Capítulo 9

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Um pouco ofegante, eu seguia quase rente às margens do rio procurando um abrigo. A ferida já dava os primeiros sinais de cicatrização, mas eu não me sentia segura para correr nem para me agachar por muito tempo sem que os pontos se rompessem.

A comida acabou. Eu me alimentava de algumas frutas escassas que encontrava nos galhos e precisei caçar coelhos. Estava farta — e os deuses sabiam — de comer coelho.

Um dia depois de cair.

Eu ainda estava muito próxima da floresta onde vi o lobo morto. O constante formigamento no corpo me dizia que eu ainda não havia chegado a Primas One. Eu me perguntava se realmente queria ir para aquele lugar, ou se não estava apenas enrolando.

Protelando o inevitável.

Grossas nuvens cobriam o céu. Uma noite sem lua. O constante som de centenas de patas ecoava do lado de fora da caverna em que eu havia me abrigado. Eles estavam agitados, caçando muito... alguma coisa estava errada. Ou eu só havia me embrenhado o suficiente dentro do território deles. Todos, desde criança até adultos, sabiam o que nos aguardava logo após a Primas One.

Até muito antes dela, próximo à barreira.

No meio do caminho, encontrei uma fogueira apagada, pegadas e sinais de pessoas — ou feéricos — andando no meio do Bosque. Balancei a cabeça.

Encolhi-me atrás de uma rocha, com uma flecha armada, a capa preta dentro da mochila e a faca na minha perna direita a postos.

A noite passava lentamente. Faltavam poucos minutos para clarear e finalmente amanhecer. O barulho do lado de fora diminuía gradativamente. De repente, um som de rosnado alto, seguido de um grito angustiado.

Abaixei-me assustada.

Era um péssimo lugar. Então me mantive no chão. Antes de escurecer, eu havia me enfiado na primeira caverna que encontrei, pois era um risco ficar no mesmo lugar. Mas a fogueira indicava que eu não havia apagado totalmente o rastro dos sequestradores.

Por isso, fiquei ali, só saía para beber água e comer.

Do topo do penhasco perto do rio, tudo o que eu conseguia ver eram planícies de árvores, que se estendiam até os confins do deserto de gelo. O caminho do outro lado apontava para uma direção que definitivamente não era seguro seguir, de onde eu acabara de sair: o rio glacial em direção ao oceano congelado. Divisa entre a Corte de Fogo e Cinzas e a última rota...

O caminho rumo à barreira era minha última escolha.

Eu tinha um problema com a humanidade, ou era ela que tinha um problema comigo. Uma vez que você consegue sair, não há mais volta. Eu havia saído do inferno e, mesmo com o aviso do lobo, não estava muito querendo retornar.

Fiquei tensa quando a corda que estava na minha mão começou a se mover. Alguma coisa estava se mexendo na armadilha que eu havia colocado lá fora e se aproximando da caverna. De mim. Soltei a corda e me posicionei. Levantei a pequena besta, mirando na entrada.

As nuvens haviam sumido, e a lua enviava alguns fracos filetes de luz que a iluminavam. Uma cabeça começou a aparecer. Abaixei lentamente a mão até a pequena aljava em minha coxa esquerda, onde haviam mais flechas. Uma figura grande e ossuda parou no meio da entrada da caverna bloqueando a saída.

Olhei fixamente para seu interior. Todos os monstros pareciam iguais para mim, mas esse... esse era o mais familiar. Era aquele ominum, que me farejava enquanto eu estava em cima da árvore.

Ele estava me rastreando? Como isso era possível?

Eu havia queimado todos os panos ensanguentados, lavado muito bem todas as ferramentas que usei. Ominuns não tinham esse padrão de comportamento. Mais cedo, eu havia tomado um banho de zumi. E agora rezava para que fizesse efeito, porque seus olhos se moviam de um lado para o outro.

O Festim dos OssosOnde histórias criam vida. Descubra agora