Capítulo 2

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Eu detestava hospitais. Eu detestava esperar. E eu odiava mentir.

Mas aqui estava eu, fazendo tudo isso ao mesmo tempo. E eu sequer conseguia me convencer de qual era o verdadeiro motivo para eu estar fazendo isso. Meu dever cívico? Curiosidade?

— Delegado? — a enfermeira atrás do balcão chamou a minha atenção, eu obviamente estava distraído. — Você vai precisar preencher mais esse formulário com informações do acidente.

As perguntas que me encaravam naquele pedaço de papel eram como dedos acusadores, mas eu precisava dizer meias verdades para ajudar a mulher, que tão obviamente não queria ser encontrada, e isso significava limpar vestígios de acidentes que não envolvessem um carro e uma colisão frontal.

Eu estava finalizando a milésima ficha, quando um médico, na casa dos cinquenta e de aparência cansada, apareceu ao meu lado. E a sua expressão não me transmitiu muita confiança, o que fez suspirar pronto para ouvir notícias ruins.

— Com licença, senhor, me disseram que você acompanhou a paciente do acidente na rodovia. — eu afirmei com a cabeça esperando que o homem cortasse a enrolação. — Bem, ela está estável, teve algumas lesões nos ossos das costelas e no braço direito, ferimentos superficiais no rosto e um corte significativo na mão direita. — o médico me lançou um olhar estranho. — A que velocidade esse carro estava mesmo?

— Acredito que acima do permitido, já que ela conseguiu todos esses ferimentos e até mesmo o air-bag foi acionado. — eu mantive a voz plana e firme, mas o doutor me pareceu cético ainda. — Na verdade, o acidente só não foi pior porque a estrada estava vazia devido ao horário.

O homem me olhou desconfiado por alguns minutos, obviamente, ele não estava comprando a minha explicação, mas algo deve tê-lo feito mudar de ideia.

— Você me parece um homem decente... Então sim, acho que as lesões fazem sentido com o tipo de acidente que você descreveu. No entanto, ainda não temos nenhuma informação sobre a paciente para colocarmos no prontuário, então se você tiver como nos dizer ao menos o nome dela, isso pode facilitar as coisas quando ela acordar.

Senti que estava em algum tipo de teste sob o olhar especulativo do médico, mas eu não me intimidei com isso, porque eu, mais do que a equipe inteira desse hospital, queria saber o nome daquela mulher e principalmente o que tinha acontecido com ela, por isso eu simplesmente não pensei sobre as minhas próximas palavras.

— Eu gostaria de ser o primeiro a conversar com ela, doutor, quando ela acordar. Sabe, para poder ter mais informações sobre o caso dela, hum quer dizer, sobre o acidente. Eu sou o policial responsável. — tentei ser firme e profissional e em retorno, recebi um sorriso do homem mais velho, o que me deixou desconcertado.

— Muito bem, rapaz. Vou pedir para uma enfermeira te avisa quando ela acordar. Deve demorar algumas horas ainda. — com essas poucas palavras, fui deixado sozinho.

Ótimo! Quem não adora ficar mais horas à toa nesse admirável lugar apático cheio de gente sofrendo? E a culpa era só minha por isso, quer dizer, da minha curiosidade e aparente obsessão por uma mulher que eu sequer conhecia.

Eu estava preste a levar a minha autocomiseração para um dos bancos desconfortáveis do lugar, quando uma voz animada me pegou de surpresa, ao mesmo tempo em que braços cobertos por roupas cirúrgicas me prendiam num abraço forte demais para alguém tão pequeno.

— Meu super-herói gostoso!

— Drica! — eu disse num tom que misturava surpresa e culpa, pois eu havia me esquecido completamente dela.

Acordo do Destino #4 (DEGUSTAÇÃO)Où les histoires vivent. Découvrez maintenant