fuga das palavras.

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A fuga das palavras

"Palavras me escapam
E pensamentos se escondem
Quando mãos enrugadas se fecham
E as faces aterrorizantes se estendem
Bloqueando minha visão e minha sensação

O caminho é obscurecido
O rumo se torna desaparecido
E o sibilo sombrio
Sussurra em meus ouvidos

'Deixe-me em paz!'
Minha voz trêmula ressona
E em minha cabeça retorna
O estrondo do que antes
Era apenas um assombro [...]"

✿ ✿ ✿

Minhas pernas se balançam ao ritmo de uma música muda, enquanto meus dedos as acompanham batucando no bloco de notas a minha frente, como companheiros de dança distintos, separados por todo um corpo. Aperto os olhos em concentração quando sinto um conjunto solitário de palavras se arrastando pelo meu cérebro, em uma caminhada lenta e árdua, enquanto tento agarrá-las com tudo o que tenho.

Bufo com impaciência e irritação quando, pela milésima vez, sinto-as escorregarem pelos meus dedos e se dispersarem, como areia em uma praia inundada de ventania, e concluo que o bloqueio mental decidiu me atacar e enrolar-se ao redor do meu cérebro, me impedindo de criar um novo poema. Mais a vez.

      — Merda — resmungo e Taehyung ergue seus olhos do copo que limpava para me encarar.
   — Qual o problema, Kookie? — o homem à minha frente pergunta, mesmo já suspeitando a resposta que receberia.
      — Bloqueio mental. - respondo simplesmente.
      — Ah.

E levando minha resposta como uma deixa, Taehyung vai até uma das grandes máquinas de capuccino e prepara uma xícara com o líquido quente para mim, pousando-a à minha frente, seguindo um protocolo pelo qual já tivera de passar várias vezes, e se afastando em silêncio, aproveitando a oportunidade da fuga rápida para atender um cliente que acabara de chegar.

Quanto a mim, após ter sido deixado só, acompanhado somente de minha mente vazia, fecho os olhos e os aperto bem, massageando as têmporas - como se o ato fosse instigar o surgimento de novas ideias -, tentando capturar, ao menos, um resquício de inspiração e pô-la no maldito papel amarelado, que parecia zombar de mim por não ser capaz de escrever algumas meras palavras tolas. Fracassado, ele parecia dizer e eu tampo os ouvidos, me deixando levar por uma mera paranoia, não consegue nem mesmo ser capaz de realizar um trabalho simples para você e que tanto  ama...

      — Desisto! — digo elevando a voz, quase gritando (fazendo com que alguns olhares curiosos se voltassem para mim) e jogando minhas mãos para o alto, em um sinal de rendição.
       — Assim tão fácil? Poxa, Jungkook, você já foi melhor, viu? — Taehyung retorna e comenta com uma sobrancelha erguida e em um leve tom provocativo, um sorriso torto completando a expressão debochada, e volta a limpar o resto dos copos sobre o balcão.

Taehyung é cheio de qualidades invejáveis. Resultado de uma boa criação e de uma vontade constante de se aprimorar, principalmente mentalmente, o homem nunca vacilou em suas boas maneiras, positividade e sentimentos relativos a estas. Suas qualidades sobrepunham as problemáticas de tal forma que eram esmagadas e reduzidas a pó. E eu não podia negar me sentir invejado quando tenho uma representação delas a minha frente.

Duas das quais eu sempre apreciei no rapaz à minha frente é sua enorme perseverança e otimismo, que por vezes me faltavam — e em excesso. A dedicação que ele põe e o objetivo que impõe até realizar o que quer me deixam boquiaberto e muitas vezes já até tentei imitá-lo consciente e inconscientemente, mas, embora tenha criado expectativas demais, não alcancei o objetivo desejado.

Todos Os Universos Ocultos De Park | jikookWhere stories live. Discover now