𝙽𝚊𝚘 𝚜𝚎𝚓𝚊 𝚞𝚖 𝚑𝚎𝚛𝚘𝚒

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Sorri sem graça mais aliviado que Luhan e Trix não foi contra, embora uma pontada de preocupação me percorresse. Tenho que admitir que também concordei com a ideia.
Dominic pegou a mochila, com Peter nos braços, e nos seguiu até o carro. Dessa vez, Luhan se sentou na frente ao meu lado, enquanto Trix e nossos novos passageiros ocupavam o banco de trás.
O dia parecia estar a nosso favor. Cruzamos as estradas sem muitos contratempos, passamos pelo túnel André Rebouças que estava surpreendentemente desimpedido, apenas com um ou dois carros abandonados. No entanto, ao sairmos do túnel e virarmos na primeira esquina, a sorte decidiu nos abandonar, deixando-nos de frente para uma horda daquelas criaturas. Pisei no freio bruscamente, com o intuito de evitar que os zumbis nos notassem. Troquei de marcha, mas o carro não respondeu como esperado. Uma tentativa de girar a chave resultou apenas em um ranger oco do motor, o que nos alertou para um problema iminente.
— Merda, não agora! — Exclamei com frustração, tentando dar partida ao carro repetidamente, mas ele permanecia inerte.
— O que está acontecendo? — Trix perguntou com a voz trêmula, claramente em pânico.
— Precisamos correr!
— Pra onde? — Trix questionou, já entrando em desespero enquanto um dos zumbis começava a se aproximar, cambaleando em nossa direção.
— Apenas corram!
Dominic segurou a criança firmemente, saltando para fora do carro, Luhan pegou sua mochila e eu peguei a nossa, e então corremos como se nossas vidas dependessem disso. Adentramos uma rua qualquer, desviando de zumbis no caminho, até que Luhan e Trix viraram abruptamente para uma área em construção. Sem pensar duas vezes, seguimos o mesmo caminho, entrando em um prédio em obras.
Dominic tropeçou e caiu com Peter nos braços, fazendo a criança começar a chorar. Com urgência, ele olhou para trás, para o zumbi que o perseguia. Ele se levantou com dificuldade e a criança ainda chorando. Todos paramos, observando a aflição dele ao chutar o zumbi, e foi nesse momento que um flashback da cena de Tiago veio à minha mente. Contrariando meus próprios instintos, me tornei o herói clichê dos filmes de terror, peguei uma barra de ferro e acertei o zumbi que ameaçava Dominic. Gritei para ele correr e ele o fez, enquanto eu enfrentava o morto-vivo. Depois de derrubar o zumbi, corri ouvindo um estrondo seguido por uma vibração no chão.
Lembra daquele ditado, "Não há nada tão ruim que não possa piorar"?
Em um piscar de olhos, senti o chão ceder sob meus pés. Fechei os olhos instintivamente e, ao abri-los novamente, percebi que tinha caído em um porão ou estacionamento subterrâneo, ao lado das escadas. Tentei enxergar através da poeira que flutuava no ar, enquanto alguém gritava ao longe. Meus ouvidos zumbiam intensamente. Lembrei-me dos zumbis. Um medo avassalador me percorreu. Ainda podia ouvi-los se aproximando. Concentrei-me em enxergar através da densa nuvem de poeira e, à medida que a visibilidade melhorava, percebi a presença de quatro zumbis em minha frente.
No lado positivo, os zumbis estavam parcialmente esmagados pelo concreto. No entanto, o lado negativo era que eu estava parcialmente preso sob os destroços. Tentei me mover, puxar minha perna, mas uma dor excruciante quase me fez gritar e urinar nas calças. Fiquei ciente da gravidade da situação. Completamente em apuros! De repente, ouvi passos atrás de mim e, assustado, virei o rosto para encontrar Luhan.
— Porra, Vini!
— Esperava um "Vini, você está bem!"?
— Vamos te tirar daí, mais deles estão vindo.
Trix segurava a criança no colo, vigiando a rua, enquanto Domy e Luhan se esforçavam para remover o pedaço de entulho que me prendia. Um grito involuntário escapou de minha garganta quando eles finalmente levantaram o bloco de cima do meu pé.
— Caralho! Estou fodido!
— Está quebrado? — Dominic perguntou, quase com uma expressão inocente.
— Espero que não, mas o corte parece bem feio.
— Precisamos ir. Agora! — Trix gritou para nós, seus olhos ainda fixos na rua.
— Precisamos levá-lo a um hospital.
— Má ideia!
— Se não cuidarmos disso, vai infeccionar!
— Vamos encontrar uma farmácia e dar um jeito nisso! — Falei tentando soar confiante.
— Tem certeza?
— Sim! Eu consigo aguentar até encontrarmos uma farmácia.
— Está bem, isso vai doer um pouco! — Domy alertou.
