XX. Anedonia e seu fim

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Remoendo o pó que ainda resta na boca de seu estômago, o menino passa os polegares pelos fios loiros. Está fazendo frio lá fora e, dentro do apartamento - mais especificamente dentro de Jimin - as coisas estão congelando. O Deus abandona o par de luvas na bancada do banheiro, se encarando no espelho largo e alto que lhe mostra até abaixo do umbigo. Está doendo. Algumas lágrimas brotam de seu rosto, cessando em seus lábios, e seu estômago embrulha em um aperto, a bile amarga subindo até sua boca, obrigando-o correr até o vaso. Não é confortável vomitar tudo o que não comeu durante esses dias. Não, não é. O deixa mais fraco e zonzo, as imagens perdendo o foco há dois palmos de sua visão fraquejada. Um respingo de saliva amarga escorre pelos seus lábios rachados, batendo em seu queixo, e ele limpa com as costas da mão, suspirando, ouvindo os passos de Jungkook no cômodo ao lado - o closet. Provavelmente está vindo bater na porta do banheiro mais uma vez para perguntar se está tudo bem.

De coração, não está. Os dias são um desalento. Nunca sentiu tanta culpa. Nunca pensou que conseguisse se sentir mais impotente do que já se sentia na época em que morava em Boreas. Ao mesmo tempo em que nunca se sentiu tão amado. As pessoas - algumas mais do que outras - haviam mobilizado o Olimpo para si, ocupando sua casa pelo decorrer do dia, trazendo-lhe comida ou jogos de tabuleiro. Às vezes, algum livro. Não era o suficiente, mas confortava. E até o momento atual, tem confortado. Mas sim, ainda dói. E Park, sentado no chão do banheiro, vestindo nada além de uma calça de moletom, encolhe seus ombros tensamente, se culpando por ser fraco e não conseguir superar. Ele ergue os pulsos até a altura de seus olhos, encarando as pequenas linhas esbranquiçadas na diagonal, as cicatrizes de dor que nunca sumirão. Ele promete, mentalmente, que irá vingar Melina e a si, a todos aqueles que Atlas machucou. As lágrimas dão lugar aos fungados fortes, o som da descarga sendo acionada e o garoto abre a pequena caixa de injeções guardada na prateleira de baixo da pia. O frasco com remédio está sobre a bancada, pronto para ser usado.

Já virou um hábito se aplicar. Já virou um hábito reclamar do maldito par de asas brotando de suas costas, apesar delas sequer parecerem estar evoluindo.

- Minie. - Jungkook o chama, do outro lado da porta, como Jimin já imaginava que faria. - Faz quarenta minutos que você tá ai, amor, 'tá tudo bem?

O loiro, ficando em pé, assente com a cabeça, apesar de saber que Jeon não verá sua resposta.

- Estou bem, Jun. - responde após algum tempo, ao terminar de aplicar as injeções. Ele tira sua calça, finalmente entrando de baixo do chuveiro. O barulho de água batendo contra o chão alivia Jungkook, fazendo-o se afastar da porta.

Tem sido difícil para o semideus também. Não há muito que fazer além de torcer para que Park amanheça melhor. Isso tem acontecido, progressivamente, mais lento que passos de tartaruga.

Jimin é a pessoa mais forte que Jungkook conhece. Não se abala com um sorriso torto, sempre está disposto, e a sensação de vê-lo abalado lhe tira do sério. Nem mesmo parece real. Seu coração se esmaga em angústia. O Park era a pessoa mais perspicaz de todo o Olimpo, engraçado, gentil e sensual, mas tem perdido um pouco - bastante - do seu brilho. A vida foi dura demais para ele, o encheu de frustrações.

Jungkook sabe que é questão de tempo para seu Park voltar ao que era. Em sua cabeça, já pensou em todas as possibilidades de ajudá-lo com isso, contudo, nada causou impacto. Seus dias estão monótonos, a relação desandou, mas isso é o de menos comparado à confusão em que Park se encontra mentalmente. Tudo o que Jeon espera é que seu anjo cheio de luz fique bem.

O loiro sai do banheiro vestindo um pijama amarelo, os cabelos úmidos batendo em sua testa e a toalha úmida apoiada no ombro esquerdo. O semideus se aproxima, dando um beijinho em sua bochecha. Park sorri, se aproximando de Jeon ao ponto de suas respirações colidirem. Seu coração voltou ao peito ao abraçar o meio-sangue, inclinando seu corpo para se encaixar no dele, e aperta os olhos, respirando com lentidão. Com paz. Seu estômago não está mais paralisado.

Profecia Grega ᠅ jjk+pjmOnde histórias criam vida. Descubra agora