Capítulo 4: Corra Para O Inimigo.

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Entro na casa que Silas comprou a anos atrás para esse tipo de coisas, o tipo que, é tão podre que a corregedoria não pode sonhar que acontece. A casa me lembra aquelas casas de filmes de ação, ela tem a sua estrutura de madeira envernizada, com uma linda varanda, lembro de vir uma ou duas vezes aqui com os meus pais, eu corria pela varanda enquanto eles conversavam, na época eu não tinha noção de como esse lugar cheira a merda, mas algumas pessoas vivem dessa merda, eu vivo disso, parte disso sempre estará comigo.

— Você voltou? - Caique pergunta, andando até a porta do galpão.

—Eu nunca tive a opção de sair! - Exclamei.

—Sabe que não precisa ser assim, ele te deixaria sair se você quisesse. - Deu de ombros.

—Estou quase. O que preparou para mim? - Perguntei, olhando em volta, procurando por algum motor interessante.

—Reforcei o capacete e mexi no motor, espere alguns minutos e vai poder testar ela! - Ele bate no banco da moto com a lataria verde.

—De onde veio essa? - Perguntei.

Os carros e motos que vem parar aqui, ou, são apreendidos e os donos estão tão ferrados ao ponto de não recorrem, ou, estão a sete palmos do chão, tão sujos quanto quem os compra, mas, para toda merda que é feita nesse mundo existe um inocente esperando para fazer o trabalho, Caique é essa pessoa, talvez sejamos uma variante um do outro, a mesma história com cenários diferentes.

Conheci Caique quando quase morri pela primeira vez, bati meu fusca durante uma corrida e foi ele quem me tirou de dentro do carro que pagava fogo após bater contra um murro, passei a dever a minha vida a ele e quando ele me ligou falando que estava sendo preso, livrei ele disso, Silas queria um motivo para liberar ele e eu contei, ele teria um gênio nas mãos, talvez eu tenha culpa nisso também.

Caique tem dois irmãos para cuidar, ele não está errado, não como a maioria que está metido nisso.

—Quer testar? - Girou a chave da moto entre os dedos.

—Gato quer leite? - Perguntei.

—Segura! - Exclamou.

— Não preciso. - Impedi ele de me entregar o capacete.

—Sim, precisa. Sabe que não pode ir sem! - Caique fez uma careta, olhando para as câmeras do galpão.

_Droga. - Revirei os olhos.

Coloquei o capacete e girei a chave, tão reconfortante quanto o ar que bate contra o meu corpo agora, apenas o barulho do motor da moto. Dizem que as pessoas precisam de uma válvula de escape, a adrenalina se torna meu combustível para sentir o coração na garganta agora, batendo rápido, implorando para que o meu corpo não bata contra algo.

Esse lugar foi projetado exatamente para isso, a casa fica afastada de tudo, em um enorme terreno, apenas com ela e com o galpão onde Caíque trabalha, enquanto acelero mais ainda, para testar o motor da moto, vejo Caíque negar com a cabeça, ao ver Silas chegando.

Eu reconheceria esse carro a muitos quilômetros de distância, sei cada passo que ele vai dar agora, seus olhos param em mim, ele retira os óculos escuros e sorri ao ver que eu acelero ainda mais, passando de um lado para o outro na pista, chegando logo em frente ao galpão.

Silas ainda está vestindo o uniforme da polícia, seus cabelos estão mais grisalhos do que eu me lembrava, a roupa um pouco mais justa agora que ele assumiu como delegado chefe, o cheiro do cigarro misturado com perfume imunda meu olfato, tento não pensar em como isso me incomoda.

—Achei que já tivesse esquecido o caminho de casa. – Silas fala, me olhando de cima a baixo.

—Você não me deixa esquecer! – Exclamo, retribuindo o olhar.

—Seu irmão vai ficar triste, não fale assim. – Ele toca o ombro de Caíque.

—Me chamou para uma reunião de família? Quem mais eu devo convidar? – Perguntei.

—Parem, odeio trabalhar com vocês por isso, sabiam? Agem como se a carne um do outro fosse um prato saboroso, mas sabem que não conseguem viver nada além disso! – Caíque ficou irritado.

—Desculpa. – Suspirei.

Silas ri.

—Sua corrida começa as duas da manhã, vê se arruma uma roupa decente. – Ele revira os olhos.

—Caíque vai me acompanhar? – Ignoro ele, olhando para Caíque.

—Óbvio, você vai na toca dos lobos, não pode ir sozinha. – Exclamou, analisando a moto.

—Que? – Pergunto.

—Nada. Põe ela na rampa que eu quero olhar de novo! – Caíque está claramente mentindo.

—Mente feito uma criança. – Revirei os olhos.

—É difícil não mentir quando se vive com você, não é? – Caíque pergunta, me fazendo rir.

Dei de ombros, não preciso de mais uma confusão no começo do dia, não agora ao menos.

—O que tem na sua geladeira? – Perguntei, olhando para a casa.

—Fabiana fez seu doce favorito. – Silas falou.

Fabiana é a parte mais inocente dessa história. Ela compra a ideia de que uma pessoa boa pode mudar uma pessoa ruim todos os dias da sua vida, talvez seja apenas por causa dela que Silas ainda não se tornou alguém pior, ela é a luz da vida dele, todo mundo percebe isso.

Quando Silas me "adotou" ele era um desses policiais solteiros que acha que as mulheres olham mais para a farda do que para qualquer outra coisa e que pensam no salário antes do desejo, por isso, fomos apenas nós dois por longos dois anos, até que ele encontrou com ela, o seu amor de adolescência, lembro de olhar para os dois e pensar, "como ele pode fazer mal as pessoas e ser tão gentil com ela?" acontece que a mulher que acena para mim da varanda, mesmo sendo oito anos mais nova que Silas, consegue despertar o melhor dele, sem dizer uma sequer palavra.

Durante uma das minhas brigas com Silas, disse para ele que a única coisa que me impedia de matá-lo era ela. Eu e ele sabemos que eu não menti.

—Você esquece que tem casa ou faz de propósito para me deixar louca? – Fabiana perguntou, me abraçando, em seguida, ela me afasta ainda segurando os meus ombros e me analisa de cima a baixo.

—O que? – Perguntei.

—Eu fiquei com saudades! - Alisou meus cabelos.

Fabiana nunca tentou substituir minha mãe, nem eu quis que tentasse, mas acabou sendo quase como isso, já que ela me viu nos meus piores e melhores dias e sempre estava comigo quando eu queria deixar a vida terminar.

Todas às vezes.

Notei que ela cortou os cabelos, na altura do ombro, eles são castanhos e foram recentemente pintados, suas ondas são quase perfeitas, Fabiana sorri.

—Ele me contou! – Seu olhar me persegue pela cozinha.

—Minha vida, Fabiana. – Ela nega com a cabeça.

—Vale a pena? – Perguntou, suspirando.

—Ele disse que tinha meu doce favorito e eu não estou vendo nenhuma torta por aqui. – Analiso a geladeira.

—Na prateleira de baixo. – Fabiana está visivelmente contrariada com isso, mas eu mudei de assunto e ela não vai voltar a ele.

—O que vai fazer no fim de semana? – Perguntou.

—Trabalhar. - Dei de ombros.

—Alana... – Olho para ela, levantando as sobrancelhas, ela e eu sabemos onde isso vai dar e não quero brigar.

—Você quer? - Perguntei. Fabiana apenas negou com a cabeça.

Obsessão - Homens Contra a Lei. #FamiliaHerox.Onde histórias criam vida. Descubra agora