O amor exige a verdade...

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Ruby narrando.

Queria não sentir essa dor agora, não agora. Meu coração chegou a um ponto que se eu não me sentasse e respirasse eu ia ter um ataque, um real ataque. Talvez possa nunca ter a capacidade de conversar com minha neta sobre esse assunto.

Fernando continua o mesmo, só que mais velho e de cabelos brancos, o corpo dele não mudou nada, sempre muito forte e... Tenho que falar com ele, mas agora eu não posso fazer isso, ele vai vir com tantas perguntas.

A verdade em tudo isso é que eu ainda o amo, é sim, eu sei, ficamos separados por 45 anos mas mesmo assim, eu o amo! Talvez a forma com que isso aconteceu e está acontecendo seja apenas mais uma prova em minha vida.

Guilherme era um bom padrasto para Donna, mas ele não era o pai, o pai da minha menina estava em algum lugar lá fora, me esperando, esperando que eu volte outra vez. Peguei meu celular e olhei uma foto que tinha de muitos anos atrás minha, de Fernando na praça, ele fardado e eu toda menina com as roupas que eu sinto tanta falta.

Eu o quero, quero mesmo, mas como eu irei contar que escondi a nossa filha esse tempo todo? Como vou dizer que tivemos uma filha juntos e agora ela está morta? Eu não aguento mais essa pressão em cima de mim, eu sinto que a qualquer momento irei e...

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Eu o quero, quero mesmo, mas como eu irei contar que escondi a nossa filha esse tempo todo? Como vou dizer que tivemos uma filha juntos e agora ela está morta? Eu não aguento mais essa pressão em cima de mim, eu sinto que a qualquer momento irei explodir. Eu preciso respirar, sim isso, respirar.

Desliguei e segurei o celular, no momento em que entrei naquele helicóptero eu estava pensando na minha neta e na minha filha e em mais ninguém, e vai ser por elas que eu vou ficar. Quero que um dia a minha filha onde esteja me perdoe por toda falta de carinho que não dei a ela quando ela mais precisava, eu realmente quero isso.

Quando sai do quarto já estava tudo calmo, apenas tinha o barulho do mar. Eu e ele apenas estávamos ali. Fechei o hobby quando uma rajada de vento passou pelo meu corpo. Fui até o centro do pátio olhando o que a minha netinha fez. Donna a criou tão bem, com tanto amor e carinho.

Me sentei em um banco que tinha mais perto para a beirada do hotel e fiquei olhando para o mar quieta e apenas pensando, nem vi quando alguém sentou ao meu lado e ficou olhando para a mesma direção que eu.

- Vovó? - eu sai do transe e a olhei.

- O que faz acordada, meu anjo? - eu a puxei para o meu abraço e continuei olhando o mar.

- Estava pensando na mamãe e resolvi vir aqui onde eu e ela ficávamos. - ela estava tão quietinha no meu abraço. - Sabe vovó, - ela me olhou e cruzou as pernas me chamando a atenção. - a mamãe sempre me contava como vocês duas se vestiam quando ela era pequena e como o vovô fazia ela rir antes de morrer.

Aquela altura eu estava me segurando para não chorar, eu sentia que mais uma vez a minha filha estava comigo mas na forma da minha neta. Sophie tinha a alma de menina ainda, por mais que esteja casada e esteja esperando uma criança.

- Ela falava? - sorri e funguei a olhando e sentei como ela, em pernas de índio. Nós duas estávamos lembrando de coisas boas naquela noite em que muitas coisas aconteceram. Sophie grávida, a minha volta, Fernando...

- Falava... - ela hesitou e foi fechando o sorriso. - Vovó? O Senhor Cienfuegos, o que aconteceu com vocês? - eu sabia que ela ia fazer essa pergunta e eu estava até com medo que ela não fizesse. Ela precisa saber agora!

- Fernando era um soldado mexicano na época em que viajei para o país naquele ano de 1959. O México estava em guerra com a Guatemala aquela época por problemas políticos. - eu estava a olhando e ela me ouvia atenta por mais que eu tenha apenas dito duas frases. - Eu já estava casada, na verdade, desde meu aniversário de 20 anos de aconteceu em 20 de maio de 1959, no mesmo ano. Meu marido, era filho de um amigo do seu bisavô, eu fui prometida, por questões políticas também, para que a nossa família tivesse tudo que tem hoje, a enorme empresa que eu e seu a... Guilherme construímos.

