A tripulação tinha aulas de marcês uma vez por dia. Sem muito interesse e paciência, a maioria dos passageiros repetia as primeiras palavras naquele idioma estranho processo de aquisição de língua estrangeira.
– Agora vocês vão aprender a dizer seus nomes – disse Mei Ling – nominon de mein... . E para perguntar como se chamam as pessoas diga: kit nominon de tein?
– Nominon de μein Luna. – disse a garota, levantando sua mão rapidamente.
– Agora como dizemos lua em marcês? – perguntou Vinicius.
– Ainda não criamos essa palavra, querido.
– Você pode criá-la agora?
– Por que você mesmo não a cria?
– Ok.... Para mim a lua pode ainda ser chamada de lua. Afinal, ela ainda é a mesma.
– Querido, acreditamos que na nossa nova vida tudo será diferente. Você sabia que Marte tem duas luas? Como pode ter o mesmo nome? – disse Mei Ling – Ok... Podemos chamá-la de fobei, baseado no nome fobos e demos, as duas luas do planeta. Mas em marcês todos substantivos inanimados terminam com 'os' Portanto, se diz fobeios. Está vendo? É só usar a criatividade.
Vinicius nunca tivera facilidade com idiomas. Na verdade, mal dominava sua língua materna.. Mesmo assim, ele se empenhava muito para aprender marcês porque esse era o preço que pagaria para ter uma vida melhor. O que ele não faria para viver bem?
Luna, Oliver e Brian, por outro lado, iam muito bem nas aulas. Eles, que já falavam inglês, francês, espanhol e português, estavam aprendendo marcês com enorme facilidade. Outra que ia bem era Vanessa. Ela sugeria muitas palavras novas para Mei Ling, que aceitava, sem exceção, todas as suas sugestões.
O marcês era uma construção coletiva. Mei Ling deixava claro que o idioma era de todos e que ela não era a dona dele. Por isso, a professora pedia para que cada um contribuísse a seu modo.
O bebê ainda não estava na fase de aquisição de linguagem. Mas Mei Ling queria muito que ele fosse o primeiro falante nativo de marcês. Por isso, pedia que Iris – esse era o nome da mulher grávida – falasse com ele nesse idioma. A mãe relutava muito em aceitar tal proposta.
Além disso, todos aprendiam um pouco da cultura greco-romana. Mei Ling, uma das organizadoras da colonização de Marte, queria que o Novo Mundo fosse baseado nessas antigas civilizações. Ela dizia que aqueles eram os tempos áureos da Terra e que, pouco a pouco, as coisas foram se deteriorando. Assim, Marte poderia se inspirar na antiguidade clássica, de modo que os antigos gregos e romanos tivessem orgulho da sociedade que estava sendo criada.
É com Mei Ling que os tripulantes aprendiam sobre a Guerra do Peloponeso, a Pólis, os minoicos e micênicos, bem como as Guerras Púnicas, o Coliseu e a República Romana. Vinicius imaginava que aqueles tempos eram realmente melhores. Na verdade, nada era pior do que a Torre.
E assim, a vida ia passando. Conversar com Brian e Oliver. Tentar, sem sucesso, conquistar Luna. Ficar com fome depois de se alimentar com a pílula B. Dormir e acordar no horário estalecido pelo Comandante. Ir para as aulas de marcês. Aprender sobre a cultura greco romana.
Um dia, quando todos menos esperavam, o Comandante gritou:
– Terra à vista! Preparem-se para aterrissar. Chegamos em Marte.
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Uma passagem para Marte
Science FictionNo final do século XXI, os sobreviventes de uma grande guerra ocorrida nos anos 2050 e 2060 moram em enormes torres sem sair para a superfície. Graças à radiação causada por bombas atômicas, não é mais possível viver ao ar livre. Portanto, sabendo q...