Capítulo 23

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Vesti uma calça jeans e uma blusa de manga cumprida por conta do frio, o céu desabava do lado de fora.
Saímos do quarto, agora eu caminhava ao lado da Marília, era estranho imaginar que depois desses meses eu já agia como se a casa fosse minha, como se aquilo fosse normal, aquele teatro para tapear o pai do Sebastian.
Fomos para a cozinha, mas pela janela notei ter um carro diferente do lado de fora. Quem seria aquele horário da manhã?
Ainda mais curiosa caminhei em passos largos até a sala de jantar, parei quando vi os cabelos loiros e os lábios finos, a tia do Sebastian me olhou com um sorriso de orelha a orelha, como se fôssemos grandes amigas se reencontrando após anos longe.

— Querida! — Falou ela. Viviane correu na minha direção com os braços abertos, ela me puxou para um abraço enquanto eu olhava para Sebastian pelo ombro dela. Ele estava sentado na ponta da mesa observando a cena. Dei dois tapinhas na costa dela. — Realmente sinto muito por ontem. Eu não estava num bom dia e acabei descontando em você.

Balanço a cabeça.

— Imagino. Eu entendo que queira proteger seu sobrinho.

Ela me lançou um sorriso brilhante, eu só podia retribuir com o mais falso que tinha.

— Fiquei com tanta vergonha. — Levou a mão até a testa. — Peço mil desculpas.

Fiz gesto para ela parar.

— Está tudo bem. São águas passadas.

— Ótimo! Agora vem a novidade, em um pedido oficial de desculpas eu queria te convidar para passar a virada de ano conosco na nossa casa em Costinesti. — Franzo o cenho. — Entendo caso não queira ir, mas eu ficaria muito grata se fosse.

Olho para Sebastian, ele fez o mesmo que ontem. Deixou a decisão por minha conta.
Levei a mão até a testa pensando, enquanto parecia falso, no fundo, parecia verdadeiro, não perderia o espetáculo de pedido de desculpas.
Assenti sutilmente.

— Claro.

Viviane me puxou mais uma vez para um abraço, tentei retribuir, mas eu não consigo esquecer algo com tanta facilidade igual a ela, ou pelo menos como ela finge esquecer.

— Querido, esperamos por vocês. Por favor, não esqueçam.

Antes de sair ela dá um beijo na cabeça de Sebastian e pega sua bolsa que estava em uma das cadeiras, acenou-me e sumiu.
Cruzei os braços mirando os olhos em Sebastian.

— Tenho quase certeza que não foi um pedido de desculpas espontâneo. — Lanço um olhar apertado para ele. — Duvido muito que a sua tinha tenha tomado essa iniciativa sozinha, ainda mais em um dia frio como esse.

Ele dá de ombros colocando o jornal de lado pegando um cigarro de dentro do bolso do seu terno azul-marinho.

— Eu apenas conversei.

— Conversou? — Puxo uma cadeira próxima a dele.

— Disse a ela o que deveria ter dito ontem.

Esperei que ele me dissesse, com a cabeça apoiada na mão. Sebastian segurou o cigarro na ponta dos dedos e o acendeu, o cheiro de menta com café se espalhou pelo ambiente, ele tragou uma vez então soltou olhando para mim.

— Que sou apaixonado por você como nunca fui por ninguém, e que é a mulher da minha vida. Para finalizar, disse que se falasse mais algo a seu respeito nunca mais me veria. — Tragou mais uma vez. — Foi o que eu disse.

Meus lábios abriram involuntariamente. Uma declaração assim vinda de Sebastian, por mais falsa que fosse, atingiria qualquer mulher. Peguei-me pensando em quantas ele já iludiu com esse papo furado, quantas já teve em sua cama por conta do cheiro do seu perfume ser tão inebriante ou o fato de sua voz ser grave ao ponto de me deixar abalada. A loira do hotel possivelmente fora fisgada assim.