- Seu pai prometeu você, vovó? - ela me olhava com pesar nos olhos, ela estava triste de mais.

- Prometeu meu amor, mas no decorrer da minha vida meu anjo, Guilherme foi um ótimo homem. Viajei para o México para a temporada de inverno para passar com uma amiga, digamos que era um presente do meu noivado, mas naquele mês Guilherme não pode ir por trabalho, então fui eu apenas.

Sophie parecia uma criança enquanto contam uma história nova. Minha neta tinha que saber e só isso o que importava naquele momento.

- A primeira vez em que vi Fernando ele estava marchando para a fronteira para uma tentativa de paz, desde aquele momento eu sabia que íamos nos ver mais vezes, muito mais vezes. Voltei a vê-lo no Teatro Principal do México só que ele estava com uns amigos que davam em cima das mulheres. - eu ri lembrando daquela noite. - Tinha apenas um lugar ao meu lado e adivinha quem sentou ao meu lado?

- O Senhor Cienfuegos! - ela estava entendendo de onde começou a nossa história.

- Isso mesmo, você pode imaginar a sua avó de saias no fim dos anos 50? Eu era igualzinha a você, cabelos loiros, magrinha e muito branquinha. - passei a mão na bochecha dela e sorrindo voltei a falar. - Fernando sentou ao meu lado muito inocente, os pervertidos eram os colegas dele, naquela noite estava muito frio, então eu estava de luva, casaco, ponche e boina, então ele não viu minha aliança, não viu que eu era casada.

"Lembro como se fosse hoje, Soph, ele pedindo meu nome e se podia sentar ao meu lado, eu não entendia muito de espanhol e ele falava e eu concordava com o que eu sabia. Enquanto o teatro passava ele poucas vezes encostou na minha mão mas logo tirava. Eu ria muito internamente dele quando isso acontecia."

Sophie riu nessa parte e se deitou no meu colo pedindo aconchego para mim. Eu segurei a minha neta e beijei a testa dela carinhosamente sorrindo.

- Depois disso eu e Fernando nos encontrávamos muito, ele já sabia que eu era casada e mesmo assim quis continuar me vendo todo o momento em que conseguíamos. Eu estava apaixonada por ele, e uma noite ele me falou que também estava por mim. Muitas noites saíamos depois que meu marido ligava para pedir como eu estava. Fernando e eu éramos jovens e sem juízo. Uma noite Guilherme ligou e disse que não podia viajar para ficar comigo. Eu sei que era errado, mas eu comemorei quando desliguei o telefone.

- Vovó, eu não entendi onde isso encaixa com a nossa família hoje, a não ser o seu antigo amor por ele.

- Você vai entender meu amor, vai sim. - olhando para o nada eu sabia que esse era o final da história. - Fernando e eu fugimos uma noite para ficarmos sozinhos na beira do Rio Grande. Fernando foi tão fofo comigo, carinhoso e nessa noite eu me entreguei a ele, mesmo casada, eu me arrependi depois e ao mesmo tempo não. Fernando era o homem da minha vida eu queria continuar com ele, acabar com aquela farsa que seu bisavô criou na minha vida. Naquela noite eu fui feliz por um segundo, quando os soldados chegaram onde estávamos fui tirada do lado dele e levada para a capital sozinha, Fernando ficou lutando contra a liberdade do povo mexicano.

- Você foi separada dele! - Sophie voltou a se sentar e olhar para mim.

- Fui meu anjo e um dia depois Guilherme sabendo da situação que se encontrava o país me buscou e me levou para os Estados Unidos novamente. - sorri fraco, cansada de lembrar todo o acontecimento de muitos anos atrás. - Quando chegamos nos Estados Unidos, um mês depois descobri que estava grávida, Fernando meu anjo, Fernando é o pai de Donna, ele é seu avô de verdade!

México, 1959!Where stories live. Discover now