[09] Sobre escadarias e australianos

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Alicia Brown

Assim que cheguei ao meu dormitório, nem ao menos ouvi o "olá" da minha colega de quarto, Jessie. Passei como um furacão direto para o banheiro, atirei as roupas ao chão de qualquer jeito e entrei debaixo do chuveiro, ligando a água no mais gelado possível. O choque da água em meu corpo me fez sentir como se flocos de neve com facas nas pontas me atingissem, visto que eu estava quase febril de tão quente. Vergonha, nervosismo, indignação e o fato de eu ter chegado correndo até o prédio feminino eram algumas das razões para minha temperatura elevada.

O que caralhos havia acontecido?!

Apesar da embriaguez, eu me recordava perfeitamente dos acontecimentos da última noite. Lembrava-me de sair chorosa da festa, de esbravejar com Chris quando ele me encontrou e de ser completamente engolida por um desejo animal cinco segundos depois de ele ter me beijado. Tudo bem que já era estranho o suficiente ele ter tomado essa atitude, mas pensando melhor, podia ser uma tática pra me fazer calar a boca. Agora a minha reação àquilo não tinha cabimento algum! Eu retribuí sem pestanejar. Retribuí cada beijo, cada toque, cada movimento... Não, eu não podia mais pensar sobre os detalhes. Não me faria bem algum ficar relembrando, reproduzindo as cenas mentalmente e dizendo a mim mesma que havia sido a melhor transa que eu já tive e que finalmente algum cara havia me levado até lá sem eu dar nenhuma dica.

Não, não mesmo. Era o momento de pensar em como poderia resolver as coisas com o Chris. De manhã, quando o vi assim que acordei, percebi que parecia tão confuso quanto eu. Aquilo deveria está-lo matando também. Mas qual é, eu sendo uma das mulheres mais libertinas que conhecia, já deveria ter imaginado um cenário desses acontecendo conosco. Amigos às vezes se pegam. Isso não precisava estragar toda nossa história, apesar de ser completamente bizarro e inesperado e até um pouco cheio de sentimentos demais.

Saí do banho de cabeça fria (literalmente), enrolei uma toalha em meu corpo e recolhi as roupas do chão, dentre elas a camiseta de Christopher com cheiro de perfume (amadeirado com tons de café) e suor. Depositei minhas roupas no cesto, mas levei a camiseta comigo, imaginando que poderia entregá-la mais tarde. Voltando ao quarto em si, larguei-a em cima da minha cama e comecei a me vestir. Eu e Jessie não tínhamos pudores quanto a isso. Nosso lema era: não preciso me envergonhar se tenho exatamente as mesmas coisas que você debaixo da toalha.

— E aí, meu amor, que loucura toda era aquela? — Ela questionou, se referindo à maneira como entrei mais cedo. Jessie estava pintando as unhas dos pés de preto, sentada no tapete à frente de sua cama. E pelo visto, havia tingido seus cabelos curtinhos de preto novamente. — Souvenir? - Questionou, meneando a cabeça em direção à camiseta de Chris na cama.

— Sim. Só posso dizer que fiz merda. - Anunciei, suspirando, enquanto escolhia uma roupa qualquer. Jeans rasgados, blusa florida e cardigã, como de costume.

— Ah, o de sempre então. - Respondeu sem tirar os olhos de suas unhas. Mostrei-lhe o dedo do meio e o balancei para que ela visse de alguma forma. Funcionou, pois ela soltou um risinho abafado. — Homem? - Indagou.

— O que você acha? - Perguntei retoricamente. — Mas dessa vez foi em um nível alto demais até para mim.

— Não quer conversar? - Ela ofertou, me olhando empaticamente.

— Melhor não, Jess. - Respondi, mordendo meu lábio inferior em sinal de preocupação. — Vou sair um pouco para respirar, tá bem? Nos vemos mais tarde.

— Certo, Brownie. - Ela me chamava assim desde que nos conhecemos. Dizia que "Brown" era um sobrenome um tanto opaco, sem graça. Mas transforme-o no nome de um doce e veja a magia acontecer. — Até logo.

Cupido Reverso [CONCLUÍDO]Where stories live. Discover now