para que eu beijasse também. 

Saiu correndo para dentro da escola, animado.

Dei meia volta e fui para a minha escola, para começar meu último ano na escola. Amém! 

Não é que eu não goste da escola, mas não vejo a hora de entrar na faculdade e aprender sobre coisas que possam me ajudar a cuidar do meu irmão. Obviamente eu já sei muita coisa, pois estou sempre lendo e acompanhando profissionais da área, faço várias intervenções e ajudo como posso, mas sei que a faculdade vai abrir muitas portas e trazer muitos outros conhecimentos que eu ainda não adquiri. 

Levou uns vinte minutos até eu chegar na escola e outros cinco para eu descobrir qual seria a minha nova sala. Olhando o papel com os nomes, tive uma surpresa boa e várias outras ruins. 

Primeiro, fiquei na mesma sala que minha melhor amiga, a Liara.

Segundo, o mala do Bernardo e seus amigos também ficaram. 

Seria um longo ano, com piadas sem graça durante a aula interrompendo os professores e eles enchendo o meu saco, assim como de todo o resto da escola que eles não gostam ou que não são tão ricos quanto eles.


De repente tudo mudouWhere stories live. Discover now