CAPÍTULO 1

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Sempre tive um fascínio pelo tempo

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Sempre tive um fascínio pelo tempo. Alguns dizem que ele é nosso maior inimigo, mas na minha percepção ele é muito mais. Nós sempre o desperdiçamos, reclamamos por não o termos e desistimos de muitas coisas pela falta dele, mas a verdade é que o tempo é nosso amigo. Ele pode não estar a nosso favor muitas vezes, mas somos sortudos por tê-lo.

Normalmente levava de cinco a dez minutos num banho. Meu programa de televisão preferido durava exatamente uma hora. Para voltar à superfície depois de um mergulho, demorava vinte segundos. Susie levou três para cair naquela pista, e por incrível que pareça, não contei quanto tempo demorei para aceitar a partida dela.

Também não contei quanto tempo demorou para que todos voltassem a agir como se nada tivesse acontecido. Para se esquecerem dela, a não ser quando, todo ano na mesma data, voltavam a falar sobre o acidente e faziam uma homenagem, enchendo o ginásio com rosas vermelhas. Isso necessariamente não significava que ela ainda era lembrada, era só uma forma dos treinadores incentivarem os aspirantes a não desistirem de pagar suas mensalidades por medo de acabarem como minha irmã.

Antes eu me aborrecia, até descutia com alguns jornalistas, mas agora a única coisa que importava era que a memória dela estivesse guardada com quem realmente deveria estar. Nada além daquilo deveria significar algo, nem mesmo o amor que o namorado dizia sentir por ela.

Depois da Susie, todos os atletas recebiam cuidado dobrado, desde as consultas ao médico - ainda mais frequentes -, até a maneira como iam executar qualquer movimento, prevenindo-se para evitar torções ou mal jeito em alguma parte do corpo. Particularmente, eu achava importante, mas sentia que ninguém fazia aquilo pela saúde dos alunos, e sim pelo que eles proporcionariam à nação esportiva - medalhas e troféus, sem contar o maior reconhecimento dos nomes envolvidos.

Rachel Flinchwood era o terror dos atletas e ela só perdia para uma pessoa. Romeo Sanchez também era treinador, e namorado da Susie. Ele tinha dezessete anos a mais que eu e nove a mais que a minha irmã. Papai não aprovava o relacionamento no início, sempre dizia que amor e profissão deveriam viver separados. Aos poucos, Romeo foi conquistando a confiança do velho, mas nunca a minha. Sempre tive um pé atrás com ele, tanto por ser mais velho que a Susie, quanto por ser enigmático demais, parecia andar pelas sombras das pessoas.

Se eu dissesse algo, com certeza ninguém concordaria comigo, já que todos tinham medo dele. Sua severidade assustava e era daquela maneira que ele conseguia o que queria, intimidando as pessoas ao seu redor. Sentia pena por sua masculinidade ser tão frágil a ponto de precisar colocar medo nas pessoas para ser respeitado.

Assim que saí da classe, passei pelo corredor e parei próxima ao bebedouro para encher minha garrafa de água. Os alunos de música saíam verborrágicos, e os de enfermagem logo atrás, com seus jalecos pendurados nos braços. Uma garota parou me olhando e sorriu gentilmente, carregando uma pilha de panfletos embaixo do braço.

O Melhor de NósWhere stories live. Discover now