Duas Noites Antes

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Agnes andou pelos corredores. Era madrugada, ela não conseguia dormir naquele quarto vazio. Depois de tantas noites dormindo com piratas, dormir sozinha a enviava de volta para as celas, para as casas queimando e para a voz do Albatroz.

Ela queria ter Ayumi de volta. Para forçá-la dormir ou a esquecer tudo. Para transformar a sua realidade terrível em uma bela ilusão mesmo que por um momento. Ela esperava que Ayumi não estivesse morta debaixo de toneladas de madeira no fundo do mar.

Quando ela os livrou da forca, não era aquilo que esperava.

Agnes desceu as escadarias da mansão, indo até as grandes janelas que se abriam para o jardim. Ela não sabia o que esperava, mas não era os olhos de filha e pai se encontrando num único plano maquiavélico. Ela não esperava um jantar de hienas e o armar de um golpe.

Ela não queria matar o futuro marido. O noivo. O Governador. Ela não queria matar ninguém.

Mas ela já havia matado antes.

Ela saiu até o jardim, onde papoulas e damas-da-noite faziam seu reinado de perfume. Algum pássaro piava na escuridão, ela não conseguia ver nenhuma luz na mansão.

Agnes realmente não sabia qual era o grande rancor entre aqueles três. Asmus, Shivani e Axel tinham algum tipo de história, além do parentesco. Ela não entendeu boa parte das picadas sutis e alfinetadas cruéis da noite. A dança de palavras não teve o mesmo efeito sobre ela.

Mas o plano para matar Reinier teve. Ela não acreditava na teoria de deidificação deles. Não, Reinier era apenas um homem poderoso demais, que a devoraria enquanto ela o destruia como Axel mandava. Como duas cobras famintas. A verdade era que por muito tempo ela o imaginou como seu ponto seguro, algo que estava apenas na sua cabeça, claro, mas ela tinha alguma esperança de que depois de alguns anos não seria mais tão ruim e assustador.

Mas isso já não era possível porque ela mesma era ruim e assustadora.

Ela se sentia vazia. Sentiu seus joelhos cederem, as lágrimas se derramando de seus olhos. Sentiu um nojo profundo de si mesma e de tudo que a cercava. Ela não se importava de Shivani procurava um deus, se Axel queria virar um rei ou se barbatanas começariam a sair de suas costas.

Axel Adonis não de importava com nenhum dos "filhos" de forma alguma. Agnes passou um ano naquela mansão trancada no quarto como um porquinho da índia. Como uma boneca. Até que ele resolveu brincar com ela.

E ali ela foi parar, no meio de piratas e monstros até se tornar um deles.

Começou a arrancar as flores brancas do jardim furiosamente. Ela se odiava, odiava tudo aquilo, aquele lugar. Odiava Axel, Dante, Shivani por não se impor contra eles. Odiava o Governador. Odiava o Capitão e Ayumi e Lobo, por não estarem salvando-a. Odiava a si mesma mais do que a todos.

Ela não havia mudado desde que voltará a sua própria pele. Continuava querendo morrer.

A mão dela parou no lugar antes de acabar com mais uma flor. O pulso segurado por uma mão firme.

- O que pensa que está fazendo com minhas papoulas? - Dante a encarou severo.

Ela se afastou, caindo na grama e deixando o cabelo sujo de terra. Ela não ouviu ele chegando. Olhou para as pétalas no chão e para as mãos. Ela se sentou, olhando para ele.

- Não entendo porque você se assusta tanto comigo. Nós temos o mesmo sobrenome.

- Isso não significa nada nesta casa.

Dante bufou e não retrucou. Ele sabia que ela estava certa, principalmente depois de ver e conhecer Shivani. Os dois ouviram sobre ela naquela casa. Quando Agnes descobriu quem ela era, ficou surpresa, mas ela conseguia ver as semelhanças.

Preto Cinza e Tempestade - FortunataWhere stories live. Discover now