Capítulo 31

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HARRY D'EVILL

-Não entendo a demora. Basta medicá-la e tudo ficará bem!

-Sabes que o caso de Luise não é simples. Vimos a quantidade de sangue. - Charlie responde antes de tomar chá.

-Eu não deveria ter saído daquele quarto.

-Mas saíste, ao menos não por vontade própria. - Me olha de maneira acusatória - Você estava atrapalhando o serviço do médico. Eu entendo que ame sua esposa, mas manter-se agarrando à ela e rosnando para qualquer um se aproximar é imperdoável.

-Deixaram que mamãe continuasse no quarto. - Cruzo os braços.

-Mamãe está calma, ela não rosna ou morde, ao contrário de ti.

-Eu sou o marido, não podem tirá-la dos meus braços dessa maneira. Preciso vê-la e saber como está.

-Você foi arrastado para fora... Pelos criados! Seis deles! Eu também estou certa de que deves um pedido de desculpa ao cavalariço. O olho do rapaz ficará roxo logo.

-Eu...

-Não, não. Basta de desculpas. Entendo que esteja preocupado, mas precisa pensar com a cabeça, não com o coração. Vivias repetindo isso para Elizabeth e agora não segues teus próprios conselhos? Eu entendo que está preocupado com Luise, todos estamos, porém ela está em boas mãos agora. Aquele homem dedicou anos de sua vida ao estudo da medicina, capacitando-se para entender o corpo humano. Dê-lhe créditos! É bom que desculpe-se com ele também por seus rosnados. Comportou-se como um animal, irmão. Se não estivesse tão preocupada com sua esposa, mamãe teria lhe arrancado a orelha por tantas repreensões.

-Eu só preciso vê-la.

-E a verá. Ela está em mãos competentes e você continuará esperando aqui comigo.

-Pode ao menos desamarrar minhas mãos? - Estendo meus pulsos atados em suas mãos, mas Charlie balança a cabeça e volta a tomar seu chá.

-Não confio em ti livre por aí. Meu papel aqui, estabelecido por mamãe, é tentar levar juízo a sua cabeça.

-O uso da força é sua tática?

-Dado seu ataque de selvageria? Sim, é. Veja bem, estou tentando apelar à racionalidade. Volto a dizer que entendo seu desespero e não o invalido, mas é bom que volte a pensar com sua cabeça e perceba que há muito mais necessitando de ti agora.

-Mais que minha Luise? Duvido muito.

-Edmund! O pobre garoto segue assustado nos braços de Victoria. Grace não pode se estressar por conta da gravidez e além de tudo isso, és um conde. Há dezenas, centenas de pessoas dependente de ti. Faz parte de nossas responsabilidades, é o que somos. Então recomponha-se e quando estiver calmo o suficiente o soltarei para que veja Edmund. Quando o médico terminar com Luise você será avisado.

-E papai? Anthony? Onde estão?

-Estão resolvendo todo o problema com Félix e seu cúmplice, agora cale-se e pense em como acalmar-se.

-O que farão?

-Sabes como funciona as técnicas de papai. Certamente aparecerá com uma boa história para ser contada depois que tudo estiver feito.

-Simularão sua forma de morrer para esconder seu assassinato.

-Parece-lhe justo?

-Parece-me pouco.

-Dada as circunstâncias é tudo o que temos. Nos falta tempo, recursos e pessoas foram feridas. Félix será morto de qualquer maneira, a justiça será feita. Não da maneira que queríamos, mas da maneira que é possível.

-O médico está a mais de uma hora e meia naquele quarto.

-Entendes de medicina?

-Não.

-Então cale-se.

Luise desmaiou na cama, estava fraca, fria e sangrava muito. O médico ainda não havia chegado e o desespero tomou conta de mim. Gritei tanto por socorro que - pensando agora - não sei como Edmund não correu até nós para saber o que acontecera com sua tia.

Minha mãe surgiu com um pequeno exército de criadas, panos e baldes de água para cuidar do ferimento de Luise sem que retirássemos a faca. Era agoniante vê-la desacordada com uma faca fixada nas costas. Como eu daria tudo para estar em seu lugar, para que Luise não tivesse que passar por isso.

Maldição.

Por mais que deteste admitir, Charlie - minha irmã caçula, a coisinha que até ontem era uma criança espoleta correndo pela propriedade e subindo em árvores, essa Charlie - está certa. Há pessoas contando comigo, não posso simplesmente enlouquecer. Luise precisa de mim completamente são quando acordar.

Preciso falar com Edmund, organizar as documentações pendentes e redistribuir o trabalho para que eu consiga o maior tempo disponível possível para ficar com Luise, ajudar em sua recuperação. Pelo ferimento imagino que não poderá movimentar-se plenamente.

Porra, se eu tivesse feito diferente. Eu poderia estar em casa e recebê-lo com ela, manteria Félix o mais longe possível de Luise enquanto conversavam, ao mesmo tempo eu agradeço por estar fora e impedir que a tragédia acontece com Edmund e meus sobrinhos.

-Não ouse.

-Ousar o que?

-Culpar-se por tudo o que aconteceu. Xingue, pragueje, quebre algumas coisas, mas não jogue a responsabilidade do que aconteceu sobre seus ombros. Você não consegue controlar o mundo, cada um é responsável pelo que faz e com Félix não é diferente. Ele está pagando pelo que fez, certamente papai já o baleou no feito a esta hora. Com sorte já o está enterrando, juntamente com aquele capanga.

-Quando descobriu o que papai faz?

-Eu sempre ouvi as fofocas dos empregados, acredite ou não, os homens fofocam muito mais. Papai não é violento, ele não faz isso por esporte, faz quando é necessário proteger nossa família. Não é como se ele torturasse as pessoas ou coisas assim, papai apenas simula uma morte diferente, fazendo parecer que morreram em duelo ou tiraram a própria vida. A primeira vez que vi como as pessoas o temiam quando está com raiva foi em Lawfort, quando Daniel fora atacado.

-Como reagiu?

-Não é como se esta fosse uma prática incomum entre a aristocracia, defendendo os próprios interesses e tudo mais. Como eu disse, papai não é um homem mau. Ele sequestra pessoas ou as tortura como já ouvi que alguns nobres fazem. Papai apenas protege a família. Lamento se alguém não concorda, mas eu não me oponho.

-Pensei que fostes mais pacifista que isso.

-Sou realista demais para ser pacifista. Os seres humanos estão sempre procurando por poder e isso gera disputas. Papai apenas protege o que ama, não há nada de errado com isso.

-Quando você cresceu, Charlie?

-Quando todos os meus irmãos se casaram e me vi sozinha. Depois Aidan viajou e não havia mais ninguém.

-Eu sinto muito.

-Não sinta, é a vida. Coisas assim acontecem.

Conde Tentador - Os D'Evill 04Where stories live. Discover now