Em Pedaços (Romance Gay)

Indagações (EDITADO)

Estava em uma sala simples. A mobília me era familiar, embora a imagem não estivesse nítida. O ambiente estava claro demais... Fui me movendo pelo espaço, encostava as pontas dos dedos nos móveis empoeirados. Alguns apresentavam um aspecto antigo, retrô. Em um determinado momento havia conseguido juntar as peças. Não era real... Tinham se passado quase dez anos, mas tudo continuava da mesma forma, pelo menos até onde era possível lembrar. Os quadros estavam tortos, os dois sofás pareciam gastos e todos os móveis, cobertos de pó.

Me sentei em uma poltrona próxima e escondi o rosto sobre as palmas, assim que solucei. Era doloroso voltar.  Mesmo embora, não conseguisse lembrar com exatidão sobre tudo, ainda assim existiam lembranças sobre o meu passado, lembranças que não poderia ignorar. Tive um sobressalto quando a porta da sala fora aberta e dois garotinhos entraram ensopados. Os dois eram idênticos, apesar de que o último, que agora fechava a porta com um sorrisinho, parecesse um pouco maior. Atrás de mim, uma mulher com um olhar triste enxugava as mãos enquanto se dirigia aos garotos. Fiquei abobado com a cena.

- O que aconteceu dessa vez, Tay? - Ela parecia preocupada e cansada ao ver o meu eu mais novo completamente sujo.

- Foi um acidente. - Trevor respondeu revirando os olhos e dando chutes consecutivos no chão.

Ela o olhou desconfiada e mesmo que ele tentasse sustentar, acabou por desviá-lo.

- Você sabe que odeio mentiras, Trevor. - Suspirou e logo jogou a toalhinha que ainda segurava sobre o ombro enquanto se aproximava mais um pouco. Havia se abaixado para ficar da altura dele. - Você precisa ser mais paciente com ele.

Sabia que ela havia dito isso por conta das nossas inúmeras brigas.

- Ao menos saberei que terão um ao outro sempre. - Ela intercalou o olhar entre ambos. - Um dia vocês entenderão o porquê de dizer isso. - Tinha se levantado e direcionado um sorriso aos garotos. - Agora subam e vão logo tomar um banho. Seu pai e eu sairemos daqui a pouco.

Parecia uma cena engraçada. Corríamos escada a cima com nossas pernas minúsculas, observei o topo até o momento que ouvi o barulho de uma porta ser batida. Ainda estava sentado na poltrona embora mantivesse o tronco inclinado. Percebi ao lado quando a minha mãe começara a andar na direção da cozinha, mas então parou de supetão bem próxima ao vão. Ela girou a face e estranhamente me encarou. Parecia curiosa, estudava o meu rosto e então acreditei que houvesse me reconhecido. Fez que viria até mim, mas então se limitou a estender a palma da mão e colocá-la sobre o peito. Seu rosto aparentou pesar e quase como se não mais suportasse me ver, desapareceu. Tentei alcança-la, mas então tudo se dissolvera.

***

Acordei com um tremor. Meu corpo estava praticamente descoberto enquanto parte do edredom se encontrava emaranhado entre as minhas pernas. Esfreguei os olhos, ainda estava escuro. Fui engatinhando até a cômoda e estiquei o braço para apanhar meu celular. Olhei a hora no canto superior direito, era início da madrugada. A janela estava embaçada. Decidido por me levantar, puxei o edredom junto comigo e me aconcheguei no sofá de alvenaria próximo dela. Queria poder contemplar melhor o que ocorria lá fora enquanto refletia sobre o que acabara de ver.

A casa estava absorta em silêncio. Meus pais provavelmente ainda estavam deitados juntos no outro quarto e Trevor, ao meu lado, deveria estar dormindo profundamente. Talvez até sonhando em conseguir alcançar as regionais e se tornar algum jogador popular.