Maldição

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      Mesmo com todo seu esforço Bellamy teve que deixar aquela missão para outro dia. Ele construiu uma cobertura para evitar que a água da chuva entrasse em excesso no local onde ele estava escavando. Fez até mesmo uma tampa do concreto para tapar a entrada, impedindo que animais indesejados entrem e acabem sendo uma dor de cabeça futura.
      Com tudo isso pronto era a hora de voltar para casa. E só o céu e a terra sabiam o quanto ele queria aquilo. Imaginar o sorriso de suas meninas, o abraço de sua garotinha e a quente e aconchegante conchinha de clarke.. Bellamy sorria feito bobo. Era como uma criança prestes a ganhar um brinquedo que tanto pedia ao papai Noel, ou o doce desejado a muito tempo.
      Ele jamais desistiria de sua irmã, mas se ficasse por mais tempo naquele deserto, seria capaz de desistir de si mesmo. Era duro ficar sozinho, longe das pessoas que amava sabendo que elas estão ao alcance de seus braços. Os Blakes são teimosos e lutam pelo que querem, mas naqueles anos o mais velho aprendeu a reconhecer seus limites e a saber o tempo de cada coisa. Agora era o tempo de voltar para sua mulher e filha.


— Cheguei! —  Diz animado ao estacionar o Rover e descer do mesmo. Bellamy podia jurar que naquele momento as duas estariam em seus braços dizendo o quanto sentiram sua falta, mas isso não aconteceu.
   Ele caminhou mais um pouco, mas não havia ninguém no pátio enfrente a casa e nem mesmo dentro dela. O que o leva a pensar que elas estão na cachoeira. Bellamy se aproximar devagar.. Madi se banhava enquanto Clarke apenas observava e pelo caderno e o lápis em suas mãos desenhava um pouco. Enfim Bellamy respirou fundo aliviado, mesmo sentindo algo estranho no ar.

— Oi.. — Sussurra ao sentar-se ao lado da loira que pulou de susto ao vê-lo mas logo sorriu e o abraçou mais apertado do que nunca.

—  Que bom que voltou.

—  Eu disse que voltaria. —  Eles se afastam mas seus olhos permanecem vidrados um no outro.
   Aqueles marcantes olhos azuis de Clarke estavam tristes, como se algo tivesse ido embora, algo bom demais. Apesar de não fazer ideia do que se tratava, Bellamy se preocupou e estava prestes a falar algo quando Madi pulou em seus braços o abraçando pelo pescoço.

— Estava com saudade.

—  Eu também minha estrelinha. — Bellamy a coloca no chão de frente para ele. — Sabe, uma coisa que me ajudou a suportar todos esses dias longe de vocês foi olhar para o céu e vê a estrela mais linda brilhando durante a noite. Eu sabia que era você.

— Eu também! Olhei para ela e desejei muitas vezes que você estivesse bem.

  Eles voltam a se abraçar. Clarke sorri admirando aquela cena, mas seus olhos ainda estavam tristes demais para demostrar alguma alegria genuína.

  O resto do dia foi apenas para a diversão. Ficar longe nunca era fácil, principalmente agora que só existem eles no mundo.
  Com o recolhimento do sol, Bellamy se dispôs a fazer a fogueira enquanto Madi colocava a última refeição do dia sobre a mesa.

— Como foi? — Clarke pergunta sem jeito ao entregar mais lenha a Bellamy.

— Foi bom. Acho que encontrei o túnel de três anos atrás. O espaço era o mesmo e tenho certeza que o local também. Mas agora tomei o devido cuidado para que não caísse em cima da minha cabeça. — No fim ele tenta dar um ar cômico e eles riem.

— Parece que seu plano suicida deu resultados então..

— Estava louco pra voltar pra vocês. Sei que demorei um pouco mais. Sinto muito. — Clarke põe a mão direita em seu ombro e se esforçar para sorrir.

— Eu sei.

  A sensação de que algo estava errado fazia Bellamy querer arrancar os cabelos, mas ele sabia que Clarke não falaria na frente de Madi. Ela não queria demonstrar o que sentia e estava se fechando cada vez mais por causa disso. Mesmo tentando permanecer ali, a cabeça estava enterrada em seu próprio mundo e pensamentos.
  Como todas as noites após o jantar Madi fez questão que lhe contassem uma história, mas ela estava tão cansada que mal ouviu metade e teve que ser carregada para dentro por Bellamy.

— Ela dormiu. — diz ao sair da cabana e vê que Clarke ainda estava sentada ao redor da fogueira.

— Eu pensei que não perderia mais ninguém. As únicas pessoas que me importam nesse momento ou estão ao meu lado ou em um lugar onde eu não possa dar uma de herói. — Clarke sorri de seu próprio comentário enquanto Bellamy senta-se a seu lado.
— Mas ainda sim eu perdi. Perdi o filho que nem sequer pensei em ter. Perdi depois que você saiu. Sozinha. A morte destruidora de mundos. Wanheda. Não importa mais. Eu sou tudo isso. Trago morte até para o meu filho que nem teve a chance de nascer.

  E foi naquele momento, ouvindo o relato da mulher que ele amava enquanto chorava que Bellamy desmoronou. Ele sequer soube o que dizer diante daquilo, tudo o que pode fazer foi aconchega-la em seu braços.

— Sinto muito por não ter estado aqui quando você mais precisou. Perdão. Não fui capaz de te proteger disso.

— Não cabia a você. Não foi sua culpa.

— E nem sua. — Os olhos dela encontram os dele. — Você não trouxe a morte do nosso filho. Não foi você.

— Então por quê eu sinto o oposto disso? — Os olhos marejados, a voz trêmula. Clarke estava quebrada novamente. Quebrada em mil pedaços e nem sequer sabia se podia junta-los.

    A batalha deles parecia nunca ter fim. Era como se nada de bom viesse sem algo muito ruim para equilibrar. Bellamy se sentiu culpado pois em sua cabeça ele achava que sua vitória no deserto foi a derrota de seu filho. E em seu coração não havia espaço para nada além de lágrimas cortantes.
     Para Clarke os braços de Bellamy eram conforto, mas nem mesmo esse sentimento foi capaz de faze-la chorar e de se sentir culpada pelo não nascimento de seu filho.
     O título de Wanheda veio das vidas que ela tirou. Foi uma maldição terrestre para que ela nunca mais esqueça de seus pecados e de que todos que ela ama pagarão por eles.

In Another Life - The 100 [REVISÃO]Where stories live. Discover now