Capítulo 2 - O desejo de um espião

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Um espião perde quando perde a calma

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Um espião perde quando perde a calma.

Esta é a lição mais valiosa para que um espião não comprometa sua missão, nem perca sua vida, pois, de um modo ou de outro, o fracasso em uma destas coisas acarreta o fracasso da outra quase todas as vezes.

E agora Twilight, um espião do ocidente estava sentado no balcão de seu bar preferido, tomando um uísque no território que ele sempre acreditou ser o lar de seus inimigos – pelo menos até se tornar um espião da WISE.

Haviam raros momentos em que parava para pensar em sua vida, e esses era um daqueles.

Ele não gostava de relembrar o passado. Não gostava de lembrar que fora um menino órfão, cuja a guerra ceifou a vida de seu pai, com quem tinha problemas, levou sua mãe, a pessoa que mais amava, e levou seus amigos mais tarde na vida. Não gostava de pensar que era um garoto inteligente e mentiroso, que usara isso para sobreviver durante a infância ao invés de vivê-la brincando com seus amigos na rua ou nos braços da sua mãe, que o protegia do pai, que apesar de ter uma linha de pensamento válida, era violento.

Também não lhe agradava pensar na adolescência tão tampouco. Ele roubara a certidão de nascimento de outro rapaz que morrera durante um bombardeio para se alistar no exército de Westalis, combater os malditos demônios ostanianos que queriam a guerra e eliminar os desgraçados que achavam graça em destruir famílias inteiras e matar.

O cavalheiro louro pegou o copo baixo e largo com a bebida âmbar e bebeu um bom gole, sentindo o álcool queimar na boca, deixando que – na medida do possível –, a bebida varresse para longe os pensamentos, principalmente aqueles que ele mais se esforçava para enterrar no fundo de sua mente.

Ele odiava o pensamento de que seu pai tinha razão. Desejar a guerra para qualquer outro ser humano era abominável. Sentia vergonha por ter desejado isso na infância – em grande parte por ser bom em estratagemas, em partes, porque era a brincadeira preferida dos amigos. Eles o chamavam de Conselheiro... Ele quase riu com amargor ao pensar naquilo.

Ele pegou o copo, e suspirou cansado, bebendo mais um gole, sentindo o líquido descer queimando a garganta e deixando um calor na boca. Hoje, já adulto, ele vivia em função de evitar a guerra, mesmo que isso custasse sua vida. Ele pagou a bebida e rumou para casa.

Enquanto andava, pensou que ainda não sabia o que era. É claro que ele era um espião com uma missão e um objetivo de vida. Um mundo onde crianças não chorem. Mas isso era tudo?

Na metade do caminho, ele avistou o parque perto de sua nova casa, onde ele ouviu a risada alta de Anya. Ele virou o rosto para o lado, e viu a menina brincando com Yor e Bond. Ele se escondeu atrás de uma árvore, para observá-las por um instante. Anya estava correndo e caiu no chão, começando a chorar. Yor correu a seu encontro e a pegou no colo, onde ela pôde ver um par joelhos ralados. Para acalmá-la, ela a trouxe para mais perto do peito, onde fazia sons sem sentido para confortá-la e soprava os machucados. Anya deixou de chorar e passou a soluçar cada vez menos, enquanto escondia o rosto em Yor, que continuou soprando e deu um beijinho perto de cada joelho.

Twilight imaginava a sensação. O conforto de um abraço quentinho, nos braços que você sabia que sempre iriam lhe proteger. A convicção na voz que dizia "calma, está tudo bem", era tão grande que você começava a acreditar em poucos minutos. E para que você não sentisse mais a dor, sempre havia a demonstração de amor e cuidado com você, um beijinho ou um carinho, e nada mais no mundo era necessário. Só estar naqueles braços mais um pouquinho e sentir amor.

Por um instante, ele se imaginou ali com elas. Talvez ele tivesse ido ao encontro das duas assim que percebesse algo errado. Talvez também abraçasse Anya pelo outro lado, e segurasse a cintura de Yor. Ele poderia dizer que faria algo gostoso para o jantar, já que comidas gostosas faziam bem para feridos e encontraria um jeito de enfiar cenouras na comida sem que Anya percebesse. Yor a passaria para seus braços enquanto se encarregava de Bond e da cesta de piquenique e eles voltariam para casa, enquanto Anya continuaria reclamando que estava doendo mais do que realmente estava somente para conseguir alguns doces também.

Era isso então? Esse era o homem que ele queria ser? Um pai e um marido, alguém que estaria em casa no fim do dia, a pessoa que Anya e Yor procurariam quando tivessem problemas ou quando simplesmente estivessem felizes? Ele queria poder abraçá-las, confortá-las e protege-las em seus braços e se sentir da mesma forma nos braços delas?

Elas estavam se tornando importantes na sua vida?

Ele tinha muitas perguntas sem resposta, e a que mais lhe perturbava era se ele deveria se render a esse desejo.

Ele meneou a cabeça, e afastou aquele pensamento deixando escapar um suspiro enquanto olhava para as nuvens que começavam a ficar coloridas no céu da tarde.

Não, ele não deveria.

Um espião perdia quando perdia a calma.

E no caso de Twilight, ele provavelmente não perderia somente sua vida, mas colocaria em risco a de muitos outros. Inclusive a de Anya e Yor.

No entanto, se havia algum ser superior ou sorte que pudesse ouvir seus desejos, ele desejava uma boa vida para as duas, independente do que acontecesse depois da Operação Strix. Desejava um mundo onde Anya pudesse crescer feliz e segura, diferente das dificuldades que ele e Yor enfrentaram.

Desejava um mundo onde crianças como eles não chorassem.

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