3 • Traga a impostora de volta

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Se você deixa as janelas abertas durante uma tempestade, sabe que terá que arrumar a bagunça depois. E bem, havia chegado minha hora de tentar consertar a minha.

Parada diante da porta âmbar do meu chefe, eu bati nela e cumprimentei uma pessoa aleatória que passava pelos corredores da editora. Minha cabeça doía pela ressaca — assim como o Sr. Louswood previra — e pelo estresse de ter arruinado a cópia do livro que deveria revisar. Agora, a caminho de prestar contas sobre o acidente, eu estava nervosa e apesar de alerta, ainda me assustei quando, de supetão, a porta abriu.

Por uma fresta, a figura elegante de Scott Nurbury surgiu para mim. O dono da editora que levava seu sobrenome era um homem alto e de meia-idade, com feições alongadas e cabelo loiro sempre perfeitamente penteado para trás. Ele vestia preto e seus olhos azuis eram sérios e atentos, mas ao contrário do que a primeira impressão entregava, estava longe de ser um carrasco. Na verdade, era um chefe prático e um bom amigo.

Ao me ver, o Sr. Nurbury sorriu e fez sinal para que eu entrasse na sala.

— Fique à vontade, Mysie. A que devo a honra da sua visita? — Ele passou por mim para sentar-se atrás da sua mesa e gesticulou para que eu me acomodasse à sua frente.

Repousando na cadeira acolchoada e clássica, eu respirei fundo. Ao nosso redor, as paredes estavam escondidas por estantes repletas de livros, e as lombadas deles eram organizadas metodicamente por autor, coleção e cor. Atrás da mesa, a única janela do cômodo deixava à mostra o céu ainda encoberto pelas nuvens atípicas dos últimos dias. Tudo na sala soava como se estivesse intocado por séculos e, de alguma forma, essa sensação me reconfortou antes que eu engolisse em seco para começar a falar.

— Preciso conversar com o senhor sobre o original que me entregou na sexta-feira. Houve um acidente e acabei danificando algumas páginas dele. A leitura ficou impossibilitada e isso prejudicou o começo da revisão. — Algumas páginas. Quanto eufemismo da minha parte, pensei. — Me desculpe, Sr. Nurbury, foi um descuido inaceitável. Eu assumo total responsabilidade pelo erro e pelos custos da nova impressão.

Com as mãos unidas e nervosas no colo, eu esperei pela resposta do Sr. Nurbury, mas em silêncio, ele apenas balançou a cabeça suavemente como quem havia entendido. Apanhando o celular da mesa, ele digitou algo e voltou a me olhar.

— Pedi que fizessem outra cópia para você. Ela deve estar pronta depois do almoço. — Finalmente falou, checando o relógio de pulso. — E não precisa se preocupar com custos nem nada do tipo, Mysie. Todos cometemos erros e seu trabalho é sempre impecável. Só peço que não deixe que isso aconteça de novo e que termine a revisão no prazo, apesar desse contratempo.

— Não se preocupe, a revisão não vai ser prejudicada e isso não vai mais se repetir, eu garanto — assegurei. — Muito, muito obrigada.

O agradecimento soou quase como um suspirar de alívio. Eu estivera tão nervosa sobre aquilo a manhã inteira que minha cabeça parecia explodir. Ao menos não ficaria desempregada.

— Disponha, Mysie. — O Sr. Nurbury respondeu e antes que o silêncio se instalasse de novo, continuou com a voz quase paternal, parecendo escolher cautelosamente as palavras: — Agora, já que tudo foi resolvido e está aqui, também tenho algo para falar com você. Na verdade, se me permite, quero lhe dar algo. Não como seu chefe, mas como seu amigo.

Um pouco surpresa e sem saber bem o que dizer, eu não evitei franzir o cenho, mas desfazendo as linhas tensas, assenti. À minha positiva, o Sr. Nurbury sorriu e abriu uma gaveta da sua mesa, tirando de lá um embrulho de papel kraft e o entregando a mim. Eu segurei o pacote e analisando seu peso e formato, concluí ser um livro.

Trago Seu Amor de VoltaWhere stories live. Discover now