Domy amarrou uma blusa em torno da minha perna para conter o sangramento e me ajudou a subir nas costas de Luhan, que começou a me carregar escada acima e por alguns quilômetros, desviando a cada vez que avistávamos um infectado. Eu tentava ser forte, não queria preocupar ninguém, mas a dor parecia se intensificar a cada minuto.
Percebi que Luhan estava tremendo, gotas de suor escorriam de sua testa e ele começou a diminuir o ritmo. Eu sentia que estava causando muito trabalho para ele. Na verdade, eu estava atrasando todos nós, mas minha covardia e egoísmo eram grandes demais para sugerir que me deixassem para trás.
— Posso tentar andar um pouco.
— Cala a boca!
— Vai acabar nos nós dois caindo, você ta cansado.
— Já disse para calar a boca! — Ele respondeu ofegante.
— Posso assumir agora. — Eu olhei para Domy, que colocou as mochilas no chão e se agachou ao meu lado. — Vem, suba.
Ele passou os braços em volta das minhas pernas e me levantou, senti-me como uma criança ou uma donzela em apuros, não sabia qual era a opção pior.
— Nossa, você é pesado! — Domy arfou, estranhamente animado.
Três minutos mais tarde, eu sentia que estava à beira do desmaio. Meu corpo todo doía, especialmente minha perna.
— Vocês estão fofos, me lembram um casal bêbado! — Trix falou rindo, e eu sabia que ela estava apenas tentando me distrair e me manter acordado enquanto Luhan verificava a farmácia sozinho para ver se estava segura. Domy riu, o que me fez revirar os olhos. Ele segurava minha coxa para me manter em suas costas, enquanto eu abraçava seu pescoço, quase o enforcando, já que não conseguia mais me manter firme. Deitado parcialmente, ouvi dois disparos e Trix mudou sua expressão, abraçando o menino em seu colo com mais força. Luhan apareceu correndo até nós e pegou as bolsas, avisando que estava tudo limpo.
No interior da farmácia, Domy me colocou sentado no balcão. Trix brincava com Peter para distraí-lo, enquanto todo o meu corpo parecia ficar frio. Algo estava errado.
Assim que Luhan tentou desamarrar meu tênis, senti uma onda de dor percorrer minha perna, travei os dentes para conter um grito.
— Merda. Merda… — Falei baixo, tentando esvaziar a mente.
— Ele não vai aguentar.
— Você tem razão, procure algo para a dor!
Domy revirou as prateleiras e voltou com dois frascos.
— Achei morfina e Vicodin.
— A morfina é injetável?
— Não sei, acho que sim... — Domy olhou confuso e Luhan pegou o frasco de sua mão.
— Agora preciso de uma seringa. — Novamente Domy sumiu e voltou com um saco de seringas, pegando uma delas.
— Agulhas? — Perguntei com receio. — Não tenho nada contra tomar uma injeção, mas você não é um maldito médico!
— Minha mãe era, aprendi muita coisa com ela, agora fique quieto.
Prefiro não questionar, já que não tinha muitas opções, apenas assisti enquanto ele brincava de médico. Luhan aplicou a injeção em meu braço, esperei um pouco e logo comecei a sentir meu corpo ficar leve. Domy colocou algo nas minhas costas e eu fiquei semi-deitado. Senti ele abrindo minha calça, mas não tinha forças para reagir, virei o rosto para Beatriz, que mantinha sua atenção na criança. Olhei para baixo, o corte estava um pouco acima do tornozelo e parecia horrível, mas não sentia mais nada além de uma leve queimação. Domy jogava soro com as mãos trêmulas, enquanto Luhan limpava com algodão.
Agradeço por estar chapado de morfina, ou aquilo seria torturante.
— Tenho que suturar, está muito fundo.
— Sutu... Espera. — Falei meio grogue. — Isso é costurar? — Estranhei minha própria voz, parecia a de um bêbado.
— Eu consigo, não deve ser tão difícil! — Tentei focar os olhos em Luhan, que estava se sentindo um cirurgião. — Só não se mexe ou...
O coreano não terminou de falar, apenas pegou a agulha junto com um monte de coisas que Domy havia espalhado no balcão. Eu preferi não olhar enquanto ele dava pontos em mim. Depois do que pareceu uma eternidade, Luhan soltou a agulha, limpou novamente minha perna, contei mentalmente os pontos, eram cerca de sete, tortos mas eficazes. Ele enrolou minha perna e tornozelo com atadura. Muita atadura.
— Deveria limpar a sua mão, tenho quase certeza de que o sangue não é meu. — Afirmei, olhando para Domy. Ele concordou e passou clorexidina na mão, logo enfaixando-a também.
— Meninos, estão prontos? — Trix perguntou com um ar travesso. Primeiro estranhei sua expressão, mas logo lembrei que estava apenas de cueca vermelha e uma blusa preta.
Luhan me obrigou a engolir dois comprimidos de alguma coisa e logo eu estava novamente em suas costas, mas a humilhação dessa vez era pior, já que eu estava parcialmente nu. Descemos a rua a pé até finalmente encontrarmos um carro com as chaves no câmbio.
