Capítulo 5~

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Miguel

               Helena podia não saber, mas animava meus dias. Tirá-la do sério era uma das coisas mais incríveis que eu já tinha experimentado. Um dos motivos pelos quais eu dou tantas festas é para sair de dentro da minha própria cabeça. Trabalhando sozinho, nessa vida toda de máquinas, softwares e hardwares, eu preciso falar com outras pessoas. Além das mulheres, da bebida e de toda a diversão, minhas festas são meu momento de encontrar outras pessoas, galera que conheci na faculdade, nos fóruns, enfim. Irritar Helena é o meu outro momento. Vê-la furiosa, corada e brava era como voltar a socializar com o universo. Só que melhor, porque ela fica uma graça quando furiosa.

               Vamos ser sinceros: Helena não é nenhuma modelo da Victória Secrets, mas quem disse que eu sou fã daquelas musas? Helena é brasileira, tem corpo de brasileira, cara de brasileira, curvas de brasileira, jeito de brasileira. E esse é meu tipo de mulher. O que é uma merda, porque vamos combinar que é trabalhoso convencer Helena de qualquer coisa. Imagine convencê-la de que eu sou o tipo de homem dela. Sorte que eu também sou brasileiro, né. E brasileiro não desiste nunca.

              De toda forma, eu duvido muito que ela consiga se livrar do meu grande amigo Nicolas Cage. Eu tinha que bater palmas para mim por aquele plugin, porque nenhum Google ia ensinar Helena a tirar aquilo. Provavelmente, nenhum carinha de TI do trabalho dela ia saber tirar também. Sua única saída seria vir falar comigo. Eu sou gênio demais. Ela mereceu, também. O chão da minha casa ficou impregnado de vinho e minha camisa oficial do Blink-182 está totalmente arruinada depois dessa.

              É óbvio que eu não ia parar de chamar o pessoal para vir à minha casa. Eu dei uma maneirada, o Fulano lá, o tal do síndico, já me deu o primeiro aviso e, pelo que entendi, se chegar ao terceiro, eu vou ser convidado a me retirar do condomínio, junto com uma multa que, atualmente, não cabe no meu bolso. Também não estou querendo ser convidado a me retirar do condomínio, só para constar.

              Dessa vez, eu tinha combinado de só virem umas dez cabeças, porque era sexta e todo mundo que tinha salário fixo tinha programação paga para a noite. É claro que esses confirmados eram tão falidos como eu, mas eles sempre apareciam com, pelo menos, um engradado de cerveja. Como estamos falando de um bando de nerds, o campeonato de Mario Kart 8 estava prestes a iniciar.

              Os quatro controles já estavam devidamente posicionados na mesinha (essa é toda a minha contribuição nas festas: a casa, os consoles e o Mario Kart 8) e eu já tinha autorizado a subida dos caras para o porteiro. Eu estava ansioso por essa noite, tinha passado uma semana bem conturbada com um freela urgente e precisava descontar a frustração de um código mal escrito por seja lá quem tenha feito aquele software maldito em alguns cascos verdes bem atirados em um campeonato.

               Os caras abriram a porta sem bater. Isso é o que você ganha por ter amigos de longa data. Em três segundos, todos já estavam sentados e o Pac-trono (a forma carinhosa que meus amigos chamavam minha amada e querida poltrona amarela) esperava por mim. Busquei as cervejas que eles trouxeram e abri a geladeira para guardá-las. O vinho que Lena tinha trazido ainda estava na prateleira da porta e me causava certo incômodo no peito toda vez que eu o encarava. Ainda assim, a bebida era boa demais para ir para o lixo. Quando a minha raiva estivesse mais branda, eu tomaria um vinho olhando pela janela, pensando nos olhos castanhos daquela mulher que me tirava dos eixos, mas por enquanto não era boa ideia. No momento, o foco era vencer aqueles manés no Mario Kart. Depois, é claro, que eu atendesse a campainha.

              — Vocês pediram pizza ou algo assim? — perguntei, dirigindo-me à entrada.

              — Acabamos de chegar, cara. Como a gente ia pedir? — Felipe foi o único a me dar atenção, todos os outros mergulhados demais no videogame.

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