O início de tudo.

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Esse é o início dos tempos. O criei em honra a tudo que está por vir. Pois eu, e apenas eu, sei das coisas que virão. E nunca estive tão feliz de morrer por isso.

Tudo tem um início.
Tudo tem um fim.

Você deveria saber disso, pequena estrela.

— Mas isso se aplica a tudo mesmo? O tempo não deveria ser uma constante? Afinal, constantes não deveriam ser infinitas? — Você me perguntou. Sua corporação começava a se desenvolver. Era o primeiro ser humano, ainda sem gênero e sem história. Uma verdadeira folha em branco, e ainda assim manchada pela vontade do saber.

Que lindo, você é uma das mais belas de minhas criações. Não por tua aparência, és por tua curiosidade.

Sinto algo que, em eternidades distantes, os humanos virão a chamar de orgulho. Sim, eu estou muito orgulhoso. É sempre bom fazer perguntas, querida estrela.

— Você acha que as coisas realmente acabam? — Te perguntei, enquanto meu corpo de matéria escura mudava lentamente sua composição. Minhas futuras nebulosas estavam com gosto de cerejas. Gostei disso.

Lágrimas brotaram de seus recém criados olhos. A primeira coisa que um ser humano fez foi chorar.

— Você está morrendo. — Você chorou um pouco menos ao dizer. O primeiro ser humano, feito a partir de uma enorme estrela que já não brilhava mais, segurava suas lágrimas para não me chatear.

Agora, eu estava na palma de uma de suas mãos. Aos poucos, toda a matéria que compunha minha corporação se dissipava para dar vida a outras vidas.

Você escuta um passarinho cantar, e logo, vê algumas de minhas estrelas no novo céu.

— Não chore, minha criança — Eu digo e balanço algumas galáxias que formavam, momentaneamente, algo que parecia ser minhas mãos. — Não há por que chorar. Eu estou aqui. Eu estive aqui. E sempre estarei aqui. Você é parte de mim.

Suas lágrimas gradualmente cessaram, abrindo espaço à um sorriso melancólico. Alguns levam o fim como o símbolo de um renascimento. Tudo tem que acabar para poder começar novamente, é como um jogo, afinal.

Como uma infinita espiral que gira sem descanso. Mas eu não me importo em não descansar, eu até que gosto. Ou talvez até ame.

— Mas e quanto a vida? — você me perguntou. — Se até você acaba, a vida tem um fim?

Eu te olhei em meu último suspiro. Meu corpo, que agora não é mais um corpo, se tornaria um fenômeno que os humanos chamarão de big bang. Eu sou o universo.

Sou o início e o fim de tudo.

— A vida, mesmo quando já se foi, sempre estará aqui. Contanto que alguém se lembre. E eu, jamais esquecerei. Nem de você, nem de ninguém. — Foi isso que te respondi.

E então, eu desapareci de sua mão. A ventania desmanchou completamente o que um dia foi uma corporação do vácuo.

Flores gradualmente se levantaram do mais novo chão que surgiu abaixo de seus pés. A grama é verde e as árvores são altas. Todas as plantas, todos os animais, cada pedacinho de vida surgiu da minha morte.

E lá estava você, minha preciosa não-mais-estrela, você esta vivendo.

No futuro eu voltarei. O universo vai se condensar em mim novamente, contudo, farei questão de começar tudo outra vez. Para assim, ver denovo e denovo suas escolhas e ações.

Eu sempre estarei assistindo vocês, e juro jamais esquecer de qualquer vida que viveu em mim.

Com todo amor e carinho que alguém poderá receber, Seja-lá-como-você-me-chame

Até breve

Contos da madrugada Where stories live. Discover now