Sentado no banco de carona, semiconsciente ao lado de Trix que segurava a criança em seu colo, eu lutava para me manter acordado. Domy estava ao volante, com Luhan ao seu lado. No começo, ele parecia um pouco confuso, já que só havia dirigido dentro do quintal, mas era mais do que Luhan tinha feito até então.
Trix me perguntou se eu estava bem e eu apenas sorri, assentindo. Pois a expressão no meu rosto era apenas uma fração do que eu realmente sentia. Meu corpo estava fraco, mal conseguia mover a cabeça sem sentir dor.
Nesse pesadelo em que fomos obrigados a viver, não havia mais o luxo de ser cuidado por profissionais e descansar. Era apenas aguentar a dor e o medo, engolir o choro e torcer para sobreviver mais um dia.
Passamos cerca de uma hora no carro, sempre fazendo desvios quando nos deparávamos com os infectados. Esperávamos que a gasolina durasse até Niterói. Lembro que meus olhos começaram a pesar em algum momento quando o carro parou. Um caminhão tombado bloqueava a estrada e tivemos que voltar para pegar a próxima rua. Em um dia normal, a viagem de Lebron a Niterói levaria apenas uma hora, mas estávamos levando dias, pensei comigo mesmo, observando o corpo do motorista morto vagando ao lado do caminhão, antes de meus olhos se fecharem e eu adormecer, ou desmaiar, não tinha certeza.
Acordei com a voz de Trix me chamando, ela segurava uma garrafa de água que aceitei com um pouco mais de clareza, embora também trouxesse consigo um aumento na dor.
Domy parou o carro de repente.
O olhei pronto para lhe mandar pro inferno quando percebi soldados se aproximando, empunhando armas pesadas e se dirigindo até nós.
— Vamos ser salvos antes mesmo de chegar em Niterói! — Domy disse com um sorriso.
— Estamos bem! — Luhan arriscou gritar pela janela, levantando as mãos em sinal de rendição.
Um dos soldados, vestindo um uniforme verde, abriu a porta do carro com brutalidade, enquanto os outros mantinham suas armas apontadas para nós, provavelmente prontos para atirar se algo desse errado.
— Saiam!
Tentei obedecer, mas meu corpo não cooperava. Luhan explicou rapidamente que eu tinha sofrido um acidente. Domy mostrou o ferimento em sua mão, desenfaixando-o para o soldado. Ele se aproximou de mim, retirando a atadura, o que fez com que eu desmaiasse novamente.
Acordei parcialmente, deitado em uma van escura, sem entrada de luz. A criança estava chorando e Domy a balançava em seu colo, tentando acalmá-la. Luhan observava através de uma fresta na porta de metal. A van deu uma parada abrupta, quase derrubando Luhan, que rapidamente voltou para o lado de Trix. As portas da van foram abertas e o céu já estava tingido de um laranja escuro. Trix pegou Peter, enquanto Domy e Luhan me apoiaram, um de cada lado, enquanto caminhávamos atrás dos soldados em direção a um prédio grande.
Nossa caminhada era lenta, e isso parecia irritar os soldados carrancudos que nos guiavam. Mas o que eu poderia fazer? Mal conseguia me manter em pé. Luhan quase me deixou cair quando Trix e Peter foram levados para corredores diferentes. No entanto, nos disseram para ficar calmos e explicaram que era apenas um procedimento para separar os gêneros e que as mulheres seriam encaminhadas para o banho, enquanto os homens seguiriam para outra área.
No entanto, a parte mais desconfortável foi quando tivemos que nos despir diante de dois soldados armados que nos encaravam como abutres. Eu me apoiava em apenas uma perna, tremendo para sustentar meu peso e suportar a dor, tentando evitar ao máximo olhar para os lados. Percebia que os meninos faziam o mesmo, mantendo os olhos fixos na parede. O sangue que escorria de minha perna formava um redemoinho no ralo enquanto eu tentava tirar toda a sujeira na água fria.
Recebemos roupas limpas, moletons cinza e tênis branco com cheiro de desinfetante e álcool. Sentei-me em uma cadeira de rodas apenas de cueca, com a calça e o tênis dobrados sobre meu colo, e fui levado para outra sala por uma mulher de jaleco branco e máscara. Ela se apresentou como Doutora Schulz e explicou que me daria um sedativo para cuidar do meu ferimento. Aceitei, afinal, qual escolha eu tinha?
Acordei sob uma luz forte, em um quarto completamente branco, com apenas a cama em que eu estava deitado, uma cadeira de rodas ao meu lado, um criado-mudo, um vaso sanitário e a porta. Olhei para baixo e puxei o cobertor, constatando que o curativo estava impecável. Sentei-me e observei a câmera no canto do teto, ao lado da porta. Foi então que uma voz masculina soou alta.
— Bom dia, Vinicius!

𝚂𝚝𝚊𝚢 𝙰𝚕𝚒𝚟𝚎Where stories live. Discover now