Capítulo 29

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Joseph Eliot Clark

Acordei com o toque alto do celular. Xinguei mentalmente quem estava me ligando cedo em pleno domingo, justamente o dia da minha folga.

— Alô? – A voz estava arrastada e sonolenta.
Filho... Eu te acordei, não é? – Pude sentir um sorrisinho brincando nos lábios dela. – Você sabe que dia é hoje? – Uma animação que eu já desconhecia tomava conta de sua voz.
— Dia da minha folga? – Bocejei e olhei as horas no despertador no criado mudo. Sete e quarenta e oito.
— Eliot, hoje é seu aniversário. Você está fazendo 23 anos, meu menino. Esqueceu da data do seu próprio aniversário? – Minha mãe realmente estava muito animada. – Vem me visitar hoje? Quero te dar um beijo.
— Sim, mamãe. Vou passar aí na parte da tarde.
Traga sua amiga Shaira também. Você nunca me apresentou para ela. – Ela soltou uma respiração pesada. Eu estremeci por dentro.
— Tudo bem, mamãe. Vou levar Shaira para a senhora conhecer direito. Preciso desligar. Até depois.

Desliguei o celular, me levantei e dobrei as cobertas. Dia 2 de dezembro. Meu aniversário.

***

Bati na porta do apartamento e me vi muito nervoso nos 5 minutos que levou para ela se abrir. Eu estava nervoso. Muito nervoso. Ela abriu a porta e seu rosto denunciava que estava dormindo.

— Aconteceu alguma coisa? – Ela puxou minha mão para dentro do apartamento e fechou a porta atrás de si. Apertou o laço do roupão e ajeitou o cabelo.
— Hum, não. Vamos almoçar? – Eu me sentei no sofá. O apartamento de Shaira já era tão familiar para mim.

— Joseph, não é oito e meia da manhã ainda. Está muito cedo para almoçar.
— É meu aniversário. – Levantei os ombros e coloquei as mãos no bolso da frente do meu jeans.
— Ah, parabéns. – Shaira sorriu.
— Cadê o meu presente? – Levantei a sobrancelha e o sorriso do rosto se desfez.
— Eu... Eu não sabia, sinto muito. – Ela puxou um cacho e coçou a testa.
— Eu quero que você saia comigo. Hoje, no almoço. – Eu já tinha tudo planejado. Tudo ia dar certo para mim. Para nós. – E depois a gente pode ir visitar minha mãe no hospital. Ela disse que quer te ver.
— Então tudo bem. Você já tomou café? – Ela abriu a geladeira e puxou a jarra de suco, manteiga e pegou os pãezinhos no microondas.
— Não.

Tomamos café juntos conversando para passar o tempo. Zunduri logo acordou com o papo e se juntou a nós. Ela parecia muito distante.

***

Me sentei no sofá após levantar a milésima vez e escutar o milésimo grito de Shaira vindo do quarto, que ja tinha despertado Peter de seu sono 3 vezes.

— Joseph, meia hora e eu estarei pronta!
— Shaira, pare de gritar! O bebê precisa dormir. – Zunduri respondeu com outro grito e o choro agudo de Peter irrompeu pelo pequeno cubículo de 81m².

Suspirei alto. Já estava me dando irritação todo aquele agito. Shaira saiu no corredor usando um casaco vermelho, coturnos e uma calça grossa de lã preta.

— Podemos ir? – Ela falou e abriu a porta.

***

Shaira escolheu um restaurante mais próximo do hospital, para que pudéssemos ir até lá a pé assim que tivéssemos terminado de comer.

A garçonete, uma ex colega de escola durante o colegial, nos atendeu e anotou os pedidos com atenção.

— Que casal bonito vocês formam. Tem muito contraste mas, ao mesmo tempo, completam um ao outro. Parabéns, Eliot. – Ela sorriu e deu meia-volta. Senti o meu rosto esquentando como se eu ainda fosse um adolescente.

