E se fosse verdade?

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A sala de aula está vazia. Cheguei cedo como não costumo chegar e peguei um lugar no meio da sala como costumo fazer. O objetivo era me colocar em movimento, sair de casa um pouco, pegar um ar.

A noite passada foi terrível.

Lola pareceu completamente chocada, levou minha negativa como uma rejeição e essa rejeição como uma ofensa. Tive que explicar algumas vezes como não havia nada de errado com ela, com seu corpo ou com seu cabelo, que o problema era eu, eu estava cansado, estava sem vontade.

Ouço a porta se abrir e Pedro entra sem sequer carregar sua mochila, ele caminha até mim e se joga ao meu lado, um pequeno sorriso triste no canto dos lábios.

— Na merda, meu caro?

— Tanto quanto você, aparentemente — Ele ri um pouco, a voz meio rouca o faz soar cansado.

— Touché. Não dormi bem essa noite.

— Por causa dela?

Ele assente, o rosto já sem traços do falso humor. Cruzo os braços no peito e balanço a cabeça.

— Você sabia que era suicídio tentar algo com uma professora, mesmo tento idade, ela ainda é sua professora.

Repito o que lhe disse um milhão de vezes, desde a primeira vez que ele mencionou a quedinha sobre a professora de edição. Disse novamente quando ele conseguiu um estágio para ficar perto dela, mas o sentimento parecia ter feito do meu bom amigo um animal estupido.

— Você está sendo moralista Damien? E olha, eu não cheguei a tentar diretamente... quer dizer, como eu poderia? Ela tá sofrendo. Tem esse ex noivo dela que ela gosta e... — ele se interrompe e suspira. — Cara, isso é o inferno. Precisava de um colo, mas meu único amigo que me dava colo tá puto, nem olha na minha cara, eu sou um merda.

— É tudo sobre essa consciência de classe — É a minha vez de dar um pequeno sorriso. — Lucas me disse que você conversou com ele.

— Conversei. Na verdade eu não sei se implorar perdão se enquadra numa conversa, mas eu falei com ele.

Desvio o olhar para o projetor. A sala já não estava extremamente vazia.

— E como ele reagiu?

— Bem, eu acho. Você conhece o Caio, ele é difícil de ler, vive com aquela cara emburrada, mas eu acho que ele vai me perdoar, com o tempo, sabe? Pelo menos eu espero. — Pedro me dá um tapinha no ombro, algo como um incentivo. — Você devia se desculpar também.

— Eu me desculpei, mas... as coisas mudaram, eu não sei se podemos voltar a ser amigos como um dia fomos.

O pensamento é como um alfinete em minha pele. Me incomodava mais do que eu gostaria de admitir falar algo assim em voz alta.

— Claro, isso porque vocês dois nunca foram só amigos.

Reviro os olhos.

— Não começa.

— Damien eu posso ter tido uma abordagem completamente merda sobre a questão, mas fatos são fatos e você, meu querido amigo, gosta do Caio desde que colocou os olhos nele.

Eu teria rido se algo desse tipo me fosse tido algum tempo atrás. Eu teria digo calmamente que meu amigo emburrado e cabeça dura não fazia meu estilo, mas nada disso pareceu engraçado agora.

— Se fosse assim, eu saberia.

Eu me defendo, porque é o que faz sentido. Eu saberia, certo?

— Mesmo? Porque eu tenho minhas dúvidas se você sabe a diferença entre tesão e amor. E olha, eu acho que por ele você tem os dois.

Oblíquo Where stories live. Discover now