Que susto!

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O comboio avança a toda a velocidade em direção ao Capitólio, e eu não consigo descolar o olhar da janela panorâmica do último vagão. A sensação de ver as árvores a passar tão rápido à minha volta deixa-me extasiada, e tento guardar cada pormenor da paisagem desfocada na minha cabeça. Nunca andei tão rápido na minha vida, o máximo foi numa bicicleta ferrugenta emprestada por um homem da quinta onde nós, os miúdos do orfanato, trabalhamos, e a visão que estou a ter em nada é comparável.
Eu ainda fui perguntar a Letty se não havia uma janela que eu pudesse abrir. Queria sentir o vento, aposto que seria quase como voar, mas ela disse que vamos demasiado rápido para isso (e olhou para mim com aquele ar de superioridade, como se eu tivesse perguntado a coisa mais parva do mundo).
Perco a noção do tempo enquanto olho lá para fora, é tão hipnotizante... Sinto uma mão pousar-me no ombro e viro-me imediatamente para trás adotando uma posição defensiva, normal quando estamos num ambiente novo com pessoas desconhecidas. Quando vejo quem é, o coração começa a desacelerar, mas mantenho a expressão desconfiada.
- Que susto! - reclamo eu, afastando-me dele. Não me sinto confortável tão perto.
- Calma, sou só eu.
Rio-me baixinho, sem conseguir esconder a ironia. Sim, sim, o rapaz com quem vou para a arena e que se tiver a oportunidade de me matar não hesitaria diz-me com toda a serenidade "sou só eu". Conan olha para mim confuso pela minha reação, então faço sinal com a mão e digo:
- Deixa lá, não é nada.
- Enfim. - parece esquecer o assunto - Estavas a fazer o quê tão distraída?
Levanto a sobrancelha, estranhando a forma como ele fala comigo, só pode estar a confundir-me com alguma amiga.
- Só a ver. - respondo, não querendo conversas com ele.
- A Letty chamou. Parece que a nossa mentora quer falar connosco.
Caminho até a entrada do vagão sem dizer nada e Conan afasta-se para eu passar primeiro. Ok, ele é mesmo estranho.
Ando rápido pelo corredor, sempre ciente dos movimentos do rapaz atrás de mim.
- Próxima porta. - indica Connor.
Faço o que ele diz e viro à direita passando pela porta automática que dá acesso a uma sala com uma televisão enorme e sofás de aspeto  confortável, onde já está sentada uma mulher que deve estar próxima dos quarenta, mas linda de morrer. Tem a pele muito escura, cabelos aos caracóis quase pretos (mas já com sinais de alguns brancos) que fazem uma coroa à volta do seu rosto e corpo robusto e elegante. Traz uma roupa simples mas que a favorece e a expressão no seu rosto não podia ser mais pacífica.
Decido sentar-me na poltrona individual ao lado da dela e Connor fica no meio do sofá comprido. Pego num dos biscoitos lindos pousados numa travessa de ar caro, apesar de ainda estar cheia com a quantidade de comida que enfardei mal entrei no comboio. Ao menos não vou passar fome nos próximos dias (apesar de não me poder queixar, em termos de alimentação a vida no orfanato é bem melhor que muita gente do distrito)
- Olá Luna e Connor - começa a mulher a dizer.
- Prefiro Gabriel, se puder ser. - interrompe Connor. Olha para mim, mostrando que o pedido serve para as duas. Não me faz diferença, também não tenho intenção de dizer o nome dele muitas vezes.
- Claro... - prossegue ela - O meu nome é Tashi e eu vou ser a vossa mentora. Quero que saibam que não vou ser hipócrita e dizer-vos que isto vai ser fácil. Aliás, vai ser quase impossível. Se acham que só por serem crescidinhos e fortes já ganharam, desenganem-se. A parte mais importante é a mental, é mexer com a cabeça dos outros tributos, e sobretudo da gentinha da capital. Se eles acreditarem que vocês têm alguma hipótese de sair de lá vivos não tenham dúvidas que vão apostar em vocês e dar-vos o que precisam.
- Ok, já chega de conversa fiada. - interrompe Gabriel, com uma cara de aborrecimento.
Se o olhar matasse, Tashi já o tinha exterminado.
- Vamos esclarecer uma coisa, rapazinho. - começa ela, com um tom muito calmo mas ao mesmo tempo implacável - Eu tenho todo o interesse em que um de vocês saia daquela arena vivo, ou achas que é fácil ser mentora durante estes anos todos e em todas as edições ver miúdos do meu distrito morrer? Eu não sou da capital, e se quiserem a minha ajuda têm de confiar em mim. Entendido? - Tashi passa o olhar por nós os dois, e eu sei que ela tem razão, então aceno em concordância. Gosto dela.
- Entendido. - confirma Gabriel, envergonhado. - Desculpe.
- Tratem-me por tu. - diz Tashi enquanto se levanta e se dirige à porta.
Antes de sair diz num tom irónico:
- Felizes Jogos da Fome.
E eu digo na minha cabeça: e que a sorte esteja sempre a meu favor.

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Olá pessoal! Espero que gostem deste capítulo, é um bocadinho mais comprido, devo começar a escrevê-los deste tamanho ou talvez maiores.
Votem e comentem, gostava muito de saber a vossa opinião!
Muitos beijinhos e obrigada 😘

Hunger Games: a história por contarحيث تعيش القصص. اكتشف الآن