Entrei em transe durante alguns segundos, mas a gargalhada de Shaira me trouxe de volta para a realidade.

— Joseph, você está bem? Quer uma água gelada? – Ela tentou conter o riso.
— Estou bem. – Coloquei a mão na nuca e senti a alta temperatura.

Ela riu mais uma vez antes de nossos pedidos chegarem e ela comer.


Depois do almoço, começamos a caminhar a passos lentos em direção ao hospital. Nossas mãos se encostaram e eu não segurei o impulso de entrelaçar nossos dedos.

Nós nos identificamos na portaria do hospital e eu subi, mas logo estranhei a animação da minha mãe.

— Eliot, Shaira! – A voz debilitada tomou conta do quarto. – Como você é bonita... Meu filho deveria ter me apresentado a namorada antes.
— Oi, senhora Clark. Hum, Obrigada, mas Joseph e eu somos amigos. Não é? – Ela me olhou e eu apenas sorri.
— Ainda não pediu ela em namoro? Eliot... Está perdendo muito tempo! – Mamãe riu e teve um acesso de tosse logo em seguida.

Minha mãe estava bem. Ela sorriu, fez brincadeiras, mas, de repente, ela ficou muda. Ouvi um grunhido e Shaira correu para chamar a equipe médica. Os aparelhos apitaram. Os olhos de minha mãe ficaram estáticos. Ela não me respondia. Comecei a entrar em desespero.

Um dos enfermeiros me colocou para fora do quarto e ficou comigo para se certificar que eu não iria entrar novamente.

Ouvi a risada de Katherine no corredor e então o mesmo rapaz apareceu na frente de meu pai e minha irmã. O sorriso dela se desfez e o pânico tomou conta de sua expressão. Quando me viu, correu até mim e me abraçou. Beijei sua testa.

— Calma, não é nada. Shh. – Puxei mais seu corpo contra mim. E ela se encaixou no meu pescoço.

***

Depois de mais de quarenta minutos, alguns médicos vieram até nós. Eles tinham um semblante cansado, triste.

— Familiares de Cassandra Benson? – O médico mais jovem se posicionou a frente do pequeno grupo. Meu pai balançou a cabeça positivamente. – Ela teve uma parada cardiorespiratória. Nós tentamos de tudo, mas... O câncer, ele já está em estado avançado, e os pulmões já haviam sido acometidos então...

Eu não escutei mais nada. Minha cabeça ficou pesada e deu um giro de 360°. Eu fiquei tonto por um minuto antes de sentir o tecido do casaco de Shaira me envolvendo. Eu a abracei tão forte como se toda a dor que eu estava sentindo pudesse se esvair.

Minha mãe não conseguiu. Ela não conseguiu lutar mais.
Ela não sobreviveu para ver Kate entrando na faculdade. Não sobreviveu para ver eu me casar. Não sobreviveu para ver os netos. Ela não sobreviveu. Ela foi embora. Ela não vai mais voltar. Nunca mais...

As lágrimas quentes desciam pelo meu rosto de maneira incontrolável. Eu não sabia o que dizer. Com muita dificuldade, me sentei em um dos bancos.

— Joseph, eu estou com você. Não me importa se os momentos ao seu lado serão ruins, mas sempre ficarei com você, te apoiando e te acompanhando. Sei que o momento é difícil, mas você precisa ser forte. Sua irmã precisa de você. Seu pai precisa. Por favor, seja forte agora. – Ela tomou meu rosto entre as mãos e falou de forma séria.
— Shaira... Eu... – Não pude concluir.
— Você não precisa falar nada. Está tudo bem, eu entendo que esteja se sentindo assim. Não precisa dizer nada. – Ela acariciou meu rosto e beijou minha bochecha.

Eu não poderia mensurar palavras para expressar a gratidão por ter ao meu lado uma pessoa como Shaira. A situação é delicada, mas ela está comigo. Eu tenho em quem me apoiar.

Além da Cor - CompletoWhere stories live. Discover now