O inesperado

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Acordei com uma enorme dor de cabeça e resolvi não ir á praia. Estava com sono acumulado, por isso voltei a dormir. Acabei perdendo a hora de ir para o trabalho. Julia deixou um bilhete na geladeira que dizia:


"Tentamos te acordar, mas você começou a dar spoiler do seu sonho, e preferimos deixar pra lá."

Eu estava tão ansiosa para olhar as câmeras de segurança da lanchonete que fica ao lado da livraria, e desvendar de uma vez por todas, o senhor Frerddie Aguillar, que me arrumei meteoricamente. Peguei a bicicleta da vizinha emprestada, e segui o percurso de sempre. Como sou uma mulher de muita sorte na vida, a bike estava sem freio. Só me dei conta desse detalhe sútil, quando comecei a descer uma ladeira desenfreadamente e não consegui parar. Para não bater num cachorro que aparecera do nada na minha frente, acabei dando de cara com um carro, que também vinha desenfreado. No momento da colisão tudo escureceu, e eu só conseguia ouvir vozes. Na multidão das vozes, um sussurro se destacou.

- Você vai ficar bem! Você é forte, senhorita Muller!

Eu não conseguia me mexer, muito menos abrir os olhos. Tudo em mim estava mortificado, mas meus ouvidos estavam atentos. Eu não conseguia raciocinar, e acabei me deixando embalar por aquele leve sussurrar.

- Lorena, sei que pode me ouvir! Não me deixe, por favor!

Pensei estar delirando, mas o sussurro era tão real. Eu só queria poder abrir os meus olhos e enxergar o dono daquele sussurro. 

- Não pode me deixar agora, Senhorita Muller! Não pode!

Eu não imaginei que pudesse ser Freddie, pois não conseguia nem pensar, quanto mais imaginar. Eu só conseguia ouvi-lo, e como era bom ouvir aquela voz.

- Volte, Volte, volte...

Todas as vozes se calam, e só consigo ouvir o sussurro.

- Volte para mim, Senhorita Muller!

Sinto todos os meus sentidos indo embora, e aquela voz evaporando como fumaça de café. Café preto. Preto.

De repente tudo ficou preto.

Uma semana depois

O quarto é silencioso e calmo, mas barulho do ventilador quebra um pouco do silêncio. Quando a luz azul reflete em lorena, o seu cabelo curto fica preto azulado e sua pele ganha um tom azulado. O contraste de cor é inebriante. Ela está em coma há uma semana, seus olhos estão fechados há uma semana, seu sorriso está trancado há uma semana, mas no fundo sei que ela pode me sentir .

Sinto um barulho estridente, como se milhares de borboletas voassem dentro da minha cabeça, e vozes começam a renascer dentro de mim, tento abrir os olhos, mas não consigo.

- Senhorita Muller, você pode me ouvir?

O sussurro me invade, acordando todos os meus sentidos que estavam há uma semana dormindo, mas os meus olhos continuam semicerrados. A minha mente acorda, mas o meu corpo continua inerte. Sinto minha mão sendo entrelaçada, e com todas as forças que tenho aperto-a. 

- isso meu amor, volte para mim!

Lorena continua estática, mas sei que ela ouviu o meu chamado, e vai voltar logo, logo...

Duas semanas depois

Amor, foi a palavra que me acordou, abro os meus olhos e procuro ansiosamente pelos olhos dele, mas não há ninguém ao meu redor. Sinto um vazio imenso no estômago, e ouço a porta se abrir. Uma garota, provavelmente da mesma idade que eu, entra com uma cara de " meu Deus ela acordou", e logo em seguida uma outra  com a mesma cara. Fico com medo delas. A mulher mais alta pergunta:

- Lô, você sabe quem sou?

- É minha vó? ( respondo baixinho, pois mal consigo falar)

- Ela perdeu a memória, mas não perdeu a graça.

Olho para Julia com um pouco de dificuldade, pois ela é mais alta que a torre Eiffel, depois para Sofia com menos dificuldade.

Tento sorrir, mas sorrir dói. Olhar dói, pensar dói... Tudo em mim dói.

Elas me abraçam, e sinto uma umidade desnecessária nos meus ombros.

- Parem de chorar, suas dramáticas! (Elas não me ouvem)

Percebo que não consigo falar, apenas penso.

Julia olha bem dentro dos meus olhos, e começa a falar  desenfreadamente:

- Lorena, você deu um grande susto na gente, sabia?! Que ideia de jerico foi essa, de pegar uma bicicleta sem freio? Tava tentando se matar, garota!? 

Tento buscar na memória a última vez que andei de bike, mas só me recordo do dia em que caí num buraco.

- Que lugar é esse ? (Pergunto sussurrando, porque falar dói)

- É um hospital, Lô...

-  Achei que era uma balada.

Consigo ouvir o sarcasmo em minha voz baixinha.

Um tornado de memórias chegam sem pedir licença, e minha cabeça se enche de dor. Memórias doem quando nos invadem rapidamente. 

Eu sinto uma imensa falta da minha mãe.

-  Minha mãe? Porque não está aqui?

Julia me olha como se eu tivesse acabado de falar algo em árabe, e o silêncio toma conta do quarto.

- Por que estão me olhando desse jeito? Aconteceu alguma coisa com ela? (Sussurro)

Dois médicos entram  no quarto surpresos em me ver acordada, e o silêncio se dissipa no ar. As meninas são obrigadas a sair do quarto, e eu me sinto sozinha novamente, mesmo estando na companhia de dois médicos e várias enfermeiras. Sinto algo fino ser injetado no meu braço, e tudo escurece novamente.

O Meu Amigo EscritorWhere stories live. Discover now