[14] Um artigo em dupla e um almoço caótico

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Christopher Perry.

Para uma segunda-feira, aquela não era das piores. Eu já havia tido quase uma manhã inteira de análise aplicada em literatura (uma das minhas aulas favoritas), tinha conseguido pegar um frappe de pistache sem problemas, ainda que fosse uma edição limitada do Blue Java, e o bebi na companhia da minha melhor amiga neste mundo inteiro, Alicia, enquanto debatíamos pela décima vez a construção cuidadosa do papel da propaganda para o universo de Jogos Vorazes. Eu adorava quando minha área de interesse - literatura - colidia com a área de interesse dela - sociologia -. Sempre rendia conversas incríveis que me faziam esquecer do mundo à minha volta. E não era à toa, já que sempre fomos conhecidos como "a dupla intelectual". Ninguém nos vencia em um debate desde o ensino médio.

— Eu acho que a Suzanne Collins bebe muito da fonte de Fahrenheit 451. - Opinei enquanto caminhávamos pelo campus. Era o meio da manhã, aquele intervalo entre as primeiras aulas do dia e as últimas horas até o meio-dia que pareciam não passar. — Essa ideia de que a mídia detém todo o poder sobre a política da nação. Cada obra constrói essa noção de maneiras diferentes, é claro, mas você pode notar que sem a televisão, a Katniss não teria se tornado o símbolo da rebelião tão facilmente.

— Creio que você tenha razão, Perry. - Ela concordou, bebericando seu frappe. — O Bradbury se utiliza muito do poder do marketing para passar a mensagem dele, principalmente no fim do livro, quando os drones filmam a perseguição do Guy e simplesmente criam a falácia de que ele havia sido assassinado para causar pânico em qualquer um que quisesse se rebelar. - Ela disse, focada naquilo. Como eu amava conversar com Ali. Ela era tão inteligente. — Acho que nós deveríamos escrever um artigo em conjunto sobre isso! - Ela sugeriu, arregalando os olhos e abrindo a boca, como se tivesse tido a melhor ideia de todas.

— Sério? - Perguntei com um sorriso curioso, cerrando os olhos.

— Sim! Imagine só: "A mídia como fator de dominação em obras distópicas.", por Alicia Brown e Christopher Perry. - Ela falou colocando ênfase em cada palavra e abrindo as mãos à sua frente como se estivesse anunciando um filme.

— Parece uma boa ideia. - Concordei, pensando a sério naquilo. — Nos daria bons créditos. - Assenti. — A gente poderia começar a desenvolver isso no almoço hoje. - Sugeri, ficando gradualmente mais animado.

— No almoço de hoje? - Ela repetiu, dando um sorriso azedo. — Eu meio que vou almoçar com alguém.

— Com quem? - Indaguei, imaginando que seria Jessie ou Briana, ou até um daqueles caras deprimentes que Alicia sempre acabava arrumando e enjoando depois de uns dias.

— Andrew Byrnes. - Respondeu tão rápido que quase não entendi e voltou a beber seu café desconfortavelmente.

— O professor Byrnes?! - Exclamei em um tom de voz tão esganiçado que parecia o Ross de Friends. — Por quê?! - Eu não podia acreditar que eles estivessem de fato saindo.

— Porque nós estamos saindo juntos. - Ela disse, agora tão baixo que eu mal escutei. Quer eu acreditasse ou não, era verdade.

Em apenas um segundo, diversos argumentos sobre quão idiota era a ideia de sair com o Byrnes me passaram pela cabeça. Primeiramente, ele era um professor! Mas então lembrei que, segundo o código, não havia nenhum problema ali. Eles não eram, realmente, professor e aluna visto que não compartilhavam nenhuma aula, portanto, ele não tinha poder acadêmico sobre ela. Pegava meio mal, mas não era tão raro quanto se pode imaginar. Então pensei: ele é bem mais velho que ela! Sim, Alicia tinha vinte e um como eu, e Andrew vinte e oito. Mas sinceramente, qual garota universitária recusaria um professor alto, bonitão e estrangeiro que tem um carro esportivo e conseguiu um trabalho na Columbia antes dos 30? Ainda que ele fosse um merda, ele era aquele cocô de civeta que dá origem ao Kopi Luwak, o café mais caro do mundo, e eu era no máximo um cocô de gato. Mas a pior parte de todas é que Andrew era um cara bem agradável de se ter por perto.

Cupido Reverso [CONCLUÍDO]Where stories live. Discover now