Capítulo 56

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Elain não sabia como conseguiria encarar o dia. Estava realmente cogitando a possibilidade de ficar no quarto o dia inteiro. De fato, o Sol já se encontrava alto no céu, o que indicava a ela que já deveria ser quase hora do almoço - se é que já não havia passado.

Ficara escondida no cômodo o restante do dia anterior, sentido-se arrasada e chafurdando em auto-piedade. Não era típico dela, mas simplesmente não conseguiu evitar. Não deveria deixar que as intenções de Lucien - ou a falta delas - a afetassem tanto. Não deveria deixar que ele fosse uma parte tão significante dos seus dias. Deveria mesmo era arrumar suas coisas, deixar de ser tão patética e voltar para a Corte Noturna. Ao menos lá ela tinha alguma utilidade; ao menos lá ela era tratada como uma igual, ninguém escondia as coisas dela.

Não, pensou tristemente, nunca fora tratada como igual. Nunca estivera a par de todos os assuntos da Corte. Sempre fora tratada como algo tão frágil que mal podia ser tocado. O beijo que quase trocara com Azriel era a prova disso. Az parecia temer tocá-la, como se Elain pudesse quebrar a qualquer momento. Tão oposto de Lucien, que a tocava sempre que havia oportunidade, não importava onde ou como fosse - às vezes era um leve toque na bochecha ou apenas um roçar de mãos, ou, se fosse mais longe na memória, a forma como o ruivo a possuíra naquela noite na cabana do bosque. Apesar de não ter muita experiência no assunto, Elain sabia que Lucien se conteve naquela noite e, que os Deuses a perdoassem, mas ela gostaria muito que ele parasse de se conter.

Elain piscou para o teto do dossel entalhado de sua cama. Seus pensamentos estavam uma confusão, ela nem mesmo conseguia terminar um raciocínio. Não lembrava muito bem a que horas havia pego no sono na noite anterior, provavelmente logo após o pôr do Sol, quando sua mente exausta começou a imaginar o cheiro de Lucien tão próximo que era quase como se ele estivesse ali, do outro lado da porta. Assim que sentiu aquele cheiro, a fêmea ficara tensa imediatamente, mal ousando respirar, mas não havia um único som sequer no corredor, o que a disse que era apenas sua imaginação a pregando peças novamente. Mas, céus, aquele cheiro permanecia e permanecia e permanecia, e a embalou em um sono tão tranquilo que Elain só fora acordar poucos minutos atrás, quando o Sol de Primavera já reivindicava seu espaço através das finas cortinas de seda de seu quarto.

Sua perna esquerda estava dolorida, o braço direito formigava, e ela sabia que deveria sair da cama e se movimentar um pouco, apesar do desejo insano de se esconder para sempre. Então, apesar de si mesma, Elain se forçou a levantar da cama, deixando os lençóis deslizarem por seu corpo. Ainda nua, caminhou tropegamente até o banheiro do quarto, onde cuidou de suas necessidades e banhou-se rapidamente para espantar a cara inchada de sono. Após secar-se brevemente, caminhou novamente até o guarda-roupas, onde ela sabia que um novo vestido a aguardava. Sabia, pois desde que chegaram à Mansão Primaveril era assim, um vestido novo a aguardava no armário todos os dias. Alis dissera que ela deveria apenas ser grata e aceitar os presentes que lhe eram dados - exatamente a mesma coisa que sua mãe haveria dito nessa situação; Então Elain calou-se e simplesmente vestia o que aparecia no dia. Ela considerava uma pequena aventura diária - nem sempre bem-sucedida, como o horrendo vestido que usara no dia anterior. Hoje, por outro lado, o que se apresentava à ela era um vestido de poá na cor da terra, com pequenas bolinhas escuras por toda sua extensão; não possuía mangas nos braços, embora o tecido cobrisse toda a pele de seus ombros e o decote em V descia até o meio de seus seios. O tecido se ajustava por todo o seu tronco, mas alargava na cintura, caindo em uma suave cascata por suas pernas. Elain se assustou ao constatar que o vestido era mais comprido atrás do que na frente, e deixava boa parte de suas pernas à mostra. Sentia-se terrivelmente exposta daquela forma, mas não faria desfeita a quem quer que estivesse fazendo os vestidos para ela. Pegou um par de sapatos com saltos pequenos e os calçou. Estranhamente, aquilo a fez sentir-se mais confiante. Caminhando até o espelho da penteadeira, a fêmea fez o melhor que pôde com os cabelos encaracolados, deixando os fios semi-presos em uma trança embutida no topo da cabeça, apenas para afastar os fios do rosto ao mesmo tempo em que escondia as terríveis orelhas pontudas. Resolveu usar um pouco da pasta para cílios que fora deixada sobre a penteadeira e deu pequenos tapinhas nas maçãs do rosto para dar um efeito mais vívido à sua pele quase sempre tão pálida.

Corte de Flores FlamejantesWhere stories live. Discover now