— Ah — exclamo —, você realmente é um excelente mentiroso.

— Obrigado. — Respondeu por fim.

Eu deveria mesmo agradecer por algo que era seu dever ter feito? Não, não deveria. Era melhor manter o ego do Sebastian onde estava, encher sua bola só o deixaria ainda mais irritante.

— O que você falou ontem é verdade?

— Não faço promessas se não vou cumprir.

Suspiro. Que escolhas eu tinha afinal.

— Certo.

Ele estufa o peito e mira os olhos em mim.

— Mas tem duas coisas que eu preciso ressaltar se quiser fazer isso dar certo. — Levanto as sobrancelhas esperando. — Primeiro, não tente fugir a qualquer oportunidade que aparecer. Caso faça, nunca mais verá a luz do dia.

Reviro os olhos fazendo um sinal para ele continuar.

— Segundo, não se apaixone por mim em hipótese alguma.

Jogo a cabeça para trás e gargalho.

— Não me faça rir. Não me apaixonaria por você nem se fosse o último homem na terra. — Sebastian continuou sem expressão, esperando que eu o levasse a sério. Finalizo — eu prometo.

— Então temos um acordo.

Após alguns minutos ele saiu da sala, me deixando a sós.
Servi meu café e peguei um pedaço de bolo, mas a comida não parecia tão interessante.
Voltei para o quarto, me joguei na cama fitando o teto, as palavras dele estavam na minha cabeça. "A mulher da minha vida". Penso que ele nunca dissera isso antes a respeito de outra, nem da tal Anna.
Olho para a aliança em meu dedo.

Ethan me disse isso, com certeza não foi da boca para fora. Se ele estivesse vivo eu teria um motivo a mais para lutar e sair daqui, mas não está.
Ethan morreu levando consigo todos os meus sentimentos.
Aceitar Sebastian seria a única maneira de eu sair sã daqui.

°  °  °

Na manhã do dia 29, Marília me ajudou a preparar as malas como de costume. Ela colocou algumas roupas que me serviriam no fim de semana em Costinesti, eu mal sabia para onde estava indo. Colocou alguns biquínis dessa vez, óculos de sol e protetor solar. Parecia que a virada de ano na praia seria interessante.
Quando ela finalmente fechou a mala soltou um suspiro de cansaço.

— Estou ficando velha demais para essas coisas. — Resmungou ela.

Sento na borda da cama, ela hesitou em me acompanhar, mas já estava cansada.

— Pretende sair daqui algum dia?

Marília se calou por alguns instantes.

— Não lembro da minha vida fora daqui. Sempre cuidei dos Stan. Acredito que não me daria bem no mundo afora.

— Absolutamente nada? — Insisto. — Trabalha aqui desde quando?

Ela parece lembrar do passado com doçura, sorriu como nunca a vi sorrir antes.

— Trabalho aqui desde os anos oitenta, quando Adam Stan se casou com a Joe. A princípio seria apenas para ajudar com os afazeres, mas depois que Sebastian nasceu passei a ser sua governanta. — Ela olha para suas mãos. — Eles eram muito felizes, davam festas e essa casa não parecia abandonada. Joe me tratava como se eu fosse uma irmã.

A perda de Joe deve ter sido dolorosa a todos, Sebastian foi criado por uma mãe tão boa — ao que todos dizem —, mas é um homem tão estúpido.

— Após a sua morte senti como se um buraco tivesse afundando no meu peito. — Ela leva a mão até o local. Vi os olhos de Marília cintilando. — Sebastian e Nicolae sofreram muito com a morte da mãe, então eu cuidei deles até crescerem. Agora são homens. Mesmo assim, acho que meu trabalho foi em vão.

— Ela deveria ser uma mulher excepcional.

— Era sim.

Aperto os lábios.
Marília dá dois tapinhas nas pernas e levanta.

— Vamos terminar de arrumar suas coisas.

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