8 • Traga o baile de volta

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Um puxão de Lila nas fitas do espartilho me solavancou contra o dossel da cama outra vez. De todas as coisas que havia experimentado naquele dia atípico — para dizer no mínimo —, aquela com certeza era uma das mais desagradáveis. Suspirando, eu apertei a madeira fria sob meus dedos e fechei os olhos.

— Tem certeza que preciso mesmo usar isso? — Minha pergunta foi baixa e quase inocente, mas acabei por ganhar de Cordelia um aperto especialmente forte no corset.

— Sim, você tem. — Ela respondeu. — Nunca gostou do espartilho, mas está especialmente rebelde hoje, hum? E veja que você já é sempre bastante rebelde.

— Ah, eu sou? — indaguei casualmente, na esperança de que as perguntas despretensiosas revelassem mais sobre minha vida ali.

— Você acha que não? — O tom de Lila foi sugestivo e ela balançou a cabeça. — E além de tudo, ainda tenta me levar para o lado das suas rebeldias.

— E eu consigo? — murmurei ironicamente.

— Para minha infelicidade, sim. — Ela lamentou, ainda que com um sorriso travesso no rosto.

Lila terminou meu espartilho e risadinhas cúmplices de nós duas encheram o cômodo enquanto eu me endireitava, apanhando o vestido que usaria para o baile. O tecido cintilante era rosa-claro, e no lugar das golas altas que usara durante o dia, havia agora um grande decote canoa. As mangas reduziam-se às tiras de organza rendada que cobriam alguns centímetros dos meus ombros, e a longa saia arrastava no chão, toda em seda reluzente e bordados brilhantes. Cuidadosamente, eu passei a roupa pela cabeça e ela enluvou meu corpo. Pelo reflexo no espelho, vi quando Lila aproximou-se novamente para me ajudar a abotoar o vestido.

— Os hóspedes trouxeram realmente muitas bagagens para essa visita. As malas pareciam não acabar nunca — mencionei, voltando às minhas indagações sutis. Havia visto os pertences indo e voltando pelos corredores durante todo o dia.

— É claro! — Cordelia concordou, me observando pelo espelho enquanto continuava com os botões. O verde-escuro da sua roupa pareceu ainda mais profundo perto da cor suave do meu vestido. — Esqueceu que eles ficarão aqui até o dia da votação?

— E como eu poderia esquecer da votação? — indaguei, esperando que a deixa para puxar o assunto a fizesse me dar alguma informação sobre ele.

— Nem me fale! — Lila suspirou, um sorriso se formando em seu rosto. — Também penso nisso o tempo inteiro. Quando o voto feminino for aprovado, finalmente ganharemos algum espaço nesse país. Tio Wilson contou que o Parlamento ainda está dividido, mas que os outros lordes estão cedendo à pressão das manifestações, e com somente mais alguns votos, a medida será mesmo aprovada. Por isso, o nosso duque de Bronshire reuniu esse grupo em nossa casa, para facilitar as reuniões finais. Mal posso acreditar que depois de tantos anos de movimento sufragista, isso está mesmo acontecendo!

Sobrecarregada pelas informações, eu assenti com um sorriso forçado e Lila resfolegou como quem sonhava com o futuro. Um instante de silêncio se fez e eu o aproveitei para ajustar minha mente às duas novas informações que acabara de conseguir:

Primeiro, pelo que entendera, meu pai era um Lorde do Parlamento e duque de Bronshire — e àquela altura, nem sequer lembrava que o condado em que crescera já havia sido um ducado. Era verdade que, como renomado advogado, papai tratava com muitos políticos no século XXI, mas jamais o imaginara numa posição tão diretamente envolvida no meio.

Em segundo lugar, eu finalmente entendi do que se tratava a votação. Estiquei minha memória em busca da história do meu país e lembrei que, assim como muitas outras coisas, votar não era permitido às mulheres na Velândia de 1898. Pelo menos não ainda. Em algum tempo, se o curso da história se mantivesse, eu sabia que a medida seria aprovada.

Trago Seu Amor de VoltaWhere stories live. Discover now