Capítulo 6

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A Lili transmitia suas emoções na voz, uma mistura de descrença e compaixão. Ela estava visivelmente abalada.

No entanto, eu também não estava muito diferente dela. Fiquei estático ao saber que a minha noiva misteriosa tinha parentesco com a Lilian, mesmo que eu soubesse que a mulher tinha uma família numerosa, com tios e primos suficientes para montar dois times de futebol, era quase impossível ver semelhanças entre as mulheres.

Na verdade, eu fiquei bons longos minutos analisando a fisionomia da advogada, enquanto tentava fazer a minha mente absorver essa nova descoberta.

— Eu queria saber o que aconteceu, doutor. — observando de perto, o azul dos olhos era bem parecido.

— Está querendo sentir o meu perfume, Sanches? — a voz do Nic me tirou do transe em que eu estava; transe que me fez praticamente colar o rosto no casal abraçado.

— Er, hum, desculpe, eu, hum, continue doutor.

Se houvesse uma competição de envergonhar a si próprio, eu certamente estaria entre os finalistas hoje. O homem de jaleco esboçou um pequeno sorriso, antes de retornar ao que realmente importava.

— Bem, no quadro clínico, ela sofreu ferimentos condizentes com o acidente de carro que ela estava envolvida. — o médico me lançou um olhar cheio de significado antes de prosseguir. — Mas extraoficialmente, esse quadro também seria o de alguém que sofreu agressões sérias.

Um choque muito grande se estampou no rosto da Lilian.

— O senhor está querendo dizer que ela levou uma surra?! Mas, mas, me disseram que foi uma batida de carro! Eu já imaginei que a idiota estava bêbada e começou a dirigir e não que bateram nela! E aquilo não foi briga de mulher, porque aquele cabelo loiro dela estava inteiro! Meu Deus, isso está acontecendo mesmo?

Obviamente a Lili tinha surtado, ela praticamente cuspiu as palavras uma atrás da outra sem respirar. Mas o médico se manteve íntegro na sua explicação.

— Eu percebi que ela tem uma aliança na mão esquerda, e bem...

O homem não precisou completar a frase para que ele fosse compreendido, quer dizer, ao menos para mim suas meias palavras foram suficientes para que um verdadeiro Da Vinci fosse pintado na minha mente.

— Estamos falando então de um caso de violência doméstica? — eu perguntei querendo ter uma confirmação do médico.

— Não seria a primeira vez que eu me deparo com situação dessas. Mas, nada será conclusivo até conseguimos conversar com a paciente.

— Mas nós teríamos notado, não é? Quer dizer, a família. Isso não é uma coisa que se esconde tão facilmente. — a Lili estava descrente, completamente abalada, o que era compreensível.

Amoreco, a gente nunca sabe o que acontece de verdade com o outro. — o Nic tentou consolá-la, numa voz macia.

— Estamos ministrando analgésicos para diminuir a dor, isso a deixa sonolenta. Então, quando ela acordar novamente você poderá conversar com ela. — o Vasques pareceu se lembrar de algo. — Desculpe, eu ainda não sei o nome dela, aliás, vamos precisar que você preencha a papelada depois, com os dados corretos.

A Lilian parecia ainda estar presa na própria mente quando respondeu, num murmúrio.

— O nome dela é Gabriela... Eu vou precisar ligar para a mãe dela, Meu Deus, o que eu vou dizer?

— Lili, eu acho que você pode deixar para falar com a sua tia depois, afinal, a Gabriela pediu para chamar você e não ela. — o Nic disse dando um apertão carinhoso nos ombros da advogada.

— Concordo com você rapaz. — o medido aquiesceu com o Nic. — A moça pediu para uma enfermeira te encontrar, não quis dizer o nome e nenhuma outra informação, apenas pediu para procurarem o seu nome na internet.

— Claro que mesmo prostrada, ela iria me ridicularizar! — a Lili pareceu consternada, mas eu acreditava que essa birrinha não passava de um escape da verdade.

O médico a encarou com um olhar estranho, mas antes que ele pudesse falar alguma coisa, uma enfermeira apareceu na porta da saleta.

