3. Des(encontros) de almas

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Já não o via há mais de uma década quando nos despedimos no aeroporto de lágrimas nos olhos. Quando disse que iria voltar à Costa Rica para ajudar os doentes e desalojados do meu país, assentiu sem relutância. Como se já estivesse à espera que o fosse fazer.

Tentamos que o nosso casamento resultasse persistentemente, mas a distância física e emocional deteriorou-nos. Soube que tinha chegado ao fim quando, entre nós, só restou silêncio; as chamadas e as mensagens que no início eram uma constante, tornaram-se cada vez mais espaçadas e em menor número, até ao dia em que deixaram, pura e simplesmente, de existir.

Mesmo sabendo que iria regressar à cidade apenas por uma noite, enviei-lhe um convite para o nosso evento beneficente. Foi a desculpa perfeita para anunciar a minha chegada e para deixar claro que o queria voltar a ver.

Não tive qualquer resposta até ao dia, quando apareceu de surpresa. Quis prolongar a minha dúvida até ao último minuto. Continua com um corpo de fazer inveja a qualquer miúdo de trinta anos e os cabelos grisalhos que despontam aqui e ali tornam-no ainda mais charmoso. O sentido de humor continua igual e a capacidade de dizer a coisa certa no momento certo, inabalável. Não houve silêncios constrangedores, mas reconheço que os copos de vinho tinto que circularam ajudaram a deixar o passado onde deve estar. Lá atrás.

Sem surpresa, terminamos a noite no meu quarto de hotel. Foi melhor do que há dez anos. Mais intenso e mais apaixonado. Como se quiséssemos de forma sôfrega matar as saudades, num encaixe de almas perfeito.

Acordei com o despertador do telemóvel. Nua, sozinha e sem rasto do Mateus. Nenhum bilhete, nenhuma mensagem. Dez anos depois, foi ele quem me deixou a mim.

Coisas que guardei em mimOnde histórias criam vida. Descubra agora