Capítulo 7~

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Helena

               Miguel deixou o quarto bilhete na janela desde o incidente com a minha (falta de) camiseta há dois dias. Ele estava muito enganado se pensava que eu iria sair do meu caminho para conversar com ele sobre o que quer que ele queira. Eu não gostava dele e estava muito feliz em manter distância. Como eu suspeitei, havia muita coisa para fazer no trabalho nos últimos dias. Coisas demais para me prender a qualquer capricho que ele tivesse. A reunião com a equipe de planejamento daquela semana foi pesada, porque queriam uma mega divulgação, como sempre, mas a verba era ridícula. As pessoas trabalham com propaganda há anos, mas não entendem que o intervalo do Fantástico é mais caro que comprar o meu prédio inteiro. Quem em sã consciência vai achar que anunciar durante trinta segundos no intervalo de uma das emissoras mais assistidas do país em um domingo à noite, quando a maior parte da população está em casa, vai ser barato? Não querem anunciar no Super Bowl também não? Enfim, explicar isso para o seu chefe nunca é fácil.

               Na sexta-feira, quando cheguei em casa, a surpresa foi maior. Havia um rastro de post-it's desde o elevador até a porta do meu apartamento. Eu não queria me abaixar para pegar cada um deles e dar o braço a torcer, mas a curiosidade venceu. Cada um deles tinha uma palavra escrita e estava numerado, provavelmente para formar a mensagem. Recolhi todos e colei na parede da sala, sentindo-me alguém prestes a desvendar um mistério.

"Oi, Lena. Que tal você deixar suas coisas na sala e dar um pulinho aqui em cima? Tenho chocolate."

              Ele estava se superando.

              Eu deixei a mensagem colada na parede e segui para a cozinha, já que eu estava desde o almoço sem comer e a menção a "chocolate" fez meu estômago dar pulinhos de excitação. Para a minha desgraça, todo o meu estoque daquela delícia (até mesmo o emergencial) tinha acabado. Após uma pequena varredura da situação atual da minha geladeira, fechei a porta, resmungando alto, e voltei até minha bolsa. Peguei a carteira e o celular, já com uma lista de possíveis compras em mente e saí pela porta.

              Quando as portas do elevador se abriram, lá estava ele. Miguel, em toda sua glória. Ele carregava uma cesta generosa com todos os tipos de chocolate possíveis. Eu podia ver mais de uma barra de Classic Duo, meio amargo, algumas caixas de bis, bombons, trufas da Cacau Show... Esse cara sabia chantagear uma mulher.

              O sorriso presunçoso entregou o jogo.

              — Tudo isso pode ser seu, vizinha. Basta me ouvir.

             Ponderei apenas o suficiente para que todo aquele paraíso adentrasse meu coração e me convencesse de qualquer coisa. A carne é fraca, amigos.

             — Ok, você venceu. Agora me dá isso aqui.

             Eu ainda segurava as portas do elevador no meu andar, por isso, quando tomei a cesta das mãos de Miguel e me afastei da porta, eu o vi voar como uma flecha por entre as portas do elevador, antes que elas fechassem. Eu não faria nenhum esforço para segurar o elevador para ele. Voltei para dentro de casa, feliz com meus chocolates. As demais compras ficariam para amanhã, na volta do trabalho.

              Miguel se sentiu em casa na minha sala, sentando no meu sofá confortavelmente e estendendo um envelope pardo para mim. Sentei-me em um sofá diferente, não muito disposta a estar perto dele.

             — O que é isso aí?

              Não pegaria naquele envelope de bom grado. A última coisa que eu queria era me comprometer.

Lá em cimaWhere stories live. Discover now