Capítulo I

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Não sei o que exatamente aconteceu. É clichê pensar, mas foi algo rápido.
A última coisa no qual consigo me lembra é sobre uma conversa contagiante e alegre com relação ao meu pai.
Eu ria enquanto olhava carinhosamente para alguém no banco de trás, que sinceramente, não consigo recordar.

A sensação foi repentina, inesperado. Como se minha alma estivesse sendo sugada do corpo.
O carro estava girando sobre a pista, as coisas ao meu redor começaram a perder forma e cor, tudo que passava do outro lado da janela não era nada mais que borrão.
Podia escutar ao longe os gritos desesperados da minha mãe, mesmo estando tão perto.
Fecho os olhos com uma força absurda ao mesmo tempo que tampo os ouvidos, na tentativa de que tal ato me salvasse.

Silêncio.
Silêncio ensurdecedor.

Tento abrir os olhos novamente, mas sinto algo brilhante direcionado em meu rosto. Uma luz.
Abro a pálpebra direita.
Noto estar deitado e coberto, via o teto a minha frente e sentia algo almofadado ao meu redor.
Por mais coberto que estivesse, tremia. Medo ou frio?
Abro a outra pálpebra.
O teto está bastante intrigante – verde claro ou azul? Merda, não conseguia diferenciar uma única cor?

O que está acontecendo?
O que aconteceu depois daquilo?

Fungo o nariz, sinto cheiro de frio, típico ar-condicionado.
Não assisto muito Grey's Anatomy mas reconheço um hospital. Não sou fã, se pudesse, não entraria em um nunca.

O que diabos estou fazendo aqui?

Solto o ar que segurava enquanto passo os dedos por entre meu cabelo negro, nervoso.

Olá, garotão.

Ouço uma voz bem interessante, por assim dizer, referente a de um locutor. Me levanto um pouco, apoiando os cotovelos no colchão e encontro o dono da voz ao lado da porta aberta.

Como está se sentindo? — Pergunta vindo em minha direção.

Estranhamente familiar.

Bem, com um pouco de frio, mas bem.

Hm, acho melhor aumentar a temperatura.

Ele vai em direção a uma mesa de canto de vidro azul, onde posso observar o pequeno controle de ar, seringas empilhadas e uma prancheta em branco.

Meu corpo se arrepia.

Desculpa, quem é você?

Ah — Ele ri – Perdoe-me por isso, me chame de Lucas.

O que aconteceu?

Ele põe o controle no lugar ao mesmo tempo que suspira profundamente.

Você sofreu um acidente grave, Leonardo. Estava chovendo bastante e o carro que sua mãe dirigia escorregou na pista. Acabou que vocês bateram na montanha — Ele olha para mim – Felizmente, todos sobreviveram, porém você ficou desacordado por quatorze horas. Lesão cerebral.

quatorze horas

Sua mãe vai ficar feliz em saber que você acordou. Vou chama-la para que possam conversar.

Antes, doutor, posso lhe fazer duas perguntas?

Essa seria a primeira? — Se o objetivo dele era me fazer rir, conseguiu – Claro.

Não me lembro muito bem sobre o acidente, estou bastante confuso. Na verdade, acho que conheço o senhor de algum lugar.

Ele passa a mão na cabeça, no lugar onde deveria ser seu cabelo.

Não esperava menos. Em acidentes como esse o paciente demora alguns minutos ou horas para ter a memória restabelecida por completo, e sobre você achar me conhecer faz parte do processo da mente com relação a organização. Como fui a primeira pessoa que você viu ela criou essa familiaridade.

Entendi — Fungo o nariz – Tinha mais alguém envolvido no acidente?

Hm... sinceramente, acho melhor você ter essa conversa com a sua mãe, te deixaria bem mais confortável. Mas saiba que todos chegaram bem, apesar da situação. Foram você, sua mãe e uma cadelinha.

Assinto com a cabeça me lembrando vagamente de rex, a pet da família.
Fico na verdade surpreso em saber que algo tão pequeno conseguiu sobreviver a um acidente que me deixou desacordado por algumas horas.

E a outra pergunta?

An... Ah, o... o senhor já pensou em ser locutor? — Sinto minhas bochechas corar

Ele ri, um pouco alto, mas uma risada bem gostosinha de se ouvir.

Sim, já tentei. — Ele vai em direção a porta – Vou comunicar a sua mãe.

Me deito novamente.

Verde.
Sim, a cor do teto é verde.
Sorrio.

(In)ConsciênciaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora