Capítulo Um

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Tobirama sorriu enquanto apoiava as costas na parede da sala do líder dos Senju. Suas pernas estavam esticadas sobre o chão de madeira, e a postura inabitual que fazia os ombros caírem chamou a atenção do que estava logo à frente, mas ele não se importou; sequer reparou que estava sendo observado. Os sons dos passos pela casa juntamente com os das louças sendo transportadas até a sala principal, as ordens do encarregado pela organização do jantar daquela noite, e a voz do próprio irmão tagarelando chegavam próximo a suas orelhas, mas a mente de Tobirama não permitia que nada entrasse em seus ouvidos; ela estava longe desde que acordara pela manhã, perdida em lembranças que haviam acontecido em uma noite como a que estava por vir, há exatos quatorze anos.

Ele se lembrava de como se sentiu sufocado com a atenção dos convidados, com a maneira com que era subestimado e quanto suas bochechas doeram por um bom tempo após serem apertadas pela maioria dos convidados. Também lembrava da irritação e o frio quando fugiu de suas responsabilidades no jantar de Natal dos Senju, os sons do choro de Izuna, seu sorriso animado, e principalmente, como havia se sentido livre naquela noite, podendo brincar como a criança que era, mas custava a admitir.

Tobirama sentia falta daquela época. Não pelas brincadeiras, e muito menos por ter adoecido por conta do contato com o frio; ele sentia falta de sua ignorância, da inocência. Ele se sentiu livre e feliz porque não sabia quem realmente era aquele garoto, que os Senju haviam declarado guerra contra um clã chamado Uchiha, e que Izuna era um deles. Naquela época, Tobirama finalmente entendeu o perigo que havia corrido ao quase deixar seu sobrenome ser associado à sua face.

Butsuma queria proteger os filhos, foi o que ele pensou quando seu pai decidiu contar o que realmente estava acontecendo, mas em seguida se viu questionando o que o mais velho verdadeiramente queria.

Ele ganhou uma armadura e sua primeira espada quando completou dez anos de idade. Hashirama já o ajudava com o treinamento básico há três anos, e a partir daquele, seu pai tomou a liderança dos treinos, que foram jogados para cima não só de Tobirama, mas também dos jovens Itama e Kawarama.

Tobirama se lembrava de tudo. Sons, cheiros, sentimentos; com destaque em quando perdeu seus irmãos mais novos, a reação fria de seu pai... mas o que sempre se grudava na mente do segundo filho de Butsuma todo ano, naquela data em especial, era a expressão assustada de Izuna ao vê-lo em sua primeira batalha contra o clã inimigo. Aquele fora o momento exato em que sua inocência escapou de seus braços, e o deixou para trás com nada além de medo e frustração. Ele também estava assustado, surpreso e sem saber o que fazer ao ver o símbolo dos Uchiha nas vestes do garoto que deveria ser seu amigo, mas Tobirama não recuou, e não houve arrependimentos quando sua espada se chocou contra a de Izuna, que não parecia em nada com a criatura frágil e inofensiva que estava guardada em sua mente. O garoto se mostrou determinado e envolto em uma grossa camada de ódio, da qual Tobirama não entendia. Depois de todos esses anos, tudo o que aconteceu, eu ainda não entendo aquele momento.

Ele não odiava Izuna. Tobirama entendia as consequências de uma guerra, e ele próprio agia de acordo com os tempos em que vivia, então, compreender a determinação dos Uchiha em proteger seu clã era natural, mas o que viu nos olhos de Izuna em sua primeira batalha ia além do desejo de segurança e poder. Izuna pareceu odiá-lo assim que viu o símbolo dos Senju gravado no happuri em sua testa.

Izuna odiava os Senju mesmo antes de enfrentá-los, e Tobirama não fazia ideia do porquê. Eles lutavam um contra o outro por todos aqueles anos, e o Senju ainda não o conhecia de fato, e com o passar do tempo, ele passou a não ver real problema nisso. Não era preciso conhecer o coração de um guerreiro para lutar contra ele, e sabia que mesmo que se importasse em tentar conhecê-lo, seria jogar o seu tempo fora. Guerreiros fortes jamais mostravam seus corações, e Izuna havia se tornado em um deles, assim como ele próprio. Era exatamente por isso que ninguém tinha conhecimento do sentimento saudoso no peito de Tobirama, sempre que lembrava da noite em que havia conhecido Izuna. Ele sorria porque, apesar de tudo o que passou até ali, ainda havia uma lembrança pura que não era interferida por guerra ou shinobi algum; eram apenas dois garotos tentando fugir de suas vidas que eram muito mais complicadas do que imaginavam naquele momento.

Do Outro LadoWhere stories live. Discover now