Encontros e Ligações

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"Acaso é este encontro entre tempo e espaço"

— Paulo Leminski

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Fevereiro -  Inverno

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Gian Carbone

— Sr. Darcy era um grande babaca egocêntrico. — digo em um tom totalmente provocativo, imaginando a reação dela, a reação da maioria das mulheres: uma lista imensa de motivos que provam que estou errado. A grande diferença é que Améllia não é qualquer mulher. Percebo isso na longa gargalhada que solta ao me ouvir dizer isso.

— Ele também não me desce, sabe? "Sou rico, alto e um tanto charmoso. Desprezo garotas bonitas para mostrar que sou o máximo". Quanta babaquice. Sei lá, acho que não dá para perdoar o Darcy. Edaí que ele é do século XIX? melhore querido.

Sorrio para o teto após essa declaração dela. Estamos em uma ligação que já dura boas 1h30. É como se já fizéssemos isso há séculos. É como se ela fosse uma parte essencial do meu dia, a melhor parte. Nunca ficamos sem assunto.

— Nossas conversas me  lembram uma frase do Van Gogh. — diz de repente. — Na verdade é uma analogia que fiz na hora do almoço.

— Pensou em mim na hora do almoço? Devo ficar preocupado?

— Posso continuar?

— Vai em frente.

— A frase é mais ou menos assim, "normality is paved road. it's comfortable to walk on but no flowers grow on it".

— Quer traduzir?

A normalidade é  uma estrada pavimentada. É confortável andar, mas não crescem flores nela. E antes que você me interrompa de novo, deixa eu explicar a analogia que fiz. Você e eu somos totalmente anormais, e é por isso que as nossas conversas florescem. A maioria das pessoas fica tentando manter uma pose de normalidade absurda, tentando mostrar ao mundo que faz estão dentro de um padrão. Nós somos diferentes, acho.

— Essa é a coisa mais doida que já escutei. Ou em outras palavras nós somos muito esquisitos mesmo, e você quis dizer isso de uma forma bonita.

— Já tinha discutido sobre o the dark side of  the moon com alguém?

— Não. — faço uma pausa — Não dá pra ter esses assuntos com qualquer pessoa.

— Não sou qualquer pessoa então?

— Você é incrível. E tornou meus dias mais incríveis também, queria que soubesse. E não me diga que sou incrível de volta assim, no automático. Me diga quando tiver certeza.

Ela sorri e suspira num tom de deboche.

— Está com tanto medo assim de ouvir um "Também acho você legal"?

— Você não faria isso.

— É um desafio?

...

Améllia Howtwel  

Já se passaram algumas semanas desde aquela conversa no café. Inevitavelmente Gian e eu estamos mais próximos, obviamente contra a minha vontade, como sempre faço questão de deixar claro. Mas ele é insistente.  Já discutimos sobre filmes e livros clássicos, falamos sobre nossos animais de estimação, refletimos sobre como as guerras podem ser desnecessárias (e degastantes) e filosofamos sobre sorte, paz e introversão. Odeio admitir que somos uma dupla e tanto. Boa parte de nossas conversas acontecem por ligações que adentram a madrugada. 

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