CAPÍTULO SETE: VISITA FAMILIAR

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O AR FRESCO preenchia os pulmões de Aurora enquanto seguia em direção à casa de repouso onde morava sua tia – ou melhor, sua "mãe". Sentia-se arrependida por acabar precisando se afastar um pouco da pessoa que cuidou dela desde aquele dia...

O dia em que foi salva de sua família.

Sim, "salva". Ainda que sentisse saudades da família na França, tinha noção de que não seria quem é hoje se não fosse pela intervenção de sua tia Madalene, que lhe tirou daquele meio para terem uma vida nova em Londres. Nunca ousou visitar sua família e nem eles buscaram visita-la ao longo dos muitos anos, tampouco entraram em contato, fosse telefone, fosse por carta, nem mesmo para dar-lhe alguma justificativa.

Quando tinha idade o suficiente para indagar sobre tal assunto, sua tia esquivava das perguntas e lhe respondia de forma dúbia, superficial. Quase sempre com um "porque foi necessário, era melhor para você". E, depois, nem mesmo ela conseguia se importar tanto. Se sua família na França não fazia questão de lhe contatar, porque deveria ela?

Claro, quando ingressou na academia, buscou mais informações sobre suas raízes, a fim de sanar sua curiosidade, mas pouco conseguiu descobrir. E, esse pouco, já não era tão agradável. As únicas coisas que ainda lhe conectavam com seu passado eram suas enevoadas, mas agradáveis, memórias de infância, e a adaga que sua avó – ou, como ela chamava, "mémé" – lhe presenteou no último dia em que se viram.

Deixando de lado aqueles pensamentos, continuou seguindo pela longa via, em direção ao Woldingham Care Center.

Assim que passou pelo túnel de árvores ao final da 21 Quarry Rd, parou em frente à uma cancela vermelha e branca que restringe o caminho em direção ao centro de cuidados. Logo ao lado direito, pôde ver a placa azul com a logo do Woldingham, com os dizeres "SAT. NAV. AVISO – NÃO ATRAVESSE A ESTRADA", em seguida, um pequeno descritivo sobre o código postal. Ao seu lado esquerdo, um pequeno totem vermelho com um interfone estava disponibilizado.

Pegando o interfone, chamou pela recepção do centro.

Centro de Atendimento Woldingham — escutou uma voz calma e feminina do outro lado.

— Jane? — Aurora indagou, com um sorriso no rosto. Jane era uma das cuidadoras do centro e tinha grande apreço pela mesma, tanto pelo carinho que esta tinha com sua tia Madalene, quanto por interesses mais íntimos que nunca foram para frente.

Senhorita Aurora! Mas já? Só um instante, vou autorizar sua entrada.

Poucos segundos após Jane desligar o interfone, pôde ouvir som de mecanismo sendo ativado e, em seguida, a cancela subiu, liberando sua entrada. Aurora pisou no acelerador e avançou pela pequena estrada que levava em direção ao centro.

Era uma longa estrada, mas de vista agradável. Grandes campos verdes e de grama curta se estendiam em ambas as direções, com algumas árvores beirando o caminho pelo qual Aurora seguia. Passou por um pequeno campo de esporte e, seguindo por mais alguns metros, chegou ao complexo que formava todo o centro.

Na entrada, aguardava uma mulher baixinha de cabelos pretos lisos usando um uniforme de tom rosa tão claro que facilmente confundia-se com branco, composto por uma camisa, uma calça de tecido e um sapa-tênis.

— Senhorita Aurora, não achei que fosse lhe ver tão rápido! — exclamou Jane. De sobrancelhas arqueadas, Aurora se aproximou sem entender. Com um sorriso sem graça no rosto, disse:

— Muito engraçada você, Jane... quanto tempo — comentou, aproximando-se e dando um abraço na cuidadora, que pareceu estranhar um pouco a situação — Minha tia, como ela tá?

— Mas... ah... bom, ela tá bem, tá igual a última vez que você a viu.

— É? Bom, me leva até ela. Tenho tanto pra conversar. Ah, e no caminho, você me explica o que aconteceu nessas semanas para cá.

O Culto da Cabra Negra de Mil Crias • Série Tentáculos do Caos, livro IIOnde as histórias ganham vida. Descobre agora