— Com licença, doutor, o filho daquela paciente da Grécia, a senhora que desmaiou ontem, está querendo conversar com o senhor.

A expressão do médico denunciou que ele não estava muito entusiasmado para atender ao chamado, e eu imediatamente me lembrei do episódio de ontem com a Drica. Provavelmente, essas mesmas pessoas, uma aventura que parecia estar deixando toda a equipe médica de cabelo em pé.

— Me desculpem, preciso ir. Mas assim que tivermos uma mudança no quadro da Gabriela, entraremos em contato.

O homem nos escoltou para fora da sua sala, nos deixando novamente na área de espera. No entanto, eu sequer me importei com os olhares curiosos das pessoas entediadas que estavam sentadas por ali, pois eu só conseguia imaginar o que havia acontecido com a tal prima da Lili. Como aqueles ferimentos foram causados e principalmente de quem ela estava com medo a ponto de fugir.

— Lili, você está tremendo! Você está bem? — o Nic começou a empurrar a esposa para uma das cadeiras vazias.

— Não, eu não estou bem! Eu nem sei por que ela me chamou, afinal, não é como se fossemos melhores amigas ou coisa assim! E apanhar do marido?! Isso parece tão surreal!

— É difícil acreditar que esse tipo de coisa acontece no nosso quintal, mas acontece Lilian. E a gente nunca vai estar pronto para isso, mas precisa aprender a se levantar. — meu amigo disse essas poucas palavras com o peso de quem já passou por uma tragédia.

— O cara era um milionário! Não faz sentido, o homem praticamente lambia o chão em que a Gabi pisava!

A mulher estava obviamente surtando, falando e falando sem parar. E o Nic aparentemente já não sabia mais como acalmá-la, pois ele gesticulou com os lábios um pedido de ajuda.

— Lili, violência não tem nada a ver com dinheiro ou status. E se a sua, hum, prima pensou em você nesse momento era porque ela te vê como alguém forte que vai ajudá-la. — eu usei um tom baixo e consegui a atenção da advogada. — Mas a gente só vai realmente saber o que aconteceu quando conversar com ela.

— Isso mesmo, o Sanches está coberto de razão. — o Nic me lançou um olhar divertido. — E eu nunca mais vou repetir isso na minha vida.

— Você é sempre engraçadinho nos momentos mais inconvenientes, Nicolas! — a Lili falou com uma pequena carranca no rosto.

— E é por isso que você me ama. — ele respondeu presunçoso. — Mas, eu acho que ficar aqui não adiantar de nada. A Gabi está sob medicação e por experiência própria, eu sei que isso demora a passar.

— De novo o assunto do tiro? Isso já virou notícia velha! — a Lilian parecia ainda mais irritada.

A voz da Lilian alcançou alguns decibéis a mais e isso nos causou um olhar muito severo de uma enfermeira mal encarada, que parecia prestes a nos espetar com algum calmante, por isso eu abracei os meus amigos e comecei a empurrá-los para fora do local.

— Isso aqui é um hospital, gente. Vamos resolver essa briguinha lá fora, que tal?

— Que tal você tomar um banho? Suor de macho não é comigo não, irmão. — o Nic se desvencilhou do meu abraço, mas a Lili continuou colada em mim até chegarmos ao elevador.

— Sabe o que eu não entendi? O médico dizer que te conhecia Sanches, você pode me explicar isso? Como você conhecia a minha prima?

Eu senti que a pergunta da Lili me deixou tão enclausurado quanto as portas daquele elevador, que nos levava para o andar de baixo, fazendo com que uma culpa se instalasse no meu estômago, porque de certa forma eu era responsável por esse resultado. Afinal, fui eu o idiota que encontrou a noiva indecisa e disse a coisa errada. 

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Gabriela está de volta e pronta para mostrar um outro lado... O que vocês estão achando disso?

E em breve vai ter sorteio rolando no Facebook! Corre lá ;)

Acordo do Destino #4 (DEGUSTAÇÃO)Where stories live. Discover now