Contos da madrugada

Oceano de lágrimas

Num topo de um pedestal, foi onde te coloquei.

Por que eu te pus lá? Por que eu quis estar lá? Lá não é bom como eu imaginava?

Você nunca fez nada além de posar. E acenar. E dizer que tudo estava bem.

Mas eu sei que não está. Não para mim. Pois você mentiu, e agora chora por isso. E algo dentro de mim fica implorando sem cessar:

"Oh, não chore, por favor. Não chore."

Suas lágrimas brilham, você brilha.
Mas você nunca quis brilhar, não é? Por quê eu não percebi isso antes?

Seu brilho é sem igual mas seu interior não passa de uma casca vazia. E você sempre soube disso, mas nunca me contou. Deixou que eu descobrisse o quê você é, como você se sente. O que eu faço agora? O que você fará agora?

Você é uma fruta que apodrece por dentro, mas continua firme no galho de sua árvore. Ah, veja como você manteve sua natureza escondida por todo esse tempo.

Contudo, sempre fui eu o lobo em pele de cordeiro.

Eu fui bom pra você por fora, mas sempre almejei que estivesse onde estás. No topo do pedestal. Para que eu pudesse te apreciar como minha criação. Tive minhas intenções, eu sei.

É isso que lobos em pele de cordeiro são, traidores. Eu só não esperava te afetar tanto.

Você choras tanto aí. Como pode um ser humano carregar tanta melancolia por não querer decepcionar uma pessoa importante?

O tempo tarda a passar aqui em baixo.

Entretanto, cada lágrima tua que escorreu, paira por aqui e permanece. Logo, terei um oceano de sua tristeza.

E sinto sua angústia. Por favor, criança, se você não quer permanecer aí, desça. Eu sei que você só o fez porque eu pedi.

Agora, sei que você não sou eu. Mas minha voz já não mais te alcança. Por isso, escrevo.

Se não desceres daí, então, afogue-me no teu oceano de angústia. Deixe que suas lágrimas me matem. Pois eu sei que não te mereço mais, por isso, se possível, quando seu oceano alcançar a altura do pedestal, desça daí e vá viver.

Com amor, seu não-intencional carrasco.