4. Uma visita inesperada

2 0 0
                                    

André levantou-se do sofá e, ainda ensonado, caminhou em direção à porta. Espreitou pelo óculo, mas não reconheceu o homem na soleira da porta. Vestia roupas rasgadas, exibia barba e cabelos sujos e o olhar escondia-se por detrás de uns óculos graduados com apenas uma haste. Empunhava na mão esquerda uma garrafa de uísque quase vazia e tinha dificuldades em se manter de pé.
André tinha enterrado a mãe há poucas horas e as sucessivas noites mal dormidas deixaram-no de mau humor. Estava cansado e a última coisa que precisava era de aturar um bêbado qualquer. Continuou a espiá-lo na esperança que desistisse. Para mal dos seus pecados, o homem resolveu alternar entre tocar à campainha e socar a porta da entrada. A certa altura André perguntou:
— Quem é?
Esperou pela resposta, mas o silêncio tornou-se de tal forma palpável que continuou:
— Oiça, eu tive um dia de merda hoje. – disse em tom complacente. — Por favor, vá-se embora ou serei obrigado a chamar a polícia – ameaçou.
— André abre a porta. Eu imploro-te. – disse em voz arrastada o visitante.
André foi apanhado de surpresa. O facto de saber o seu nome deixou-o intrigado. Acendeu a luz do corredor, rodou as chaves e abriu a porta. Fitaram-se por alguns instantes sem trocar uma única palavra.
— De onde é que me conhece? – questionou, por fim.
— Eu .... – iniciou o estranho aproximando-se cautelosamente.
Sem que pudesse terminar a frase o homem desfaleceu, deixando cair ruidosamente a garrafa de uísque. Enquanto lhe sacudia os ombros, André concluiu que o rosto do homem lhe era, estranhamente, familiar. Ainda assim, estava longe de imaginar de onde e porquê. Só quando os olhos do estranho se abriram é que tudo fez sentido. Uma onda de horror cobriu-lhe o rosto e André bradou:
— Pai?!

Coisas que guardei em mimDonde viven las historias. Descúbrelo ahora