five.

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Conhecer a família de Mike não foi tão assustador como pareceu de início.
Seu pai era um senhor grisalho-conservado, talvez tivesse ganhado uns quilos a mais nos últimos anos, já que nas fotos que me eram mostradas, estava um pouco diferente.
Sua mãe parecia sair do núcleo rico de alguma novela da globo! Usava roupas claras e muito bonitas para quem só vai almoçar em sua própria casa. – Ela cheirava perfume caríssimo e era tão branca e loira que me agoniava o juízo. Em nada parecida com o filho. Ou o filho com a mãe. Enfim... Deu pra entender. Mike estava mais para o lado genético do Sr. Carlo.
Já a irmã, era a xerox de Dona Alexandra. Loira, branca feito neve e... Linda.


Fisicamente iguais. Porém a simpatia provavelmente não foi com o dna. Ela era mais fechada.
Clarissa parecia atriz, também. Mas de filme francês, sabe? As maçãs do rosto rosadas, a boca bem desenhada... Pera, mas porquê estou reparando no desenho da boca da minha cunhada?

Oxente.

– Pronto! Passado a ansiedade, como foi conhecer os Muller? – Mike beijou o topo da minha cabeça, deitando ao meu lado em sua cama. – Somos do bem, não somos?
– São sim! Sua família é muito legal... E bem diferentes.
– Sou todo meu pai e Clarissa toda minha mãe. Eu sei. Todos comentam!
Papai ser brasileiro e mamãe não ser dá uma incrementada no negócio.

Sorri, deitando a cabeça em seu peito. Estávamos no quarto dele já fazia algum tempo.
Tudo ali era muito ele. As estantes com inúmeros livros e gibis. Havia miniaturas de brinquedos espalhados por todo lugar. Em uma das paredes, um quadro com metade da bandeira do Brasil e metade da Inglaterra. Tudo ali era bem "nerd". Bem... Mike.

– Acha mesmo que tua irmã vai sentir-se bem em sair com a gente? – Perguntei, aleatória.
– Porquê não iria querer? Mike Muller e Ana Clara Caetano, os melhores baladeiros de toda a orla europeia? – Riu irônico, me arrancando uma risada breve.
– Pois... Ela parece ser bem "cool". – Bocejei. – E nós somos isso aqui que tu acabou de ver.

Ele riu novamente. Mike era muito fácil de rir. E eu também.
Ajeitei-me na cama para dormir um pouco enquanto ele sentava-se a mesa do computador e ligava o mesmo, com o intuito de abrir alguns e-mails que já começara a responder do escritório do pai.

Fechei os olhos apenas para repousá-los, já que ainda estava processando a quantidade de acontecimentos que andavam percorrendo minha vida pacata e previsível. Desde que saí do meu país, raras foram as vezes que conseguia organizar o bocado de coisa que estava vivendo: Deixar a família e só voltar 1x no ano (as vezes, nem isso), estudar fora e conseguir adestrar o inglês, qual me achava completamente péssima – não que agora fosse genial mas já dava pra me apresentar e não morrer de fome, ou de frio mundo á fora... Pensava nos instrumentos que aprendi, nos lugares que conheci e gostaria de passar a vida retornando... me encontrar no curso de letras, nos livros, nas músicas. Conhecer e namorar Mike. E agora conhecer sua família. A quantidade de amigos novos que fiz, os que mantive... Por falar em manter, onde estaria Vitória que não me mandou sequer um "Oi linda, cadê? Morreu? Ou deu pra praticar o lance de sobreviver aos Mullers?"

Vi era uma irmã que a vida havia me apresentado. Com 16 anos, no avião rumo à Europa pela primeira vez na vida, senti uma vontade incontrolável de desenvolver uma crise de pânico, tamanho era a ruma de sentimento que se passava dentro de mim. Quando o avião iniciou o processo para decolar, pensei que vomitaria todos os meus intestinos para fora...
Fechei os olhos e agarrei forte o separador de poltronas – sei lá que nome se dava aquilo.


Quando pensei que me desintegraria no ar, feito pó, senti uma pressão em cima dos meus braços, e de repente, um calor por cima do peito de minha mão, que essa hora, já estava uma pedra de gelo.


– Olhe, não sei quem você é, mas se tem algo que não tolero, esse algo é alguém com medo de avião não ter ninguém pra segurar a mão. – Falou, poética.

Eu sequer engolia minha própria saliva.

– Agradeço. – Ainda de olhos fechados, entrelacei minha mão á dela. – Lembre-me de te pagar um café com muffins se chegarmos vivas até o outro lado do mundo.
– Menina, que pessimismo desaforado. Chegaremos vivas sim! Joga positividade pro universo, que ele te devolve. – Retrucou, serenamente.

Quando abri os olhos para espiar a peça que havia sentado ao meu lado, ela também havia fechado os olhos, ainda segurando as minhas mãos, com a cabeça suspensa para trás.
Aparentemente, muito confortável e com uma expressão tipo de quem está num spa.

– Tu só pode ser enviada dos céus. – Gargalhei, sem saber se por achar graça do que estava acontecendo ali, ou de nervoso por recordar que voava á zilhões de metros do chão.

A menina riu, balançando a cabeça. Possuía os cabelos mais lindo que já vi em minha vida – de um castanho bem claro, pareciam cascatas de cachos, bem despretensiosos e naturais.
E eu, obviamente, com horas de chapinha nos meus.

– Vitória. – Cumprimentou meu rosto com dois beijos, e ainda tentou um "Hi-five".
– Ana Clara! – Sorri largo, de fato em paz com a presença daquela menina ali.


5 anos depois e nunca mais nos desgrudamos mundo á fora.

Peguei meu celular na cabeceira da cama e abri mensagem de texto. "Também te amo, vaca. Obrigada por se importar, aliás, não morri. Meu sonho de princesa que tu aparecesse."
Depositei o aparelho em baixo do travesseiro e encolhi as pernas.

– Vou cochilar, Sr. Advogado. Me chame faltando algumas muitas horas para sairmos, por favor. – Fechei os olhos. – Tu sabe que meu nome é Ana e o sobrenome é Indecisão.


Mal sabia eu que aquela frase seria mais verdade do que nunca nos próximos meses... 

no control.Where stories live. Discover now