Primavera Sem Rumo (Livro 1) - Completo

Capítulo 39 - Connor Campbell

Casa dos Campbells: 14/05/2015 - Quinta-feira, 23:55 p.m.

A primeira lembrança que me veio à mente quando vi tio John sentado no sofá da casa da minha mãe foi aquela cena.

Sempre soube o motivo pelo qual influiu Elizabeth a mudar totalmente sua personalidade alegre mas ainda tímida para uma criança plenamente, inteiramente introvertida da noite para o dia. Era muito compreensível, ao menos quando tive idade suficiente para entender completamente o que tinha acontecido.

Naquela época, eu tinha onze anos, e mesmo que soubesse que o que via era algo conclusivamente errado, eu não consegui fazer nada para ajudá-la. Afinal, sempre tive rancor dela, e eu acreditava com todas as forças de um menino - com o coração inflamado pela ausência de carinho e amor - que o que meu Tio fizera não era algo relativamente sério. Acreditei ou me fiz acreditar que depois de ter tirado toda a atenção que tivera com a minha família após nascer, aquilo que lhe aconteceu era definitivamente nada para o que realmente merecia.

Embora anos tivessem se passado, ainda continuava tendo ciúmes da minha irmã. Mesmo sabendo o que teve que passar nas mãos do meu tio naquela noite, continuei achando que ela merecera.

Sabia que tinha traumas. Sabia que toda noite quando dormia tinha pesadelos. Sabia, sabia exatamente de tudo que a levou a transformar-se completamente. Nunca foi a minha intenção vê-la, por todos esses anos, sofrer na calada da noite pela mesma cena que vi por alguns segundos. Nunca pensei que seria algo tão sério que a levasse a não viver a sua vida como era o esperado para todo mundo. Nunca, nunca fui tentar fazê-la se acalmar toda vez que tinha esses pesadelos que a perseguiam impetuosamente.

Mas também nunca passei um dia me remoendo por não ter agido quando certamente deveria, quanto hoje.

Só foi vê-lo ali, sentado como se nada tivesse acontecido no passado, que a lembrança veio como se uma tonelada de chumbo tivesse caído sobre a minha cabeça.

Era por isso que simplesmente odiava lembranças. Odiava ter que remoer tudo de uma vez só quando lembrava de algo meramente importante. Odiava ter todos esses sentimentos que me deixavam confuso e não me deixava agir como sempre agia quando o assunto era Elizabeth Campbell.

Por isso, só por esse motivo, fui até seu quarto ignorando com toda a indiferença que tive naquele momento, o tio John para ver como ela estava, dando a desculpa de que procurava meu irmão, Dylan. Nunca soube lidar com ela e ajudá-la de algum modo não era a minha intenção realmente, pois apenas queria saber como estava com tudo aquilo, e também porque seria muito evidente que me preocupava queria manter a minha fachada de irmão despreocupado e sem interesse. E, se não fosse pela Iris, estando com ela naquele momento, estaria ainda mais perdido. No entanto, foi um alívio saber que finalmente contara para alguém com a qual confiava cegamente e, principalmente, por saber que estaria em boas mãos fora dessa casa, onde aquele desgraçado estava.

Sinceramente, não sabia bem o que fazer naquela situação. Só sabia que queria muito colocá-lo para fora dessa casa e que nunca mais retornasse. Porém, ainda que quisesse muito isso, o que mais queria era que Elizabeth tomasse a iniciativa de fazer algo sobre ele.

Mas, mesmo que isso acontecesse, não seria eu mesmo se não fizesse o que tanto queria por tanto tempo só que não soubera como, afinal, ele já não estava mais aqui quando cresci. Queria esmurrá-lo com meus punhos até ficar com a face irreconhecível.

E. Era. Justamente. O. Que. Faria.

Quando elas saíram do quarto, esperei afastarem-se para não pensarem que eu involuntariamente faria algo, ainda que não soubessem que sabia de tudo. Todo esse tempo. Assim que a distância entre nós crescera, segui-as com passos lentos e sorrateiros, e escutei Iris xingando-o com tanta raiva e mágoa na voz que essa minha sorrateira vontade de socá-lo simplesmente acentuou-se de uma tal maneira que não conseguiria aguentar mais. No entanto, esperaria.