Capítulo 30

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[N/A]: *esse capítulo contém possíveis gatilhos*

{Primrose}

Quando os olhos castanhos de Ísis encontraram os meus, e meus ouvidos escutaram as palavras que saiam de seus lábios, foi como se tudo tivesse congelado. Foi como se eu não estivesse escutando o que realmente escutava. Foi como se algo dentro de mim tivesse sido amassado ou destruído. Parecia ser mais uma onda enorme no mar turbulento em que eu me encontrava. Um mar que jamais pararia, que jamais se acalmaria.

Ísis fazia parte da Corte Noturna, era a espiã da Corte Noturna. Ísis não era minha amiga. Aquela fêmea que eu conheci era apenas uma espiã, não minha amiga. Não a pessoa que me abraçou quando eu estava triste, que me fez um pouco de companhia enquanto eu me sentia tão sozinha que qualquer mão estendida parecia como um novo dia nascendo. Não era aquela que compartilhou um segredo comigo, que compartilhou confiança, uma ligação. Aquela pessoa não existia, era uma farsa, uma mentira. Aquilo nunca existiu de verdade.

Tudo o que eu havia engolido nos últimos dias para não explodir antes, parecia surgir agora, parecia querer explodir agora. Senti minha garganta doer, como se eu precisasse gritar, ou apenas cair no chão e me encolher ali, esperando que aquela casa me fizesse sumir. Meus olhos encheram de lágrimas que não aguentavam mais ser derramadas.

Aquilo tinha me feito sentir enjoada, até mesmo enojada. Mentiras. Eu estava tão cansada de mentiras. Eu cresci acompanhada de mentiras que haviam me cegado, me fazendo nunca conseguir distinguir a verdade por mais que ela estivesse à minha frente.

Minhas mãos quase chacoalhavam, e eu não conseguia fazê-las parar, assim como meu corpo inteiro e meus passos apressados. De forma quase desesperada, abri a primeira porta em que consegui me apoiar na maçaneta, entrando rapidamente no cômodo. Minha visão ficou levemente turva, mas notei que era um banheiro. Por conta da visão perturbada, mal tive tempo de prestar atenção em qualquer coisa que tivesse ali, já que cambaleei e me apoiei com força na pia.

Minha cabeça começou a latejar, ela doía. Minhas mãos seguraram firmemente o mármore que encontraram, como se fossem arrancá-lo em seguida. Senti minhas lágrimas caindo por meu rosto, e ouvi soluços que rapidamente se tornavam altos, saírem de mim, como se não aguentassem mais serem segurados. Aquilo parecia ter sido a última pedrinha que minha garganta aguentou, a última onda em que eu consegui me manter de pé. Minhas sobrancelhas estavam franzidas com força e repulsa. Além de tudo, me sentia traída, me sentia zangada e com raiva.

Senti um gosto metálico em minha boca, algo afiado a ferindo. Abri levemente meus lábios e minha mão trêmula subiu até eles. Quando encarei novamente minhas mãos perto de meu rosto, meus dedos estavam sujos de um líquido vermelho, num tom escuro. Sangue. Minhas mãos voltaram para minha boca. Meu coração batia rapidamente. Encostei em algo pontudo e afiado, me fazendo resmungar com um pouco de dor.

Quando meus olhos se ergueram para encarar o espelho em minha frente, soltei um grito assustado, cambaleando para trás, temendo o que eu via. Presas enormes. Foi isso que eu vi quando me encarei no espelho. Uma besta, uma fera selvagem que queria sair, algo horrível e assustador. A porta atrás de mim se fechou com força quando se encontrou com minhas costas.

Meu corpo tremia agressivamente, e senti minhas garras escaparem dos dedos, ficando mais afiadas, se tornando maiores a cada momento que eu as olhava. O espelho a minha frente tremia, mas não era minha visão embaçada, não. Ele realmente tremia, estava prestes a se partir. Era eu quem estava fazendo aquilo. Era eu quem iria parti-lo em milhares de pedaços.

Ouvi batidas na porta. Eram batidas leves, calmas, que não pareciam nada com a agitação que existia dentro do cômodo onde eu havia me fechado. Minha voz não saiu para responder aquele barulho, era como se tivesse ficado presa em minha garganta.

Corte de Labirintos de Rosas e Estrelas Where stories live. Discover now