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Lizzie

Ensaiei uma música do filme da Cinderela para a eliminatória. A Dream Is A Wish Your Heart Makes é  uma das minhas preferidas desde criança. Aprendi a tocá-la com uma das irmãs do orfanato onde cresci. A irmã Marie era a freira mais maluca e engraçada de lá, ela sempre contava histórias de casais apaixonados e tocava músicas que não eram "aceitáveis", mas era tão boa em escapar da madre superiora Edith que nunca era pega. 

- Você terá uma vida brilhante, Elizabeth. - dizia irmã Marie quando me ouvia tocar e cantar.

Quando papai estava vivo, ele sempre me levava de volta ao orfanato para visitá-la, mas depois que morreu, acabei diminuindo as idas até lá... faz tanto tempo que não a vejo. Está decidido, quando essa coisa de reality show acabar, vou fazer uma visita as irmãs.

Estou na sala de música agora. Minha apresentação já está pronta, mas quero garantir que não vou errar nenhuma nota. Tocar piano ao vivo para uma porção de gente que vai julgar meu talento pode ser bem aterrorizante.

Começo a teclar o piano e a música ganha vida pelo ambiente antes silencioso. Canto a primeira parte e me deixo embalar pela canção.

- Está ouvindo, Frederica? - ouço a voz de Arlete vinda do lado de fora da sala. - Essa música... é aquela música irritante da Disney que Elizabeth vive tocando em casa!

Paro de cantar e continuo apenas tocando, tentando prestar atenção na conversa.

- Sim! É aquela canção da Pequena Sereia. - Frederica responde. - Ou será da Bela e a Fera? Não. É do Aladdim!

Meu Deus. Reviro os olhos e solto um riso baixinho.

- É da Cinderela, Frederica! - Arlete corrige a irmã. - É a cara da Elizabeth... Qual das meninas deve estar ensaiando aí?

Droga! Paro com a música imediatamente e acabo tocando uma nota errada.  Será que vão notar que sou eu? Eu não pensei nas consequências ao escolher minha música preferida para a eliminatória. Uma canção da Bela Adormecida seria menos chamativa.

- Vamos entrar e ver. - Frederica sugere.

- Não. Deixa pra lá, tenho que fazer meus exercícios vocais. - escuto passos pelo corredor e respiro aliviada, porém, Frederica não acompanhou a irmã e entra na sala.

- Oi. - ela acena. - Ouvi você tocando, é a música preferida da minha irmã que não está no programa. - se aproxima.

- Ah, é mesmo? - fixo o olhar nas teclas do piano. - Legal.

- Eu nunca admito, mas gosto quando ela canta. - ri e sorrio. Tenho bons momentos com Frederica quando éramos crianças.

- Por que não diz isso pra ela? - quero saber.

- Porque... não sei. Arlete diz que ela não gosta de nós e que devemos mostrar quem manda.

- Isso não é verdade! - protesto. Quando fui viver na casa do papai eu adorava o fato de ter duas irmãs quase da minha idade, gostava de brincar com elas, mas depois que papai morreu, parece que Ivone fez a cabeça das filhas e elas passaram a brincar menos comigo. Ficaram malvadas, e quando crescemos a coisa piorou bastante. Na escola, as duas fingiam não me conhecer, bom, Frederica almoçava comigo de vez em quando ou fazíamos trabalhos juntas, mas sei lá... ela sempre me esquecia logo em seguida. Nunca entendi direito o que aconteceu com a gente. - Quero dizer... - engulo em seco. - Certamente sua irmã gosta de você. Talvez você não tenha dado chance para ela demonstrar isso.

- Acha que pode ser isso? - ela senta ao meu lado na banqueta. 

- Talvez. Muitas vezes as pessoas não falam o que pensam e os outros acabam tirando conclusões precipitadas, acabam se afastando sem saber o que está acontecendo, simplesmente decidem deixar para lá.

Cinderela, eu? ✓Onde as histórias ganham vida. Descobre agora